O protagonismo negativo da semana coube às trapalhadas do governo federal e da diretoria da Petrobras ao anunciar o lucro da empresa em 2023 e o montante de dividendos a ser distribuído aos acionistas.
O que seria uma boa notícia para o país e para os acionistas, virou o epicentro de uma crise que levou pânico instantâneo à administração federal. Exigiu até reunião de emergência do Presidente Lula, vários ministros, diretoria da empresa e membros do Conselho de Administração.
A companhia obteve lucro líquido de R$ 124,6 bilhões em 2023, o segundo maior dos 70 anos de existência da empresa e um dos maiores entre as dez maiores petroleiras do mundo. Ao tornar público os lucros, a diretoria anunciou que vai distribuir apenas os dividendos ordinários, estabelecidos na legislação das sociedades anônimas e nos regulamentos da própria companhia, deixando de distribuir os dividendos extraordinários. Em 2023 a Petrobras entregou aos seus milhares de acionistas R$ 98 bilhões. Em 2024, esse montante será de “apenas” R$ 72 bilhões. Ocorre que, apesar de negar atualmente, ao longo de 2023 a direção da companhia não disse que mudaria o critério de distribuição de lucros. A entrega de dividendos extraordinários é uma prática da empresa desde 2021. Não pagar os dividendos extras seria uma decisão até razoável, se não tivessem criado a expectativa para os investidores e acionistas.
Em encontro com investidores em Nova York, em janeiro, executivos da Petrobras apresentaram detalhada situação da empresa, da regulação brasileira e do Plano de Negócios 2024-2028. Sinalizaram que a direção manteria a mesma métrica de distribuição dos seus lucros. Disseram mais: que a empresa financiaria o Plano de Negócios com o fluxo de caixa operacional, não precisando dos dividendos extras e nem de novos empréstimos, para manter a dívida da empresa em US$ 60 bilhões. Aliás, o estatuto da empresa nem permite que o volume retido de dividendos seja utilizado para despesas correntes ou investimentos. Serve apenas como um “colchão de liquidez” que poderia ajudar, como uma espécie de garantia secundária, para futuros empréstimos, caso necessário.
Na linguagem do mercado de capitais, a apresentação da direção da Petrobras “fez preço”. E todos os investidores e especialistas calcularam que os dividendos extras chegariam aos R$ 20 bilhões, considerando os dados dos três primeiros trimestres de 2023.
Ao ser anunciado que não haverá distribuição de dividendos extras, Investidores nacionais e estrangeiros reagiram imediata e negativamente. Resultado: queda do valor das ações da companhia e, turbulência nas Bolsas de Valores do Brasil e de nova York, onde a empresas lista suas ações. Como consequência, perda expressiva do valor de mercado da empresa.
Todo investidor, acionista e até mesmo os paralelepípedos das ruas da minha cidade, Alto Paraguai, sabem que a Petrobras é uma empresa de capital misto, controlada pelo governo. E que o seu presidente e seis membros do conselho de administração também são escolhidos pelo controlador. Mas todos sabem que desde a aprovação da Lei das Estatais, no governo Michel Temer, a companhia tem regras de governança que a protegem de interferências políticas. Quando o Palácio do Planalto interfere, enfraquece a governança corporativa, coloca em xeque a credibilidade do mercado de capitais do Brasil e a empresa perde valor de mercado.
Interferir na gestão da Petrobras não é privilégio do Presidente Lula. Bolsonaro, em 2021, demitiu o então presidente Roberto Castelo Branco porque a companhia teve lucro que ele chamou de “crime”. Dilma interferiu grotescamente nos preços dos produtos da empresa para conter a inflação, o que resultou na elevação da dívida a US$ 160 bilhões, o maior endividamento corporativo do planeta naquela época.
Em todas as situações, as intromissões foram catastróficas para a economia do país, para a empresa e para os acionistas.
Pessoalmente, entendo que a companhia não necessariamente precisa distribuir bilionários dividendos extraordinários a seus acionistas. Mas deve comunicar isso antecipadamente e com muita transparência, evitando expectativas que se tornam frustações financeiras. Afinal, no mundo dos investimentos, expectativa nada mais é do que a diferença daquilo que espera ter com o efetivamente obtido. No caso de alguns acionistas da Petrobras, isso pode significar milhões de reais a menos.
Todos esperam que essa turbulência, causada pela própria direção, passe, a Petrobras retome seu valor de mercado e mantenha governança de alta performance, do tamanho da maior empresa nacional.
Ao final do dia, ficou a percepção de agentes econômicos, analistas do mercado financeiro, grandes investidores individuais e corporativos que faltou sintonia fina entre o acionista controlador, a diretoria executiva e o Conselho de Administração. A intervenção política na gestão executiva da empresa é erro velho que se repete, e com as mesmas consequências desastrosas do passado recente.
Vivaldo Lopes é economista formado pela UFMT, onde lecionou na Faculdade de Economia. É pós-graduado em MBA Gestão Financeira Empresarial-FIA/USP (vivaldo@uol.com.br)
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