Dias desses, ao clicar em um dos sites, uma noticia se destacava das demais. Referia-se a uma festa de aniversário de um figurão. Figurão que tem bom trânsito entre empresários e agentes públicos e políticos, acostumado à etiqueta dos poderes, assíduo frequentador de salões dos palácios. Nada lhe servia de óbice. Tudo parecia estar sempre ao alcance de suas mãos. Não era, portanto, de se estranhar que se fechasse a rua, a quadra, bem no coração do bairro nobre. Todo tomado de gente grã-fina. O motorista do circular teve que dar uma volta, cortar ruelas e alcançar um atalho para concluir o seu itinerário. Itinerário mudado por causa da festa de aniversário.
Fiscais da prefeitura fizeram vistas grossas, e a polícia, fez-se de desentendida. Não ligou para o amontoado de pessoas, a despeito da recomendação sanitária, do apelo para que se evitasse a aglomeração. Os convidados vararam a noite. Desafiaram o perigo, sem darem bola para o vírus, cuja presença deixou milhares de infectados, e tirou a vida de outros tantos. E foi, exatamente, isso que chamou mais a atenção de Luiz, boquiaberto diante do que via e lia na telinha de seu notebook. Ele que se refugiou e transformou o próprio apartamento em autoexílio. Raramente deixava seus aposentos, sempre de máscara e de álcool-gel. Seus amigos debochavam dele, mesmo assim continuava entrincheirado, sem, contudo, desconectar-se daqueles.
Por meio do celular, via whatsapp, conversava, ria e discutia. Uma de suas discussões iniciou-se justamente por conta das regalias de pouquíssimos, com as bênçãos do Estado, que era, e é tido como uma enorme vaca, cujas tetas alimentavam as mesmas pessoas, já a um tempão. Gerações e mais gerações de iguais famílias. Gente de QI elevado, artistas da carteirada e beneficiados sempre das subvenções governamentais, sem que se sintam obrigados à contrapartida.
A menos que se esteja em época de eleição, ainda que seja proibida a doação por parte de empresas, não a que sai do bolso da pessoa física, mesmo entremuros de grandes magazines, conforme denuncias de 2018 que pararam nas delegacias do trabalho, ainda hoje não apuradas (estranho!), ou de envios em massas de mensagens pelas redes sociais. Isso explica os gastos de uma porção de candidatos, mesmo acima do permitido, pois, debaixo dos panos, no dizer de uma velha canção, nada é de todo impedido. Embora um ou outro tenha sido punido, cassado a candidatura.
Mas, infelizmente, muitos e muitos se safam, ainda que denunciados ou não. E são justamente esses, juntados a outros, que também se fazem passar por “novos”, defensores da “nova política”, combativos da “velha política”. A “velha” se fazendo de “nova”, incorporada, com igual vestimenta, tática e comportamento. A mesma história do candidato, na década de 1960, que se fizera passar por “novo” tão somente porque era marinheiro de primeira viagem nas disputas, era jovem e usava sapatos sem meias. Seu discurso pegou. Foi vencedor. Outros, tempos depois, se apresentaram com igual “script” e roteiro, e saíram vitoriosos. Também há os que não eram tão jovens assim, e se fizeram de “novo”, apesar de décadas no jogo político-eleitoral.
Nestes e naqueles casos, o eleitorado comprou “gato por lebre”. Curiosamente não se importou, ou finge não se importar, mesmo tendo um “produto” (o candidato eleito) “falsificado” ou de “segunda mão”. Este, em 2020, se associa a um segundo, a outro, mais e mais, e, assim, forma uma confraria de “produtos” de qualidade inferior, ou que não realiza aquilo que prometeu.
A promessa é o conteúdo do marketing, assim como também o é a meia verdade. Meia verdade não é outra coisa senão uma mentira por inteira. Afinal, a verdade nunca foi protagonista da política. Por isso, e não sem razão, o discurso político é o lugar do jogo de máscaras, com as imagens que os políticos constroem para parecerem fidedignos, estratégia discursiva de persuasão. Era sobre isso que Luiz matutava, prendia-se lá com seus botões, pois a ausência da Internet o tinha tirado do ar. É isto.
Lourembergue Alves é professor universitário e analista político.
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