• Cuiabá, 15 de Setembro - 2025 00:00:00

PLC dos Incentivos: existem vícios de inconstitucionalidade que saltam aos olhos, diz Carlos Montenegro


Sonia Fiori - Da Editoria

No cenário polêmico em que setores produtivos de Mato Grosso reagem ao Projeto de Lei Complementar 53/2019 – de autoria do Executivo estadual que dispõe sobre a reinstituição dos incentivos fiscais, o advogado tributarista, Carlos Montenegro, pontua ao FocoCidade uma leitura intrínseca sobre o texto, destacando a origem das mudanças, os passos exigidos pela legislação para sustentação dos benefícios, e as eventuais consequências acerca da matéria em tramitação na Assembleia Legislativa.      

Vale lembrar que no campo da defesa do Governo, o secretário de Estado de Fazenda, Rogério Gallo, assinalou recentemente no ato de apresentação do projeto junto ao Poder Legislativo, que “muito pelo contrário, corrige distorções e cria para Mato Grosso um plano de desenvolvimento claro com a verticalização da nossa economia, criando alternativas para que setores primários com vocação do Estado possam se industrializar” – entre outros aspectos sobre a importância das alterações.

Confira a análise na íntegra sob Carlos Montenegro:

Origem

“Esse projeto de lei na verdade, ele decorre de uma legislação federal que é a Lei Complementar  160 e o convênio ICMS 190 que foram legislações editadas a nível federal para combater a guerra fiscal. Então é notório e sabido que os estados praticavam incentivos fiscais sem a necessária autorização do Confaz, o que resulta na inconstitucionalidade dos mesmos e no intuito de resguardar aqueles contribuintes que estavam se utilizando também desses incentivos de forma de certo modo indevida fossem preservados, se estabeleceu um mecanismo onde esses estados deveriam publicar uma listagem completa de todos os incentivos fiscais praticados e posteriormente fazerem a reinstituição desses incentivos de modo a convalidar os mesmos. De modo a o que? A sanar um vício formal pré-existente e remindo também o passado, ou seja, perdoando aquele passado de uso indevido desses incentivos.”

Revisão

“Então o Estado de Mato Grosso no final do ano passado fez a publicidade de todos os incentivos, editou uma lista enorme de tudo que concedia de incentivo, tanto de incentivos programáticos, ou seja aqueles relativos ao desenvolvimento econômico que estavam sob supervisão da Sedec como também os incentivos não programáticos, aqueles que estavam sob supervisão da Sefaz.”

Mudanças nos estados

“Isso foi feito não só pelo Estado de Mato Grosso mas por todos os demais estados e a legislação determinou também um prazo de até 30 de julho para que fossem os incentivos, o Estado pegasse a lista e escolhesse aqueles que gostaria de convalidar, ou seja, reeditar esses incentivos novamente, desta vez com efeito de perdoar o passado, com efeito de convalidar o que foi feito no passado, sanando o equívoco formal e também introduzindo novamente esses incentivos.”

Aplicação da legislação

“É uma reinstituição obrigatória, em não se fazendo isso todos os incentivos perdem a sua vigência, devem ser revogados, então é uma legislação primeiramente, é importante dizer, que ela é obrigatória, precisa fazer.”

Modificação em MT

“Acontece que nessa reinstituição o Estado de Mato Grosso não só escolheu os incentivos que gostaria de manter, como também modificou os mesmos e essa modificação também que vem causando enorme polêmica. Essa modificação, veja bem, para alguns programas ela foi simplesmente no intuito de reduzir o benefício e para outros setores como o comércio, ela mudou toda a sistemática de uso-fruto e cálculo inclusive do incentivo, criando em verdade um novo incentivo no pretexto de manter o incentivo anterior. E essa situação juridicamente é muito complicada, porque em tese você teria que reinstituir aquele benefício já pré-existente.”

Aspectos legais

“Ao se analisar na legislação federal a possibilidade de modificação dos incentivos pré-existentes a Lei Complementar ela diz que é possível fazer essa modificação, mas ela não é clara acerca da extensão dessa modificação, até onde poderia ser modificado. Mas quando vamos para o ICMS 190, ele deixa mais claro o limite da modificação. E essa modificação tem dois aspectos, pode ser feita para reduzir o alcance do incentivo e reduzir o montante do benefício.

Então na verdade entendo eu que reduzir o alcance é manter o benefício mas reduzir o número de pessoas que podem alcançar, fazer uso desse benefício, e reduzir o montante, reduzir a carga do benefício, ou seja, reduzir o próprio benefício.”

Impacto

“Quando nós vamos para o comércio por exemplo, o que a gente vê uma alteração completa da sistemática do benefício. E isso na verdade me parece ilegal, afronta a legislação federal por duas razões: primeiro porque a legislação federal não proporcionou esse nível de alteração do benefício. E segundo que está sendo criado um novo incentivo dentro da legislação que é direcionada apenas para reinstituir incentivos anteriores, antigos, sem uma autorização do Confaz.  Então é uma situação muito ‘sui generis’ porque a própria legislação que veio para convalidar e para sanar um erro formal, ela está sendo editada com outro erro formal dentro dele e isso é muito perigoso no nosso modo de ver.

É uma situação que precisa ser muito bem vista, com cautela, bem estudada e bem discutida. Agora, ao que tudo indica, principalmente para o comércio está havendo um desvio da função principal da legislação. Basta dizer que São Paulo por exemplo editou um decreto com dois artigos, simplesmente fazendo a reinstituição dos incentivos anteriores, enquanto Mato Grosso não, fez uma Reforma Tributária para alguns segmentos e para outros fez uma mera redução do incentivo.”

Vícios de inconstitucionalidade

“Não dá para colocar no mesmo barco todo mundo, são situações distintas, cada qual com sua peculiaridade, mas existem aí vícios reais de ilegalidade e inconstitucionalidade que saltam aos olhos. É um projeto difícil e até meio que feriu o que foi acordado, porque no passado houve uma conversa com os segmentos, estava em discussão uma Reforma Tributária e em reuniões foi acordado o seguinte: olha, como o prazo dos incentivos fiscais ele decorre de lei federal, vamos priorizar os incentivos fiscais e depois falamos da Reforma Tributária, e isso meio que ficou acordado, e posteriormente, para surpresa de todos veio esse projeto surpreendente do ponto de vista material dele, de conteúdo, trazendo realmente uma minirreforma Tributária dentro de uma legislação que tinha uma única finalidade de reinstituir os incentivos, podendo ter alterações singelas, alterações que estão previstas na legislação.”

Debate e prazo exíguo

“Então essa é toda a polêmica e para as indústrias, por exemplo, está havendo uma redução do Prodeic e essa redução também é problemática porque existem termos assinados com o Governo do Estado que garantem um incentivo maior, e são incentivos condicionados a investimentos, ou seja, que foram feitos realmente pelas empresas e incorporaram no seu patrimônio o uso desse benefício por um período pré-determinado, então há também uma questão de afronta ao direito adquirido em relação às indústrias e para o comércio ilegalidades diversas aí  que eu acabei de mencionar em relação à transformação completa do incentivo. Tudo está muito problemático, precisa ser discutido e o grande problema é que o prazo é exíguo, curto demais para fazer uma discussão desse porte.”




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