Dia desses na internet viralizou o vídeo de um pequeno cachorrinho que teimava em morder o rabo de um crocodilo. Uma, duas, três, até que lá pelas tantas o animal num bote certeiro sumiu nas águas do rio levando o cachorrinho na boca.
São aquelas coisas que todo mundo está vendo que não vai acabar bem, mas que o incauto teima em fazer. Perde a vida, mas não perde a pose. São aquelas pessoas que no final das contas perdem para elas mesmas.
Neste exato momento a sensação que tenho é que nosso estado passa por situação semelhante. Pessoas que se sentem donas da verdade e não ouvem ninguém, mordem o rabo do crocodilo acreditando que nada vai acontecer.
Será teimosia, falta de conhecimento, má fé ou falta de assessoramento? Vamos aos fatos: Na campanha eleitoral de 2018, o então candidato Mauro Mendes, promoveu a mais feroz oposição ao ex governador Pedro Taques, que diga-se de passagem,em outros tempos foi seu aliado. Os muitos ataques chegaram até a esfera pessoal, mas o forte mesmo foi destacar a incompetência de gestão do ex-governador e consequentemente daqueles que participaram daquele desgoverno.
Vieram os resultados das urnas e Mauro saiu vitorioso. Veio então a diplomação e finalmente a posse e, com ela uma série de desagradáveis surpresas. Esperava-se o “novo” e o “renovo”,mas para o espanto de todos, o galo que cantava no terreiro de Pedro Taques foi o escolhido para cuidar dos ovos de Mauro Mendes. Sim, ele mesmo, o Rogério que colaborou para o caos financeiro de Mato Grosso, foi o escolhido para continuar ao lado do novo governador numa das mais importantes pastas da gestão, a da Fazenda.
Voltando um pouquinho no tempo me recordo muito bem que na época da campanha, o então Secretário de Fazenda Rogério Gallo, veio a público no dia 26 de julho de 2018, e desmentiu o então candidato Mauro Mendes em relação aos ataques acerca da dívida bilionária do Estado. Como explicar que a mesma pessoa que negou a existência da dívida bilionária durante a campanha eleitoral, agora afirme em alto e bom tom que a dívida equivale a 10 megasenas acumuladas de fim de ano? Para completar o pacote, um dos principais assessores de Gallo, o adjunto do tesouro durante o desgoverno Taques, foi nomeado para a Secretaria de Gestão e Planejamento.
Até os mais entendidos tem dificuldadespara entender essa matemática. Como pode a equipe econômica de uma gestão fracassada ser absorvida por aquele que não poupou palavras para desqualificar tudo que era feito?
Na campanha eleitoral eu, que fui candidata a vice-governadora na chapa do Senador Wellington Fagundes, fui duramente criticada por alguns dos aliados do Mendes quando disse que ele, por suas declarações, demonstrava que não estava preparado para assumir o estado de Mato Grosso frente ao caos que vivíamos. Na época soou como chororô de adversário político, hoje percebo que, de fato, era mesmo uma análise lúcida e consistente de quem conhece o executivo estadual, pois as decisões equivocadas não pararam no fato do “novo” ter absorvido em seu time os jogadores de ataque do “velho”.
Pense comigo: se a situação do Estado é muito pior do que se imaginava, o que aconteceu? E pior, o que está acontecendo? Mentiu a equipe econômica em julho quando saiu em defesa de Taques, afirmando que não havia dívida bilionária ou estão mentindo agora? Só a título de informação a referida matéria de 26 de julho de 2018, no site gazeta digital traz a seguinte manchete: Gallodesmente ex-prefeito Mauro Mendes e nega dívida bilionária (vide o link: http://www.gazetadigital.com.br/editorias/politica-de-mt/gallo-desmente-ex-prefeito-mauro-mendes-e-nega-divida-bilionaria/545143). Isso é no mínimo um bom motivo para o Ministério Público iniciar uma investigação, pois se de fato o Secretário Rogério Gallo e seu time não detêm o conhecimento necessário e o controle das contas do Executivo, podemos ter o estado lançado num abismo sem fim em muito breve. Viagem sem volta que irá sepultar a nós todos, sem falar que o ato de passar informações falsas constitui crime pela nossa legislação. O certo é que, se as informações econômicas do Estado foram maquiadas na campanha ou agora, aqueles que a fizeram não possuem legitimidade para permanecer comandando as pastas econômicas do Estado de Mato Grosso.
De forma precipitada, ainda na primeira semana de governo, na ânsia de mostrar o seu conhecimento como gestor, Mauro Mendes começou a fazer declarações equivocadas e num belo dia, quem amanheceu com um galo na cabeça foram os servidores e a população.
No período eleitoral ele se autopromoveu como um grande gestor e foi com esse discurso que se sagrou vencedor do pleito eleitoral. Agora, optou pelo caminho mais fácil para resolver os problemas do Estado. Sem pudor algum voltou atrás em suas promessas de campanha e nem tinha esquentado a cadeira de mandatário-mordo executivo quando chegou a conclusão que os servidores públicos eram o grande problema do endividamento do Estado, esquecendo que prometeu pagar os salários dos servidores sem atrasos, que cumpriria a RGA e que valorizaria setores como o da Empaer, que agora teima em querer desmantelar e extinguir sem sequer ouvir os envolvidos.
Como especialista em gestão pública e por conhecer de perto a máquina do estado, reconheço que o executivo estadual realmente precisa de uma reforma administrativa e tributária, mas também defendo o estado necessário, aqueleque o cidadão precisa para ter saúde, educação e segurança de qualidade e isso nós não vamos conseguir decretando estado de calamidade pública financeira. Chega a ser vergonhoso para um Estado tão rico como o Mato Grosso, decretar calamidadenos primeiros 20 dias de governo, quando na realidade o que precisamos é de gestão. Calamidade é ver que são os fornecedores,os servidores públicos e o cidadão que vão acabar absorvendo este prejuízo. Solução simplista e a meu ver precipitada. Masbuscar primeiro conhecer os verdadeiros problemas e com cautela fazer uma proposta para reforma administrativa e tributária dentro de 60, 90 ou 100 diasdá muito trabalho, não é mesmo?
Penso que cobrando a efetiva participaçãodas carreiras que o estado possui, formando um grande fórum de gestores públicos, fiscais e agentes de tributos e os demais funcionários altamente capacitados, qualificados e que conhecem a máquina de perto, seria bem mais fácil achar uma solução que não jogasse o nome de Mato Grosso na vala da ingovernabilidade.
Eu aprendi que um gestor, por mais que confie na equipe, não pode ouvir uma única versão para tomar uma decisão, pois a saída para um problema pode vir de diversos apontamentos ou ainda da soma de todos eles. Aqui reside o que considero precipitação nos atos do governador Mauro Mendes. As vezes é preciso tempo para escolher a opção que será melhor para todos e, isso, vai determinar se um estado vai crescer ou fracassar.
Vivemos em um Estado rico e mal gerenciado, com um sistema de gestão centralizador e burocrático que por si só já traz prejuízos enormes, agregado a gastos equivocados edesperdício, que ocorrem por falta de planejamento. Muitas pastas inchadas em suas estruturas podendo ser reduzidas e trazer grande economia para os cofres públicos, sem decisões traumáticas e que impeçam o crescimento do Estado pelos próximos anos.
No passado Dante de Oliveira foi o governador que recebeu o estado num de seus mais difíceis momentos e mesmo assim foi no governo dele que os servidores começaram a ser valorizados com a implantação por exemplo do plano de cargos e carreiras e melhorias salariais.
Vejo um futuro difícil para Mato Grosso, afinal o sonho de vermos grandes investidores e novas empresas se instalando por aqui pode sucumbir devido a intempestiva medida de calamidade pública financeira.
Espero que Mauro Mendes comece a cumprir o que prometeu em campanhae que o Ministério Público de fato investigue essa incongruência dos números pré e pós campanha.
Sirlei Theis é advogada, especialista em gestão pública
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