Menos de uma semana separa o país do primeiro turno das eleições presidenciais. Menos de uma semana separa o país de decidir quais serão as duas pessoas que, por três semanas, disputarão voto a voto a substituição ao presidente mais impopular desde a redemocratização. Ao invés de romper com o acirramento desencadeado em 2014, o país caminha a passos largos em sentido oposto ao da conciliação, uma marcha rápida e constante ritmada pela insensatez.
Pouco pode se esperar de um eleitorado exposto a instituições que cotidianamente exacerbam suas funções constitucionais. Pouco pode se esperar de quem foi bombardeado por quase cinco anos por toda a sorte de artifícios com claro propósito de dividir, por gênero, raça, religião, orientação sexual, uma das sociedades mais plurais e, até então, tolerantes do mundo. Mas muito deveria se esperar daqueles que, com coragem, se colocam na condição de capazes de conduzir os destinos do país pelos próximos quatro anos.
Deveria porque os dois grupos que despontam, segundo todas as pesquisas de opinião publicadas até agora, como oponentes no segundo turno, flertam com algo muito perigoso. Esquecem-se de que quem brinca com fogo pode acabar se queimando e, o que é pior, pode acabar queimando quem pouco ou nada tem a ver com a brincadeira.
Em entrevista ao jornal El País, o ex-ministro José Dirceu, um graduado integrante do Partido dos Trabalhadores, deu uma mostra perigosa da possibilidade do desrespeito à Constituição, carta maior que assegura a democracia no Brasil. Ao responder se havia um risco do partido do qual faz parte ganhar as eleições, mas não levar, ele afirmou que “é uma questão de tempo pra gente tomar o poder. Aí nós vamos tomar o poder, que é diferente de ganhar uma eleição”.
Até o momento em que este artigo era escrito, não houve nenhuma nova declaração justificando a infeliz frase. Em qualquer país democrático, ganhar uma eleição é tomar o poder. A quem ganha, o ônus e o bônus de governar. A quem perde, o ônus e o bônus de ser oposição. Simples assim. Desta forma, a declaração de Dirceu eleva ainda mais a tensão já existente no país.
Do outro lado, coube ao próprio candidato Jair Bolsonaro, dar sua contribuição. Em entrevista a José Luiz Datena, concedida ainda dentro do hospital, disse com tranquilidade que, pelo que vê nas ruas, não aceitará resultado que não seja sua eleição para o posto mais alto da República. Ora, aceitar uma eventual derrota nas urnas faz parte da política.
Assim, em apenas dois dos muitos episódios que a atual campanha presidencial já produziu, fica fácil mostrar a profundidade do buraco em que a população brasileira está enterrada. Mais do que isso, mostra que aqueles que deveriam lançar cordas, construir pontes, estão mais preocupados em flertar com algo que não aprenderam ao ler livros de história, de que o enfraquecimento das instituições não gera nada além de caos, totalitarismo e retrocesso.
Gláucio Nogueira é jornalista
Ainda não há comentários.