Rafaela Maximiano
“A desinformação é carente de normatização, o que tem levado a sua prática desenfreada e consciente”, dispara o presidente do Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso, desembargador Carlos Alberto Alves da Rocha, sobre fake news e eleições.
O desembargador ainda pondera que apesar de serem indispensáveis regras e punições, somente “uma educação de qualidade, envolvendo conhecimentos sobre cidadania, democracia, governos, tecnologia e afins”, mudaria o cenário da propagação de notícias falsas no país.
Eleições de 2022 é o assunto da Entrevista da Semana abordado com o presidente do TRE de Mato Grosso.
Ao FocoCidade, o desembargador Carlos Alberto Alves da Rocha revela: “ já iniciamos a realização de reuniões trimestrais com representantes partidários vigentes no Estado para tratarmos de temas relativos ao pleito” - que tem uma estimativa de R$ 21 milhões para a realização no estado.
Quanto ao eleitorado do Estado, o TRE-MT registra pouco mais de 2,2 milhões de eleitores aptos ao exercício do voto e Mato Grosso tem hoje, 414 mil eleitores com os títulos cancelados. “Em Cuiabá, o número de inscrições eleitorais canceladas é de 97.358 mil e em Várzea Grande, 45.092 mil”, informa o presidente.
A entrevista também aborda a segurança do voto e as urnas eletrônicas, o crime da compra de votos, a organização das Eleições de 2022 no Estado, entre outros assuntos.
“Sou extremamente favorável ao constante debate sobre a segurança e transparência do processo eleitoral desde que tenha como intuito a constante evolução do processo eleitoral brasileiro e das tecnologias envolvidas. E na mesma proporção sou contra quando a finalidade tem cunho político e eleitoreiro”, assinala o desembargador Carlos Alberto Alves da Rocha.
Aos candidatos e eleitores, uma ótima leitura!
Tendo em vista o cenário mais estável da pandemia no país, como o TRE-MT está se preparando para as eleições 2022, teremos alguma novidade?
Após a cerimônia de diplomação dos eleitos de uma eleição, a Justiça Eleitoral já começa a se preparar para o próximo pleito. É um fluxo constante. Após a eleição, um grupo de trabalho é constituído para avaliar como foi sua execução em todos os segmentos, desde a convocação de mesários e de colaboradores, comunicação interna e externa, transporte, segurança, treinamentos à distância, logística de materiais, patrimônio, transporte de urnas e transmissão de resultados. É com base no resultado dessas análises que melhoramos todas as etapas do processo eleitoral.
Logicamente que a Pandemia foi levada em consideração pela equipe técnica do Tribunal na elaboração do Plano Integrado para as Eleições Gerais de 2022. Na eleição passada, o TSE estipulou um protocolo sanitário que foi observado em todo o país, mas ainda não há como prever se ele será mantido, aperfeiçoado ou até mesmo retirado.
Nesse aspecto, acredito que orientações serão expedidas nas proximidades da eleição e tudo dependerá do cenário pandêmico em nosso país.
De qualquer forma, além de termos concluído o Plano das Eleições, algumas ações pontuais com foco nas Eleições Gerais de 2022 estão em andamento. As unidades elaboraram os Termos de Referências para as futuras contratações e já iniciamos a realização de reuniões trimestrais com representantes partidários vigentes no Estado para tratarmos de temas relativos ao pleito. Além disso, há um significativo investimento em capacitações para magistrados, promotores e servidores, como forma de mantê-los atualizados quanto aos normativos eleitorais vigentes e nossos sistemas.
Quanto deve custar as próximas eleições em Mato Grosso?
Ainda não é possível prever um valor exato, o que temos hoje é uma estimativa em torno de R$ 21 milhões.
E, quanto a biometria e títulos cancelados no Estado, mas principalmente em Cuiabá e Várzea Grande que são os maiores colégios eleitorais de Mato Grosso. Quais os números atualizados e como essas pessoas com títulos eleitorais cancelados poderão ter direito ao voto?
Em Mato Grosso, a revisão do eleitorado com cadastramento biométrico já foi concluída em 87 municípios, contemplando aí os maiores colégios eleitorais do Estado. Faltam 44 municípios. Não foi possível dar andamento no cadastramento, pois, ele está suspenso por determinação do Tribunal Superior Eleitoral por conta da Pandemia. Então, em relação a biometria estamos aguardando novas orientações para avançar.
Quanto ao eleitorado do Estado, estamos com pouco mais de 2,2 milhões de eleitores aptos ao exercício do voto e 414 mil eleitores com os títulos cancelados, devido à ausência às urnas por três eleições consecutivas ou pelo não comparecimento ao cadastramento biométrico obrigatório em seus municípios. Em Cuiabá, o número de inscrições eleitorais canceladas é de 97.358 mil e em Várzea Grande, 45.092 mil.
O que precisa ficar claro a esse eleitorado é que a regularização é possível e deve ser feita. Ela está ocorrendo sem a coleta biométrica. O eleitor deve procurar o cartório eleitoral em seu município ou acessar o site do TRE em Mato Grosso, o endereço é www.tre-mt.jus.br, e requerer a regularização virtualmente. A regularização é fundamental para que o cidadão possa votar e exercer diversos direitos civis.
Quais os maiores problemas que o TRE deve enfrentar na realização das eleições em Mato Grosso?
Sem dúvida nosso maior desafio é garantir a todo o eleitorado mato-grossense o exercício livre e seguro do voto. A extensão do nosso Estado é de 903 mil quilômetros, e nesse espaço, temos 109 locais de difícil acesso, que envolve a transmissão de dados por satélite. Temos 48 locais de votação em comunidades indígenas, distribuídas em 30 municípios.
Para atender essas particularidades é necessária uma logística que envolve a parceria com o exército, a utilização de barcos, aeronaves e enfrentamento de longas distâncias de estrada sem pavimentação.
Embora a Justiça Eleitoral tenha um corpo técnico com expertise em realizar as eleições, cada pleito traz um desafio e uma grande expectativa em relação a sua concretização.
Existe a possibilidade de alteração no calendário oficial das eleições ou segue normal?
Depende. O dia do pleito em si, que é no primeiro domingo de outubro e, em caso de segundo turno, último domingo de outubro, a previsão é constitucional e sua mudança só seria possível por meio de emenda à constituição aprovada pelo Congresso Nacional, como ocorreu no pleito de 2020. No entanto, se falarmos no calendário que envolve as etapas do processo eleitoral, esse é aprovado pelo Tribunal Superior Eleitoral de forma prévia. A Corte Eleitoral tem, por lei, até março do ano eleitoral para aprovar esse calendário, mas historicamente, isso tem ocorrido em dezembro do ano anterior.
Esse mês, o TSE promoveu uma séria de audiências públicas para ouvir diversos segmentos da sociedade para o aprimoramento das resoluções referentes às Eleições 2022 e elaborar esse calendário.
A denominada “compra de voto” é um fenômeno antigo, que por um certo tempo da história foi até mesmo corriqueiro.
Qual sua avaliação sobre declarações que questionam a segurança do voto e das urnas eletrônicas?
Sou extremamente favorável ao constante debate sobre a segurança e transparência do processo eleitoral desde que tenha como intuito a constante evolução do processo eleitoral brasileiro e das tecnologias envolvidas. E na mesma proporção sou contra quando a finalidade tem cunho político e eleitoreiro.
É importante destacar que a segurança das eleições é estabelecida através de um processo eleitoral, composto de várias fases, que visam mitigar os riscos mapeados. Dentre esses procedimentos se encontram as cerimônias públicas de carga e lacre, assinatura e lacração dos softwares, votação paralela, teste de integridade, Teste Público de Segurança, entre outros procedimentos de auditoria.
Em todos eles, diversos segmentos da sociedade são convidados a participar presencialmente e, historicamente, não vislumbramos a adesão. Isso coloca em xeque essas críticas ao sistema eletrônico de votação, que aliás, funciona há 25 anos sem nenhuma comprovação de fraude.
O presidente Jair Bolsonaro criticou o TSE por cassar políticos acusados de propagar fake news nas eleições passadas, ele disse “que há abuso por parte do TSE que cassou mandatos na verdade por criticarem o Tribunal”. Qual sua avaliação?
A Corte Eleitoral do TSE teve acesso ao processo e julgou com base no conteúdo probatório dos autos. Não me cabe análise dessa decisão. No entanto, se um cidadão faz uso da propagação de fake news para ser eleito, sua “conquista” está eivada de ilegalidade. A própria escolha do eleitor está “viciada”, pois sua motivação não tem bases sólidas e verdadeiras. Alegando liberdade de expressão, muitos candidatos estão promovendo à desinformação. A liberdade de expressão não é plena, ela encontra limites na injúria, calúnia e difamação. Ela não comporta violações de direitos.
“Educação não transforma o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas transformam o mundo”.
Apesar de todas as ações e alertas da Justiça Eleitoral as fake news seguem - a punição é a melhor resposta presidente?
Tem uma frase de Paulo Freire que traz a resposta a essa indagação: “Educação não transforma o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas transformam o mundo”. Então, não tenho dúvida que o caminho mais efetivo para mudar esse cenário seria ofertar a todo cidadão uma educação de qualidade, envolvendo conhecimentos sobre cidadania, democracia, governos, tecnologia e afins.
Milhares de pessoas compartilham a desinformação por falta de conhecimento sobre os temas compartilhados, por não conseguir compreender suas implicações nas áreas econômicas, sociais, nas políticas públicas. Mas uma coisa não anula a outra.
A existência de regramentos e as punições para quem descumpri-las se faz necessária em toda sociedade, mas as normas precisam existir e ser efetivas, ou seja, prever sanções que inibam, de fato, as práticas ilícitas. A desinformação é carente de normatização, o que tem levado a sua prática desenfreada e consciente.
Em relação a compra de votos - em todos os pleitos se repetem denúncias - por que na sua opinião alguns candidatos insistem em tentar essa forma criminosa para obter votos? Diria que é uma questão “cultural” no meio político?
A denominada “compra de voto” é um fenômeno antigo, que por um certo tempo da história foi até mesmo corriqueiro. Neste século, o Brasil avançou e muito no combate a esse ilícito. Primeiro, criou-se a Justiça Eleitoral em 1932, com o poder imparcial de organizar e implementar o processo eleitoral, e ainda com o poder de fiscalização, de polícia e julgamento. Depois, implantou-se o voto eletrônico em 1996. E em data não tão distante, criou-se a Lei da Ficha Limpa, que passou a vigorar desde as eleições de 2012. Enfim, a prática foi coibida e não há dúvida que sofreu significativa redução.
De fato, as denúncias continuam chegando em grande quantidade em anos eleitorais, mas não podemos afirmar, com base nelas, que os candidatos insistem nessas práticas. Muitas denúncias são infundadas e visam apenas prejudicar o candidato adversário, isso também se tornou uma prática usual e que precisa ser coibida por todos os envolvidos, candidatos e eleitores.
Qual a mensagem da Justiça Eleitoral para candidatos e também eleitores.
Minha mensagem é que os candidatos promovam a campanha eleitoral de acordo com os regramentos legais, como forma de garantir a lisura do processo e igualdade na disputa. Ao eleitor, que participem do processo democrático, pois o ato de não votar tem grande impacto na sua própria vida e de toda a sociedade.
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