• Cuiabá, 29 de Junho - 2025 00:00:00

Diversidade, Equidade e Inclusão: a arte de sorrir, cada vez que o mundo diz não


Carolina Ignarra

"Fé para quem é forte, fé para quem é f..., fé pra quem não foge à luta. Fé pra quem não perde o foco. Fé pra enfrentar esses f...!" Esses versos da música de Iza traduzem o momento desafiador enfrentado por todos que trabalhamos e acreditamos na construção de um mundo mais justo por meio da Diversidade, Equidade e Inclusão (DE&I). Apesar das barreiras e dos movimentos contrários, o foco e a resiliência permanecem como marcas dessa jornada.

A crescente onda anti-ESG (Ambiental, Social e Governança), nomeada "anti-woke", tenta enfraquecer e deslegitimar investimentos corporativos em sustentabilidade e inclusão. Porém, esse retrocesso carrega consequências claras: empresas que abandonam esses compromissos se distanciam do mercado do futuro. A agenda ESG, que inclui o fortalecimento da diversidade, não é apenas uma causa social; é uma necessidade humana, econômica e estratégica para a sobrevivência empresarial.

Mas se por um lado representa ameaça ao trabalho de algumas décadas para tentar diminuir as desigualdades sociais, por outro o movimento escancara as empresas que se apressaram em apoiar tal movimento, provando que até aqui nunca trabalharam de fato na agenda ESG. Praticaram o greenwashing e/ou socialwashing — iniciativas vazias que buscavam mais marketing do que impacto real. Essa exposição talvez seja a única "contribuição" dessa onda retrógrada, evidenciando quem realmente apoia mudanças estruturais e quem apenas seguiu tendências. Chamo de incluir por conveniência.

A situação se agrava quando um chefe de estado, como Donald Trump, desvaloriza publicamente o compromisso com pautas climáticas e de inclusão. A saída dos EUA do "Acordo de Paris" decretada por ele, somada a discursos que enfraquecem a diversidade e exterminam o amor ao próximo, revela uma postura que coloca em risco avanços sociais e ambientais conquistados a duras penas.

Essa bufonaria ainda traz o conceito distorcido de meritocracia como escudo. A meritocracia é a exclusão de base para quem é de grupos minorizados. Sua essência pressupõe igualdade de condições. No entanto, como exigir os mesmos méritos de pessoas que enfrentaram desigualdades históricas desde a infância? Para pessoas com deficiência, negros, mulheres e outros grupos, o caminho é duas vezes mais longo, e o ponto de partida, profundamente desigual.

No caso das pessoas com deficiência, a Lei de Cotas é um exemplo disso: ainda que represente um avanço, ela é frequentemente a única porta de entrada para pessoas com deficiência no mercado. Mesmo assim, a maioria dessas contratações resulta em estagnação, com profissionais permanecendo por anos na mesma posição. A meritocracia só pode ser justa quando todos têm acesso igualitário às oportunidades de desenvolvimento.

A exclusão ainda nos atinge nas interseccionalidades. Mulheres com deficiência, pessoas negras com deficiência e outros grupos que acumulam múltiplos marcadores sociais enfrentam camadas adicionais de discriminação.

Apesar dos desafios, muitas empresas continuam firmes no propósito de promover DE&I, reforçando o compromisso com um futuro mais inclusivo e sustentável. Essa postura não passa despercebida pelo consumidor, que está cada vez mais atento às ações reais das marcas.

Quando começamos a atuar na inclusão de pessoas com deficiência nas empresas esse tema era pouco valorizado e passou a ganhar força com movimentos contra o racismo, contra a homofobia, contra as intolerâncias e preconceitos. A partir daí, as empresas conheceram o rombo que a falta de políticas de inclusão da diversidade causou em tristes episódios que tiveram desfechos trágicos e de comoção pública.

A valorização do trabalho de pessoas com deficiência, por exemplo, mesmo aquém do ideal, já fomentou um nicho valioso de consumidores que agora contam com mais produtos e serviços. Com trabalho, a pessoa com deficiência desonera o INSS e movimenta a economia. Isso é notório quando percebemos agência de turismo criando pacotes específicos de viagens e passeios. Também assistimos a indústria automobilística nacional salvando seus lucros com vendas específicas de automóveis para pessoas com deficiência.

Na pesquisa "Radar da Inclusão: mapeando a empregabilidade de Pessoas com Deficiência", realizada em parceria entre a Talento Incluir, Instituto Locomotiva, Pacto Global e iO Diversidade – com 1.230 pessoas com 18 anos ou mais, que se declararam com deficiência ou neurodivergência – destacou que a maioria dos respondentes (52%) é responsável por ao menos a maior parte da renda da casa. Vejam até onde o trabalho de "formiguinha" para o avanço da diversidade já chegou. Além disso, ganhamos em representatividade, mais atores, cantores com deficiência atuando em produções de novelas, cinema, séries, propagandas etc.

As ações de DE&I no mercado de trabalho não são mais opcionais; é uma obrigação ética e econômica. Resistir aos movimentos contrários faz parte de um histórico de luta que conhecemos bem. Como diz Fernanda Montenegro, "o mundo sempre esteve para acabar". E, ainda assim, seguimos.

É preciso ter fé na força coletiva, na resiliência e na capacidade de transformação. O poder muda de lado, e os avanços que conquistamos não serão apagados. Resistiremos.

 

Carolina Ignarra é CEO e sócia fundadora do Grupo Talento, ecossistema que reúne duas empresas: Talento Incluir e Talento Sênior. É Top Voice do LinkedIn e está entre as 20 mulheres mais poderosas do Brasil, eleita pela revista Forbes em 2020. Em 2018, foi eleita a melhor profissional de Diversidade do Brasil segundo a revista Veja. Foi uma das mulheres convidadas para NGO CSW Forum, organizado pela Comissão sobre a Situação da Mulher (CSW) da ONU (Organização das Nações Unidas) em 2024.

É líder do comitê de inclusão de pessoas com deficiência da ABRH SP, colunista da revista Gestão RH e do Meio & Mensagem (Women to Watch), conselheira da Integrare e da APP (Associação de Profissionais de Propaganda). Já incluiu aproximadamente 9 mil profissionais com deficiência em mais de 800 empresas por todo o Brasil e América Latina.

Também é palestrante em importantes congressos e eventos sobre o tema, como: CONARH 2023, Women to Watch, Women on Top, Gupy Connect, HR Results, Kennoby Talks, CBTD (Congresso Brasileiro de Treinamento e Desenvolvimento), RH Congresso.

Autora dos livros: "Manual Anticapacitista" com Billy Saga, "INCLUSÃO - Conceitos, histórias e talentos das pessoas com deficiência" (disponível para download no site da Talento Incluir) e "Maria de Rodas - delícias e desafios na maternidade de mulheres cadeirantes". É co-autora do livro "Diversidade e Inclusão e suas dimensões" e personagem do documentário internacional FIVE, patrocinado pela Mastercard, que conta histórias de mulheres empreendedoras sociais ao redor do mundo. Ver documentário

É cocriadora dos Jogos Cooperativos: "Em tempo" – que propõe a diversidade na prática; "Árvore da Diversidade" - que permite que aos participantes discutam diferentes temas e situações, na busca de soluções coletivas; e "Voo da Inclusão" - desenvolvido para fortalecer o conhecimento sobre atendimento às pessoas com deficiência.

 LinkedIn: Carolina Ignarra

 

Sobre a Talento Incluir

A Talento Incluir – primeira empresa do Grupo Talento, já inseriu no mercado de trabalho mais de 9 mil pessoas com deficiência, com atuação pioneira em Consultoria, Letramento, Empregabilidade e Capacitação das pessoas com deficiência. É a única empresa do mercado a ter acessibilidade da logomarca à estratégia. Fundada em 2008, busca apoiar o desenvolvimento de carreira destes profissionais para que a inclusão aconteça de maneira produtiva, gerando impactos positivos na vida destas pessoas e na sociedade. Em toda a sua trajetória, aplicou Programas de Inclusão 360º para formar e fortalecer a cultura de inclusão em mais de 400 empresas de diversos setores em todo Brasil, como Mercado Livre, Syngenta, Gol, Carrefour, Grupo Boticário, Raia Drogasil, Bradesco, Tereos, PwC PricewaterhouseCoopers, GRU Airport, AccorHotels, Avanade, WhirlPool (Consul e Brastemp) entre outras. Para mais informações, acesse: Talento Incluir (site)




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