Da Redação - FocoCidade
Mudanças previstas no pacote de leis de autoria do Governo do Estado, em tramitação na Assembleia Legislativa, em especial sobre os incentivos fiscais e o Fethab – Fundo Estadual de Transporte e Habitação, são passíveis de questionamentos como pontua nesta Entrevista da Semana ao FocoCidade, o advogado e consultor jurídico tributário, Victor Humberto Maizman.
A aplicação básica do Fethab, por si só, já sofre arranhões na essência da legalidade, como assinala Maizman, bastando lembrar a finalidade do fundo: para transporte e habitação – sendo desvirtuada a aplicação dos recursos ao longo dos governos do Estado, destinando parcela considerável da arrecadação para suprir o buraco do caixa público no direcionamento do pagamento da folha do funcionalismo.
Agregar ao Fethab a incidência da tributação de produtos exportados, como frisa o consultor, atinge diretamente os preceitos da Lei Kandir – sendo resguardada a esfera federal sobre a estadual.
Outro ponto analisado, integrando os projetos de lei do Governo, se atém à política de incentivos fiscais, defendida por Maizman como um dos fortes elementos na matriz do desenvolvimento socioeconômico de Mato Grosso. E a conta é simples na análise do advogado: “é melhor arrecadar menos impostos com o programa de incentivo fiscal do que não arrecadar”.
Maizman também discorre sobre o modelo ideal para maximizar a receita pública, acentuando a Reforma de Estado, além de alertar sobre o cenário de insegurança jurídica.
Confira a entrevista na íntegra:
O governo do Estado anunciou mudanças profundas no formato da política de arrecadação, leia-se o Novo Fethab, e que incide sobre a exportação. Qual sua leitura sobre a legalidade?
A contribuição para o Fethab tem o mesmo fato gerador do ICMS. Porém, de acordo com a legislação em vigor que trata de tal exigência fiscal, o pagamento de tal contribuição é condição para que não seja exigido o ICMS referente às operações efetivadas dentro do Estado de Mato Grosso. Pois bem, as operações destinadas à exportação já estão desoneradas do ICMS com respaldo na Lei Nacional denominada de Lei Kandir. Aliás, a própria Constituição Federal determina que em matéria de ICMS as isenções das operações destinadas à exportação devem ser exclusivamente regulamentadas pelo Congresso Nacional. Portanto, não pode a legislação estadual condicionar o pagamento da contribuição para o Fethab como condição da isenção prevista na Lei Nacional.
Portanto, não pode a legislação estadual condicionar o pagamento da contribuição para o Fethab como condição da isenção prevista na Lei Nacional.
Mesmo antes das alterações propostas pelo governador sobre o Fethab, o senhor por vezes alertou acerca da constitucionalidade da matéria, ou inconstitucionalidade se levado ao pé da letra a aplicação na íntegra da matéria – e desvios de finalidade...
Em matéria de fundos, à exemplo do Fethab, o Congresso Nacional editou a Lei de Responsabilidade Fiscal em que tanto a União, os Estados e municípios devem obedecer. Consta da aludida Lei que o produto da arrecadação de fundos deve ser destinado exclusivamente para a finalidade se sua instituição. No caso o Fethab foi instituído em razão de melhorar a malha viária estadual, bem como para a habitação. Porém, ao longo da vigência do Fethab os recursos arrecadados foram destinados a outras finalidades, à exemplo para pagar os salários dos servidores públicos, violando assim, a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Consta da aludida Lei que o produto da arrecadação de fundos deve ser destinado exclusivamente para a finalidade se sua instituição.
Então o novo modelo é passível de questionamentos na Justiça?
Sem prejuízo da necessidade do gestor buscar soluções para resolver o problema do desequilíbrio fiscal, é certo que deve obedecer as regras legais e constitucionais, sob pena de realmente ser objeto de demandas judiciais. O projeto em questão contém os mesmos vícios das legislações anteriores.
Mas qual seria, na sua opinião, o formato ideal do Fethab, abrindo vias para aumento da arrecadação já que o Governo não tem saída considerando o déficit direto de R$ 1,7 bilhão e que se aproxima de R$ 3,9 bilhões com restos a pagar, segundo o Executivo?
Primeiro é preciso se atentar que a arrecadação da contribuição em questão deve ser destinada apenas para despesas e investimentos em transporte e habitação conforme determina a Lei de Responsabilidade Fiscal, ou seja, não se deve esperar que seja através dos recursos do Fethab que o Estado deva sair da crise fiscal em que está. Deve ser pensado em política de desenvolvimento no sentido de atrair indústrias para o Estado e, com isso, incrementar a receita com a arrecadação de impostos. Desse modo, é melhor arrecadar menos impostos com o programa de incentivo fiscal do que não arrecadar.
Pode-se afirmar que a Reforma Tributária só poderia ser justa ao contribuinte se em contrapartida a máquina pública cumprir seu papel e se tornar eficiente do ponto de vista dos custos no bolso do cidadão - que paga as ricas estruturas dos Poderes e órgãos?
A Reforma Tributária deixou de ser a necessidade. O que deve haver é uma Reforma de Estado, onde sejam cada vez mais fixados limites para o gestor público no tocante a capacidade de gerar despesas. A máquina estatal há muito tempo passou do limite, não adianta majorar tributos se não diminuir despesas. É como tentar enxugar o gelo com uma toalha.
A máquina estatal há muito tempo passou do limite, não adianta majorar tributos se não diminuir despesas.
O Governo também anunciou crivo sobre a política de incentivo fiscal, com redução aproximada de 15% no quadro global de concessões. Como o contexto dos incentivos fiscais de Mato Grosso ainda paira na balança da indefinição sobre ações que tramitam no STF, o senhor diria que a insegurança jurídica pode ser piorada?
A limitação na concessão dos incentivos fiscais na forma como está sendo proposta será ineficaz, uma vez que em vez de atrair investimentos para o Estado irá na verdade afugentar. Não tem como pensar em desenvolvimento do Estado reduzindo os incentivos fiscais e majorando a carga tributária. Aliás, a Constituição Federal impõe ao Poder Público o dever de buscar o desenvolvimento do Centro-Oeste, não havendo outra forma senão através de critérios de atração de investimentos, leia-se, através de programas de incentivos fiscais.
E quais os reflexos para o desenvolvimento econômico do Estado sobre esse apanhado de mudanças no pacote de leis, que deve ser aprovado na Assembleia Legislativa?
Serão necessários ajustes. Como mencionado a pretensão de simplesmente majorar a carga tributária e limitar os incentivos fiscais não é a melhor forma de buscar o desenvolvimento econômico do Estado. Porém, a proposta de buscar a redução das despesas públicas vai ao encontro de uma política de desenvolvimento.
No Congresso, continua parado o projeto que prevê a regulamentação da compensação da Lei Kandir, em que pese a luta de parlamentares como o senador Wellington Fagundes. Seria uma espécie de salvação sobre os efeitos aos cofres públicos a cargo da desoneração do ICMS sobre produtos exportados. O que se pode esperar ainda em termos de resultados, na sua avaliação?
Sem prejuízo da aprovação das propostas de alteração da Lei Kandir no sentido de assegurar com eficácia o repasse da compensação decorrente da isenção do ICMS das operações destinadas à exportação, entendo que o Estado precisa buscar alternativas de não depender quase que exclusivamente de tal repasse. Deve conforme mencionado, reforçar a política de desenvolvimento do Estado através de atração de investimentos, bem como reduzir as despesas da máquina estatal, resultando assim, no aumento da receita e no consequente reequilíbrio fiscal.
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