• Cuiabá, 21 de Novembro - 00:00:00

Ignorância e direitos humanos

Por incrível que pareça, o obstáculo mais difícil de ser superado quando a pauta em questão é afeta aos "direitos humanos" é a incompreensão, ou ignorância mesmo, a respeito do que eles são e de quem são seus destinatários, embora pareça ser óbvia a resposta.

Primeiro, vale registrar as características dos direitos humanos, sendo eles: indivisíveis, irrenunciáveis, imprescritíveis, universais, essenciais e de validade imediata e eficácia plena, ou seja: "valem para todos, em todos os lugares a todo tempo".

Segundo, importa destacar seus princípios norteadores, quais sejam: a inviolabilidade da integridade física e emocional e ético-moral de cada sujeito; a autodeterminação e empoderamento de uma pessoa ou de povos inteiros; e a dignidade da pessoa humana.

Juntos, suas características constitutivas e seus princípios norteadores servem como vetores de manutenção e desenvolvimento civilizatório e humanitário de todos os povos e seus membros, individual, coletiva e difusamente falando.

Principalmente após a segunda guerra mundial, uma miríade de tratados e convenções internacionais passaram a proclamar e instrumentalizar os cuidados com os direitos humanos, sendo que o marco inaugural dessa temporada se deu com a criação da Organização das Nações Unidas (ONU), em 1945; outrossim, com o advento da Declaração Universal dos Direitos Humanos, datada de 1948.

Doravante, diversos Estados Nacionais reconheceram e recepcionaram tais tratados e convenções, sendo que muitos deles, senão a esmagadora maioria dos integrantes da ONU, foram além, providenciando a positivação dos referidos direitos humanos em seus respectivos ordenamentos jurídicos, especialmente em suas Constituições, sob o status de direitos fundamentais.

A mencionada constitucionalização foi acontecendo paulatinamente, seguindo, mais ou menos, a fila dos direitos humanos de primeira dimensão, de segunda até desaguar nos de terceira, respectivamente, nos direitos civis e políticos, direitos sociais, econômicos e culturais, bem como direitos à paz, dentre outros.

O rol desses direitos é interdependente e não exaurente, significando que uma dimensão depende da outra para se realizar, assim como novos direitos dessa natureza podem surgir ao longo tempo.

Todavia, apesar de seus propósitos exclusivamente humanitários, histórica e culturalmente dizendo, afora seus compromissos com a realização da tríade "liberdade, igualdade e fraternidade", conforme a epítome talhada até aqui, trabalhar com direitos humanos é um desafio - mais do que isso: um risco; seja em qual área da vida for.

Não raras vezes, aqueles que se dispuseram à fazer dos direitos humanos uma causa e/ou um sacerdócio, pagaram com a própria vida, mediante perseguição e derramamento de sangue, geralmente executados por crimes de mando, daqueles que não aceitam abrir mão de privilégios indevidos e descabidos numa sociedade que pretende ser justa.

Em razão disso é que há premente e pululante demanda por programas de proteção às vítimas e testemunhas de violações de direitos humanos, bem como aos defensores desses direitos, que atuam mormente em nome de outros, em representação ou substituição.

Não fosse suficiente os riscos corridos, por desafiar em muitas ocasiões grandes interesses políticos e sócioeconômicos, com uma certa frequência - maior do que poderia ser tolerado -, uma parcela significativa da população costuma censurar e condenar com veemência os defensores dos direitos humanos, ante desinformação e informação manipulada de fatos e atos.

Até quando vociferar-se-á ódio uns aos outros e negar-se-á a condição humana de cada um e de todos nós? Até quando vamos insistir na tese de que agindo desumanamente seremos mais humanos?

Em regra, somente quando é a própria pessoa que vacila ou que assume uma orientação contramajoritária é que ela toma consciência de sua humanidade e pede clemência para quem antes não mereceu sua graça e/ou misericórdia, e, sim, o peso de sua crítica, discriminação, preconceito e outras formas de violência física e/ou moral.

Entretanto, o ideal, o que se pretende como mínimo necessário para a preservação da espécie humana e boa e agradável convivência comunitária, seria colocarmo-nos no lugar do outro, sentir como e o que o outro pode ter sentido, estar sentindo ou vir à sentir, para, a partir desse ângulo, fechar palpites e hipóteses do que levou ou pode levar determinada pessoa a cometer um equívoco, bem como a ser quem e como ela é, em qualquer das dimensões que compõem e caracterizam sua identidade, seu caráter e sua personalidade.

Precisamos de mais humanismo entre nós, a começar de nós para com os demais, ao revés de querer que os outros nos amem primeiro e melhor do que amamos-os.

É difícil? Dificílimo! Porém, é melhor do que viver fora do amor, do altruísmo e da caridade. Não há salvação no caminho contrário.

Só o amor salva; só o amor regenera e cura a alma; só o amor pode nos devolver a condição humana, em toda sua integralidade: objetiva e subjetiva, quantitativa e qualitativa, adjetiva e substantiva.

E não se esqueça: o Criador da humanidade é amor; Deus é amor! E se Ele é por nós, quem poderá ser contra?

Por conta disso, em que pese as adversidades, que tenhamos longanimidade na defesa da equidade e paz, fazendo o possível agora, e o impossível um pouco depois, com a ajuda do Pai, do Senhor dos Céus, da Terra e dos direitos de todos nós.


Paulo Lemos é advogado em Mato Grosso e professor universitário na UNIFLOR.



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