• Cuiabá, 21 de Outubro - 00:00:00

Sheikh Abdussalam Almansori: o Catar, Copa e relação com o mundo


Rafaela Maximiano

A Copa do Mundo 2022 está sendo realizada no Catar, país do Oriente Médio que passa a ser conhecido pela sua cultura, religião e regras consideradas rígidas para os costumes ocidentais.  

A religião predominante no Catar é o Islamismo, ou Islã, baseada no Alcorão e para conhecer um pouco mais sobre a política, cultura e religião o FocoCidade conversou com o Sheikh Abdussalam Almansori que é ex-sheikh da mesquita de Cuiabá e atualmente é sheikh da mesquita Abu Baker Al-ssedik, em São Bernardo do Campo, estado de São Paulo.  

Segundo Abdussalam Almansori, o Catar é um país acolhedor, com uma sociedade conservadora e costumes diferentes do nosso. “O respeito garante que o visitante goze de toda proteção e respeito. Como por exemplo respeitar lugares e coisas sagradas, como locais de culto e livros religiosos. No que diz respeito às relações íntimas, nos países islâmicos não são praticadas em locais públicos, como beijar a mulher, acompanhado de um abraço”, exemplifica.  

E afirma: “qualquer pessoa pode visitar qualquer país muçulmano, e encontrará todo o respeito e atenção, principalmente em países que gozam de um grau de estabilidade política e econômica, e de disponibilidade de serviços”.  

Na Entrevista da Semana, Sheikh Abdussalam Almansori ainda fala sobre a estrutura política do país, direitos humanos, comunidade LGBTQIA+, restrição ao consumo de álcool e um ponto de equilíbrio para uma convivência respeitosa entre muçulmanos e ocidentais.  

Sobre a opinião pública mundial quanto à realização de um dos maiores eventos esportivos e de entretenimento mundial em um país islâmico arremata: “alguns meios de comunicação ocidentais lançaram uma campanha frenética contra o dossiê do Catar, e trabalharam com todas as suas forças para desacreditá-lo e enganar a opinião pública mundial com o objetivo de pressionar a FIFA e forçá-la a retirar a organização do torneio deste país, mas não conseguiu atingir seu objetivo”.

Confira a entrevista na íntegra e boa leitura!  

É importante explicar como é a estrutura política do país Catar. Estamos acostumados ao presidencialismo, monarquia, parlamentarismo e o Catar tem um Sheikh ou Emir. O que significa e como funciona essa estrutura política e a sua liderança?  

Em relação da estrutura política do país Catar, é universalmente reconhecido que todos os povos têm o direito de determinar sua condição política e escolher seu sistema político, a fim de alcançar seu desenvolvimento econômico, social e cultural. E isso é o que realmente foi alcançado para o povo do Catar, além do que o país afirma que está se transformando em uma monarquia constitucional. Então, não é importante qual é o título do líder político, se Presidente, Rei ou Sheikh. O mais importante é a estabilidade do sistema político e econômico de forma que alcance as aspirações do povo. E, o Catar é um estado de sucesso entre muitos estados árabes fracassados. O principal problema político nos países árabes é a ditadura partidária - um governo de partido único, e o problema da corrupção administrativa. E, não na pessoa do governante supremo.  

Como o muçulmano vê os direitos humanos válidos no ocidente?  

O Islam tem uma visão sublime sobre o ser humano, cheia de nobreza e grandeza a partir do dizer de Allah, altíssimo seja: “E com efeito, honramos os filhos de Adão e levamo-los por terra e mar e demo-lhes por sustento das cousas benignas, e preferimo-los, nitidamente, a muitos dos que criamos”. Essa é uma citação do Alcorão Sagrado (17:70).   

Esta visão deu aos direitos humanos no Islam particularidades e características distintas. Entre as mais importantes temos a abrangência destes direitos, eles são políticos, econômicos, sociais e intelectuais. Também são gerais para todos os indivíduos, muçulmanos e não muçulmanos, sem distinção de cor, raça ou idioma, eles também não estão sujeitos à anulação ou alteração porque estão vinculados aos ensinamentos do Senhor do Universo.  

Quanto ao Ocidente é que os povos muçulmanos acreditam que o Ocidente lida com os direitos humanos nos mundos islâmico e árabe com grande dualidade. Enquanto apoia ditaduras políticas para servir a seus interesses econômicos, ao mesmo tempo levanta slogans de direitos humanos que contradizem as crenças, costumes e tradições dos povos. Por isso os povos muçulmanos e árabes não confiam mais no Ocidente e no que ele afirma de slogans em nome dos "direitos humanos". Isso porque o Ocidente cooperou na invasão e destruição do Estado do Iraque, e manteve silêncio sobre a Rússia e a destruição da Síria pelo regime de Bashar al-Assad, apoiou o regime militar ditatorial no Egito contra um governo democrático eleito pelo povo, e permaneceu calado sobre a morte de milhões de pessoas no Afeganistão, na Líbia e Iêmen, porque os povos árabes não veem nada no Ocidente senão um mero grupo de oportunistas em busca de seus interesses, e usando causas justas para alcançar objetivos ilegítimos.  

Quais as principais diferenças culturais que um brasileiro, ou estrangeiro, deve estar atento ao visitar um país muçulmano e não passar por constrangimentos ou mesmo “ter direitos violados”?  

Qualquer pessoa pode visitar qualquer país muçulmano, e encontrará todo o respeito e atenção, principalmente em países que gozam de um grau de estabilidade política e econômica, e de disponibilidade de serviços, porque as dificuldades que as pessoas enfrentam nestes países estão mais relacionadas com os serviços, não aos direitos e liberdades.  

Em geral, as diferenças mais importantes que devem ser levadas em consideração são as diferentes leis, costumes e tradições cujo respeito garante que o visitante goze de toda proteção e respeito. Como por exemplo respeitar lugares e coisas sagradas, como locais de culto e livros religiosos.  

No que diz respeito às relações íntimas, nos países islâmicos não são praticadas em locais públicos, como beijar a mulher, acompanhado de um abraço. No que se refere ao vestuário feminino, é inapropriado que elas saiam à rua, ou mesmo à praia, de roupa íntima. São exemplos que podemos citar.  

Como o muçulmano vê a comunidade LGBTQIA+ e seus direitos?  

Se definirmos um "muçulmano" como aquele que se rende ao comando de Deus para obedecer e se submeter. Então, a decisão na vida de um muçulmano é pelo texto divino, não pela opinião pessoal.   

Sobre a homossexualidade, não há discordância entre as escolas islâmicas de jurisprudência de que a homossexualidade é proibida, seja homossexualidade entre homens, ou lesbianismo entre mulheres, e os pré-requisitos para isso. Quanto à punição para esses dois crimes: eles são diferentes. 

A sodomia, que é o sexo pleno, no sentido de relação sexual, é punível com a morte, mas depois de aplicadas as regras de prova e as regras do Código de Processo Penal, até que o juiz decida a pena, e deixa ao poder executivo a execução da decisão. Quanto ao lesbianismo, o sexo pleno, ou seja, relação sexual entre uma mulher e outra mulher, não há nele punição religiosa, mas sim uma punição avaliada pelo juiz de acordo com as circunstâncias reais.  

O muçulmano vê a homossexualidade como uma forma de destruir a família humana e mudar a criação divina do homem, homem e mulher, e tanto quanto um muçulmano acredita na liberdade pessoal de cada ser humano, ele acredita em sua responsabilidade pela continuação da raça humana na multiplicação de acordo com os ensinamentos divinos.  

E segundo o Código Penal do Catar, é proibido qualquer ato sexual fora do casamento, inclusive com consentimento entre heteros ou homossexuais, e a pena será de prisão por um período não inferior a um ano e não superior a cinco anos.  Está previsto no Código Penal do Catar nº 11 de 2004, no artigo nº 296.  

Vários veículos de comunicação mundiais publicaram que o Emir do Catar se contradisse no discurso de abertura ao citar: “que beleza juntar essas diferenças todas, essa diversidade toda para reunir todo mundo aqui”. Houve uma interpretação errada, qual sua avaliação?  

Alguns meios de comunicação ocidentais lançaram uma campanha frenética contra o dossiê do Catar, e trabalharam com todas as suas forças para desacreditá-lo e enganar a opinião pública mundial com o objetivo de pressionar a FIFA e forçá-la a retirar a organização do torneio deste país, mas não conseguiu atingir seu objetivo.  

Estas campanhas mediáticas decorrem de motivos puramente étnicos e racistas, dado que o Catar é um país árabe e islâmico. Já nos primeiros dias, o Estado do Catar provou seu valor e competência para organizar a Copa do Mundo.  

E quanto a restrição ao álcool. Por que é proibido ao muçulmano e aos visitantes de outros países consumirem? 

No que diz respeito ao consumo de bebidas alcoólicas, a proibição não é novidade, e o Catar não é o primeiro país a limitar seu consumo, pois as leis de alguns países já o proibiram como, por exemplo, a lei francesa de 1991 que regula o consumo de álcool no país, podendo também proibir seu consumo em determinados locais, como instalações esportivas.  

E de acordo com a Lei 10/1990 de 15 de outubro, o governo espanhol proibiu a venda de todos os tipos de bebidas alcoólicas e tipos de substâncias entorpecentes ou psicotrópicas nos estádios durante as competições esportivas, para prevenir a violência entre torcedores.  

E desde 1980, a venda e o consumo de álcool em estádios desportivos em Portugal estão proibidos, no âmbito do primeiro regulamento sobre a violência relacionada com o desporto.  

Tendo em vista sua vivência aqui no Brasil, você acredita que é possível uma convivência sadia e pacifica entre muçulmanos e ocidentais para que outros eventos mundiais ocorram no futuro?  

Sim. A convivência faz parte dos ensinamentos do Islã, e o Islã é uma religião e uma crença que não é definida pela geografia, e é errado opor o Islã ao Ocidente, porque os muçulmanos estão presentes no Oriente e no Ocidente, assim como existem cristãos no Oriente e no Ocidente, a religião e a crença não estão ligadas à geografia. Embora o Islã dê grande importância à geografia, em seus ensinamentos e regras. 




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