A denominada Lei de Abuso de Autoridade, definiu os tipos penais atinentes ao crime de abuso cometidos por agente público, servidor ou não, que, no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las, abuse do poder que lhe tenha sido atribuído.
As condutas descritas na Lei constituem crime de abuso de autoridade quando praticadas pelo agente público com a finalidade específica de prejudicar outrem ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, por mero capricho ou satisfação pessoal.
De acordo com a referida lei em vigor, pode ser sujeito ativo do crime de abuso de autoridade qualquer agente público, servidor ou não, da administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de Território, compreendendo, mas não se limitando a servidores públicos e militares ou pessoas a eles equiparadas, membros do Poder Legislativo, membros do Poder Executivo, membros do Poder Judiciário, membros do Ministério Público e membros dos tribunais ou conselhos de contas.
Contudo, é certo afirmar que a fim de combater a sonegação e os crimes de lavagem de dinheiro, houve o aumento significativo de obrigações impostas aos contribuintes, cuja inobservância dá ensejo à aplicação de multas com valores altíssimos quase sempre sem qualquer relação com o tributo devido, gerando um campo fértil para arbitrariedades na esfera fiscal quando não observadas de forma razoável e em consonância com as garantias previstas na Constituição Federal.
Pois bem, independente das garantias constitucionais, a mencionada lei prevê como tipo penal do crime de abuso de autoridade, a conduta de requisitar instauração ou instaurar procedimento investigatório de infração penal ou administrativa, em desfavor de alguém, à falta de qualquer indício da prática de crime, de ilícito funcional ou de infração administrativa, ou seja, o preceito legal tem por objetivo impedir que os agentes públicos promovam a abertura de procedimentos investigatórios de natureza penal ou administrativa sem a demonstração objetiva da presença de indícios da prática de ilícito penal, funcional ou administrativo.
Portanto, é necessário que tenha um motivo objetivo para que seja aberta uma investigação, mesmo na esfera administrativa, sob pena de violar a Constituição Federal.
Aliás, o dever de motivação dos atos administrativos constitui um alicerce fundamental da atuação da Administração Pública, principalmente porque tal imposição assume uma dimensão ainda maior quando se trata do exercício do poder fiscal sobre o cidadão, hipótese em que ganham aplicabilidade as garantias constitucionais da presunção da inocência e da vedação ao arbítrio e os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade que devem nortear a atuação do Poder Público.
Desse modo, é certo que a existência de prévia motivação também constitui uma exigência do princípio da impessoalidade imposto à Administração Pública a evitar o desvio de finalidade e escolhas administrativas guiadas pelo mero capricho ou sentimento pessoal do agente público, conforme reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal, quando considerou ilegal a prática pela Receita Federal de escolher, sem a presença de critérios objetivos de seleção, contribuintes a serem fiscalizados.
Não por isso deve sempre prevalecer as garantias previstas na Constituição Federal, posto que cai como uma luva a sempre atual advertência difundida pelo Barão de Montesquieu ao sentenciar que “é uma experiência eterna de que todos os homens com poder são tentados a abusar”.
Victor Humberto Maizman é Advogado e Consultor Jurídico Tributário, Professor em Direito Tributário, ex-Membro do Conselho de Contribuintes do Estado de Mato Grosso e do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais da Receita Federal/CARF.
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