• Cuiabá, 05 de Setembro - 2025 00:00:00

CeVIVAS do Instituto Butantan: Maria Carolina Sabbaga destaca projeto e parceria com MT


Rafaela Maximiano

Com o objetivo de aprimorar vacinas e fornecer informações em tempo real às autoridades de saúde, garantindo a eficácia das vacinas e a segurança da população, o Instituto Butantan implantou o Centro para Vigilância Viral e Avaliação Sorológica (CeVIVAS). Através de parcerias com laboratórios de diferentes estados vai ampliar a vigilância genômica e o monitoramento das variações virais da covid-19, influenza e dengue. Em Mato Grosso o trabalho ocorrerá em parceria com o LACEN, o Laboratório Central Estadual, que fica em Cuiabá. 

Para falar sobre o assunto o FocoCidade conversou com a Dra. Maria Carolina Sabbaga, vice-diretora do Centro de Desenvolvimento Científico do Butantan

A Entrevista da Semana abordou o surgimento do CeVIVAS, detalhes de como irá funcionar e seu objetivo estratégico. Dra. Maria Carolina Sabbaga destaca a importância de estreitar a comunicação entre cientistas e tomadores de decisão para benefício da população e pontua que não há evidências de fusão entre os vírus da covid-19 e da influenza, como chegou a ser especulado em redes sociais. 

“O CeVIVAS representa um avanço significativo no enfrentamento de pandemias e doenças infecciosas e entendo que a colaboração entre cientistas e tomadores de decisão é fundamental para oferecer respostas rápidas à sociedade e contribuir para um futuro mais seguro”, assinala.

Maria Carolina Sabbaga, possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade de São Paulo, mestrado em Bioquímica pela Universidade de São Paulo e doutorado e pós-doutorado em Microbiologia e Imunologia pela Universidade Federal de São Paulo. Em 2009 fez um sabático em Cold Spring Harbor Laboratory. Atualmente é pesquisadora científica VI do Instituto Butantan e livre-docente pela UNIFESP, atuando principalmente nas bases moleculares e celulares da manutenção do DNA nuclear de tripanosomas. Foi Coordenadora da área de Transferência de Tecnologia do Projeto CEPID - FAPESP e membro da Diretoria Executiva da Sociedade Brasileira de Protozoologia. É diretora do Laboratório de Ciclo Celular, coordenadora do Mestrado Profissional em Biotecnologia e Bioprocessos e Co-coordenadora da Rede de Alerta de variantes de COVID-19 no Estado de SP. 

Confira a entrevista na íntegra:

Como surgiu a ideia de criar o Centro para Vigilância Viral e Avaliação Sorológica (CeVIVAS) no Instituto Butantan e quais os principais objetivos ao estabelecer esse centro de pesquisa? 

O Butantan estabeleceu durante a pandemia, atendendo a uma demanda da população e da necessidade que a pandemia impôs, um centro de vigilância genômica para o vírus da covid no estado de São Paulo. Então, a gente criou esse centro de sequenciamento e a gente estabeleceu toda uma logística de como coletar as amostras pelo estado. O estado de São Paulo já é bem grande, o Brasil é um país enorme, então, a gente já começou estabelecendo uma logística de como coletar amostras de diferentes regiões e dividir para fazer o sequenciamento também espalhado pelo estado e não centralizado só no Butantan. Então, a gente criou essa rede que a gente chama de uma rede descentralizada para sequenciar o estado de São Paulo, o vírus de covid do estado de São Paulo, com muita celeridade, com muita rapidez. O mais rápido possível, porque é importante que a gente tenha essas informações em tempo real, saber o que está circulando no tempo real.

A gente criou essa rede na pandemia e entendeu a necessidade de ampliar essa vigilância genômica para outros vírus. E o Instituto Butantan tem um interesse específico nos vírus dos quais ele produz ou está produzindo vacinas. O Butantan produz vacina de covid, produz vacina de influenza e está trabalhando na produção da vacina da dengue. Nós resolvemos estender a vigilância genômica para esses três vírus que são de grande interesse para o Instituto Butantan e para a saúde pública, dessa forma a gente contribui com a saúde pública.

Em quais regiões ou estados brasileiros que eles serão instalados? 

Nós estabelecemos parcerias com diferentes regiões do Brasil, inclusive Mato Grosso, estabelecendo uma parceria com o LACEN, o Laboratório Central do Mato Grosso, que fica aí em Cuiabá. Então, nós estabelecemos parcerias com esses laboratórios centrais dos estados, e outras parcerias que estão sendo estabelecidas. E a ideia é que esses laboratórios parceiros que já recebem as amostras, façam o sequenciamento delas através de materiais que o Butantan disponibiliza para esses centros e através de trocas, colaborando, discutindo protocolos, discutindo os resultados, analisando juntos os resultados e trazendo para cada região do país uma rapidez, trazendo o sequenciamento e uma rapidez na análise dos resultados para que os próprios estados possam ter conhecimento do que está circulando no tempo real.

Então esses laboratórios têm estrutura para fazer esse trabalho?

Tem estrutura sim. Porque esses laboratórios foram equipados com sequenciamentos durante a pandemia. A pandemia trouxe esse ganho, se é que a gente pode falar em ganho na pandemia, mas acho que foi um ganho sim nesse sentido de aumentar a infraestrutura do sequenciamento porque se mostrou muito importante durante a pandemia.

A senhora citou quais os vírus que estão sendo feitos o sequenciamento, mas quais serão os principais benefícios que esse sequenciamento vai trazer para o desenvolvimento das vacinas do Instituto Butantan?

O que a gente pretende com esse sequenciamento é ver os vírus que estão circulando e os que evoluem com muita rapidez, ele varia o seu genoma com muita rapidez. Através do sequenciamento, a gente consegue monitorar as variações que esse vírus está sofrendo e quem são as variantes. Diante dessas informações, a gente vai ter uma parte da pesquisa que é entender se as vacinas que nós estamos produzindo continuam protegendo contra essas variantes, contra essas variações. E, se ela está protegendo, e se a gente deve aprimorar ainda mais, ou seja, a gente vai trabalhar sempre no contínuo desenvolvimento das vacinas baseado nas variações que estão acontecendo com esses vírus. E também a gente consegue ver se a vacina está protegendo, quais são as variantes que estão circulando, e a gente pode ir comunicando às vigilâncias epidemiológicas, às Secretarias de Saúde dos Estados, que podem tomar as providências cabíveis para qualquer situação.

Existe a possibilidade dos vírus Covid-19 e influenza terem se ‘fundido’ sofrendo uma mutação para um novo vírus, como foi especulado por leigos nas redes sociais?

Não, não tem nenhum caso descrito disso, não tem fusão. Esses vírus são muitos diferentes, são genomas diferentes, não tem caso de fusão, a resposta é não.

Em relação ao sequenciamento genômico do vírus SARS-CoV-2 durante a pandemia, o que os mais de 50 mil sequenciamentos realizados no estado de São Paulo revelaram sobre o cenário pandêmico e as novas cepas encontradas?

Durante toda a pandemia nós fizemos esse sequenciamento, foram 50 mil genomas ao longo da pandemia. Nós tivemos muito ganho com isso, para eu te dar alguns exemplos, na época que a variante Beta, não sei se as pessoas ainda lembram, mas teve uma época que a variante Beta apareceu na África do Sul e a gente estava com medo legítimo de que essa variante chegasse no Brasil e nós sequenciamos, nós a detectamos quando chegou em São Paulo. E, na semana seguinte, à medida que a gente continuou sequenciando, vimos que ela não ganhou força em São Paulo. Então, isso trouxe uma calma para os tomadores de decisão e para toda a população de que a variante Beta não faria o estrago que estava fazendo lá fora. Então, são informações que não trazem pânico, elas trazem uma tranquilidade.

Depois, nós vimos a variante Alfa pelo estado de São Paulo, e depois a variante Delta. Quando a variante Delta chegou, também não sei se as pessoas ainda lembram, mas a variante Delta apareceu na Índia, ela estava causando um medo enorme de que fosse chegar no Brasil porque ela estava causando muito dano no sistema de saúde pela Europa e quando ela chegou no Brasil, também nós não tivemos problema como nos outros lugares estavam tendo. Então, também nós pudemos dizer aos tomadores de decisão, “olha, a variante Delta já chegou, ela está circulando e os números de morte não estão aumentando”.

Tudo isso permite, sobretudo, que os tomadores de decisão vejam se tem que aumentar os sistemas de saúde, se pode ficar um pouco mais tranquilo, se pode ter eventos, se não deve ter, se tira a máscara, se não tira a máscara. É importante a gente saber o que está circulando, se isso está se comportando como a literatura vem mostrando, como a imprensa vem mostrando em outros países, varia de um lugar para outro, varia no contexto vacinal. Quando a variante Delta chegou aqui, nós estávamos todos vacinados.  Então, isso certamente foi uma questão importante, de que não deixou a variante causar tanto estrago no sistema de saúde. Então, essa vigilância, ela é muito importante. Depois nós vimos a Ômicron chegando e agora que você me perguntou o que está circulando, está circulando uma variante de Ômicron, que é uma XBB, e que as pessoas estão vacinadas, ainda bem, todo mundo sabe que nós estamos vivendo outro cenário.

Considerando o papel importante do Butantan na produção de vacinas para o SUS e a saúde pública nacional, como a ampliação do mapeamento de vírus estratégicos vai modificar a abordagem do Instituto em relação às atualizações necessárias para as vacinas?

Primeiro que na pandemia nós aprendemos a importância de vigilância e de monitorar a circulação desses vírus, não é que o Brasil não fazia, o Brasil sempre fez monitoramento desses vírus, de monitoramento genômico, mas o Butantan quer contribuir com esse monitoramento de uma maneira mais efetiva, que a gente possa aumentar esse quantitativo, e quando a gente sabe o que está circulando, tem confiança na vacina que está oferecendo, e a gente pode sempre pensar no contínuo aprimoramento de vacinas, como aconteceu agora, por exemplo, nas vacinas do coronavírus, que além da cepa original, de Wuhan, foi incluída uma segunda variante na fórmula da vacina, para que ela fosse mais efetiva. Quando a gente tem domínio do tipo de vírus que está circulando você consegue, por um lado, se assegurar se a vacina está ou não funcionando, e por outro, pensar em melhorias. O que nós estamos vendo dos dados preliminares que a gente está obtendo, é que as variantes que estão circulando são aquelas que foram colocadas na formulação da vacina.

Quais são os planos futuros do CeVIVAS em relação à pesquisa de vírus circulantes no país? Existem outros projetos em andamento que possam contribuir ainda mais para a prevenção e controle de doenças infecciosas?

Não, o CeVIVAS é um projeto financiado, inclusive, pela Agência de Fomento de Amparo à Pesquisa do estado de São Paulo e pela Fundação Butantan, e ele tem esse objetivo para monitorar e sequenciar esses três vírus. É claro que se aparecer alguma coisa muito importante, que precise uma urgência, nós estamos preparados, mas por enquanto, só esses três.

Por fim, como os resultados e avanços obtidos pelo CeVIVAS podem impactar a sociedade brasileira e contribuir para uma melhor preparação contra futuras ameaças virais?

A gente tem que criar essa lógica de ou melhorar ou de rápida resposta, de entender o que está circulando. Então, a gente precisa saber com serenidade, com rapidez, o que está circulando, e a gente precisa estreitar, e nós aprendemos a fazer isso na pandemia, estreitar a nossa conversa, nós cientistas, com os tomadores de decisão, com as vigilâncias epidemiológicas, com as secretarias. Aprendemos a fazer isso e eu acho que é nisso que o CeVIVAS vem ganhar velocidade na vigilância e manter e estreitar mais esse laço entre cientistas e tomadores de decisão, porque é assim que a população ganha. À medida que a gente encontrar algo suspeito, avisar essas pessoas, os tomadores de decisão, os políticos, as pessoas envolvidas com saúde, vigilâncias epidemiológicas, em tempo real.

E, a população ganha também quando a gente fala que a vacina está funcionando, que a vacina está protegendo e traz as pessoas para tomar a vacina, porque isso é importante, voltar a convencer as pessoas e combater a desinformação. Então, a ciência traz informações legítimas de que sim, a vacina está funcionando, quais as cepas que estão circulando, se elas foram colocadas na vacina, e que venham se vacinar que vai funcionar. Então, é trazer para a população essa confiança, e eu acho que o Instituto Butantan já conquistou a confiança da população, então é seguir nesse caminho.

Alguma consideração final sobre o assunto?

A conclusão é que o CeVIVAS faz o sequenciamento genômico para entender as variantes circulantes, variantes suspeitas nós pegamos para analisar, para fazer ensaios com o soro de pacientes vacinados para ver se a vacina continua protegendo contra essas variantes. Com isso, a gente quer dar confiança para a população de que o Butantan está a serviço da vida, está a serviço da população, e que as vacinas funcionam.

Bom, a gente viu a vacina ganhar uma luta aí, na pandemia, viu a ciência ganhar a luta, e a gente quer seguir nesse caminho. Quando a Delta chegou, isso ficou muito claro, a Delta estava causando problemas em outros lugares do mundo, mas o atraso que ela teve para chegar no Brasil, que é natural, tem um tempo aí para chegar, apareceu lá, vai chegar aqui, nesse tempo que ela levou para chegar, a população foi vacinada, e ela não fez o estrago que ela fez em outros locais.

Então, assim, eu acho que é isso, foi uma prova, e uma coisa que a gente sentiu na pele de um jeito muito duro, foi muito difícil passar pela pandemia. E, por outro lado, a gente viu a ciência vencer, e a gente não pode perder isso. Então, o CeVIVAS vem com esse ganho, com tudo que a gente aprendeu na pandemia, com toda a velocidade que a gente precisa sequenciar e soltar o resultado em tempo real, com tudo que a gente tem que estreitar os laços, os tomadores de decisão, com as vigilâncias, juntar a bancada do laboratório com essas instâncias municipais, estaduais e federais. E quem ganha vai ser a população.




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