Samuel Hanan
A distância entre o Brasil que temos e o Brasil que queremos ou, mais precisamente, o Brasil que a população merece, é colossal. A Nação almejada é mais justa e menos desigual. Oferece oportunidades equânimes a todos os seus cidadãos e não diferencia ninguém em razão de seu local de nascimento ou da região que escolheu para viver, por exemplo.
O País desejado pelos brasileiros é aquele que desenvolve políticas públicas para melhorar a vida da população, combate a corrupção, elimina privilégios, reduz a máquina pública e aumenta sua produtividade; também, enfrenta a criminalidade, minimiza os gargalos da produção, valoriza a preservação ambiental, aperfeiçoa os serviços públicos, é rígido no controle dos gastos estatais e busca o desenvolvimento com metas e prazos.
Por que então, afinal, o Brasil chegou à complexa situação atual e como pode dar a volta por cima? As razões são inúmeras. Este artigo se propõe a discutir algumas delas na esperança de lançar luz e contribuir para a busca de soluções em momento em que a sociedade tem manifestado silêncio.
Vale tomar como recorte histórico o período pós-promulgação da Constituição Federal, em 1988, quando os desafios brasileiros se acentuaram – não por culpa da Carta Magna, que trouxe avanços importantes, mas pelos equívocos dos governantes do país nos últimos 35 anos.
Se, por um lado, a consolidação da redemocratização representa um marco histórico importantíssimo, por outro, a instituição da reeleição para os cargos eletivos do Poder Executivo, por meio da Emenda à Constituição - EC 16, aprovada em 04 junho de 1997, é responsável direta pelo agravamento da situação complexa em que o país se encontra.
Primeiro presidente da República beneficiado pelo instituto da reeleição – aprovada durante seu governo – Fernando Henrique Cardoso, anos depois fez um mea culpa e reconheceu o equívoco. Desde então, praticamente todos os candidatos em campanha se dizem contra a reeleição, porém, uma vez no poder, nenhum deles se empenha verdadeiramente para pôr fim a tal prática, contando com a conivência do Congresso Nacional. Todos – presidentes, governadores e prefeitos – invariavelmente passam a se preocupar com a reeleição a partir do primeiro dia em que assumem seus cargos.
O Brasil apresenta todas as condições econômicas para ser melhor. Ostenta a posição de 8ª maior economia do planeta. É também o 8º maior produtor mundial de petróleo e, com apenas 2,6% da população do mundo, responde por 30% da produção mundial de alimentos. Todo esse potencial, entretanto, é mal aproveitado.
Sem se preocuparem com cortar gastos, sempre excessivos, os governantes buscam a todo custo aumentar a receita por meio da tributação. Demonizam os ricos – que investem, geram empregos, riquezas e lucros – mediante discurso de que os ricos e super-ricos não gostam de pagar impostos. Podem até ter razão em parte, mas o que todo cidadão – rico ou pobre – reclama é de não saber exatamente o destino de quase R$ 5 trilhões/ano manejados pelo governo.
O país ainda penaliza os mais pobres ao não promover a correção anual da isenção do pagamento de imposto de renda. Desconsidera, com isso, a obrigatoriedade constitucional de tributar o cidadão em função de sua capacidade contributiva e até subtrai renda do brasileiro, a considerar que a inflação vai corroendo a capacidade econômica do trabalhador, a ponto de a defasagem acumulada chegar a 122% (Sindifisco, junho/2024).
Enquanto a carga tributária só aumenta – correspondia a 22,43% do PIB em 1988 (ano da promulgação da CF/88) e já superou a marca de 32,44% do PIB em 2023 –, os indicadores sociais registram parâmetros dramáticos. O maior exemplo é o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH): o Brasil ocupava a 77ª posição em 2002 e, em 2023, caiu para a 88ª colocação no mundo. Winston Churchill (1874-1965), estadista britânico, já ensinava, de maneira ácida, que: "Uma nação que tenta prosperar com base em impostos é como um homem com os pés em um balde tentando se levantar puxando a alça dele".
Nos últimos 35 anos, o Brasil também alimentou o crescimento dos gastos com o funcionalismo público, hoje equivalente a cerca de 12,8% do PIB, despesa 30% maior que a média registrada nos 38 países que compõem a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Falta ao país também o rígido e responsável controle dos gastos tributários da União, renúncias fiscais que já atingem 5% do PIB/ano, ou cerca de R$ 560 bilhões/ano, e que, ao contrário do que determina a Constituição, não se prestam a reduzir as desigualdades regionais uma vez que 63% são destinados para beneficiários das Regiões Sudeste e Sul.
O Brasil ainda perde anualmente de R$ 240 bilhões a R$ 273 bilhões com o custo da corrupção que poderia combater com mais efetividade se, por exemplo, tornasse imprescritíveis os crimes praticados contra a administração pública e retomasse a possibilidade de prisão dos perpetradores após a condenação por colegiado em segunda instância.
O Brasil é um país plural e sabemos que os dados aqui apresentados confirmam. Revelamos alguns números da pluralidade em problemas estruturais como também resultados extraordinários que seus setores produtivos e criativos exibem. Nosso profundo desejo é que as transformações necessárias vençam.
*Samuel Hanan é engenheiro com especialização nas áreas de macroeconomia, administração de empresas e finanças; é empresário, e foi vice-governador do Amazonas (1999-2002). Autor dos livros "Brasil, um país à deriva" e "Caminhos para um país sem rumo". Site: https://samuelhanan.com.br
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