O grande debate atual entre economistas, profissionais do mercado financeiro e do mundo empresarial é sobre qual será o formato da retomada da atividade econômica do país ao final do período mais tenso e intenso do isolamento social levado a efeito para combater a pandemia do coronavírus. Com a divulgação de indicadores setoriais da indústria, do comércio e de serviços, a cada semana as projeções das consultorias econômicas, academias e grandes bancos nacionais e estrangeiros surgem mais pessimistas. Nesta semana, em média, os relatórios dos bancos, consultorias e economistas apontam o aprofundamento da recessão e já indicam queda de 7,4% do PIB. A reconhecida ausência de liderança política nacional que harmonize os esforços de governadores, prefeitos e empresas em ações integradas de combate à pandemia e a sinalização de um horizonte de saída da crise sanitária, ajuda a piorar o cenário econômico, pois dificulta o planejamento operacional das cadeias produtivas e inibe o investimento.
Essa liderança nacional deveria ser exercida pelo presidente e pelos ministros da economia e da saúde. O presidente não quer liderar ( ou não consegue ), não temos ministro da saúde e o ministro da economia apresenta insuperável dificuldade de dialogar e implantar medidas práticas que o grave quadro de crise exige. A falta desse norte bussolar deixa, por sua vez, os líderes empresariais com baixa margem para ações proativas.
Nesse contexto, consolida-se a visão de que a retomada será mais alongada do que se imaginava inicialmente. O ministro da Economia, Paulo Guedes, que inicialmente demorou a dimensionar os reais estragos que a crise sanitária causaria na economia, afirmava repetidamente que a retomada seria em formato de “V”. Isto é, após uma queda profunda, o reaquecimento também seria rápido e forte. Forçado pela crueza da realidade, captada pelos indicadores econômicos, em reunião ontem ( 20 ), Guedes admitiu que passou a trabalhar com cenário otimista de que o retorno da atividade econômica terá um formato parecido com o bumerangue estilizado da logomarca da Nike, conhecida empresa de materiais esportivos, que se parece com um V, mas com a segunda perna alongada e levemente ascendente.
Pesquisa divulgada recentemente, que ouviu os executivos-líderes das maiores corporações mundiais, mostrou uma unanimidade que a pandemia provocará alterações profundas no mundo corporativo e exigirá alterações estruturais, novas habilidades e valores de seus líderes e acionistas. Suas preocupações mais marcantes podem ser assim resumidas: a) o comércio global sofrerá fortes alterações, com o aumento de medidas protecionistas pelas nações e alteração das cadeias de suprimentos para reduzir perigosas dependências estratégicas; b) receio que uma segunda grande onda da pandemia possa atingir novamente países já afetados; c) aumento exponencial de falências com o consequente desaparecimento de grande quantidade de pequenas e médias empresas. As sobreviventes serão incorporadas por grandes grupos empresariais, aumentando a concentração empresarial e mercadológica; d) maior exposição a fraldes e ataques cibernéticos devido a necessária expansão do trabalho em home office, aumentando a insegurança corporativa.
Mantidas as devidas proporções, verificamos as mesmas ameaças presentes no mercado brasileiro, acrescidas de nossas idiossincrasias políticas e econômicas.
Como já afirmei anteriormente nesta coluna, em Mato Grosso os perversos efeitos econômicos e sociais da crise financeira foram mitigados pelo bom desempenho da principal locomotiva de nossa matriz econômica que é o setor agropecuário. Além de estar colhendo safras recordes de milho, soja e algodão, surfa a santa onda da forte apreciação do dólar frente ao real e rápida retomada da demanda da China por grãos e carnes. Mesmo assim, o excepcional protagonismo e acumulação de capital por um setor não evitará considerável volume de falências e incorporações. Mesmo com o grande esforço que a administração federal tem feito para prover liquidez às micro, pequenas e médias empresas, o crédito não chegou até elas pois os canais escolhidos foram inadequados, e as inapropriadas exigências dos bancos brasileiros também inibiram a contratação, ocasionando o chamado “empoçamento”, quando os bancos estão com grandes volumes de recursos disponíveis em suas tesourarias mas não emprestam diante de cenário de incertezas ou pura ganância.
Vivaldo Lopes é economista formado pela UFMT, onde lecionou na Faculdade de Economia. É pós-graduado em MBA Gestão Financeira Empresarial-FIA/USP (vivaldo@uol.com.br)
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