Luciana Sonck
Na última semana, o mundo esteve atento à realização da Semana do Clima (Climate Week) em Nova York, que trouxe as tendências de futuro em relação a investimentos, quais os focos dos esforços globais em relação à mudança do clima e pontos de atenção para a emergência climática. Acompanhando alguns dias do evento, uma mensagem ficou muito clara para mim: a América Latina é vista globalmente como um dos melhores focos de investimento em fundos e projetos socioambientais.
Isso se dá por sua representação tanto em recursos naturais, como pela sociobiodiversidade da região. Para se ter ideia, a América Latina sozinha representa 31% das reservas de água potável no mundo, 47% das reservas de lítio, 36% das reservas de cobre, além da ampla diversidade em populações tradicionais - que somam milhões de habitantes - e a pluralidade em seus biomas, em especial na Amazônia.
No entanto, os impactos que as mudanças do clima trarão à região também serão proporcionalmente grandiosos. A expectativa do mercado financeiro internacional é uma perda de 4 a 14% do PIB regional em função dos impactos da mudança do clima, como já podemos observar nesse período com secas e queimadas devastadoras, bem como chuvas que causam perda de produção agrícola e devastação urbana. A perda econômica será enorme e o volume de refugiados climáticos tende a aumentar significativamente.
Apesar da consciência sobre as consequências diárias da crise climática, os investimentos na América Latina e Caribe representam hoje apenas 4% do investimento global e se direcionam apenas para a mitigação. Com isso, é preciso que os governos latinos sejam mais pró-ativos, uma vez que podemos aumentar esse percentual. É necessário que atuem também na diminuição dos riscos para os investidores com medidas efetivas contra os crimes ambientais, de desmatamento e violência contra populações tradicionais, por exemplo.
O Brasil, em especial, passa por uma polarização política que impede avanços maiores. Dentre os motivos está a demarcação de terras indígenas, colocadas em cheque com a lei do Marco Temporal, que tramita no STF (Supremo Tribunal Federal). Conforme disse uma das representantes da AMIM (Mulheres Indígenas em Mutirão), uma organização formada por mulheres de três etnias e que representava o Brasil no evento, "não há tempo para ficarmos em dúvida, a demarcação das terras indígenas é agora ou nunca". Embora existam investimentos direcionados a povos tradicionais, são poucos os que têm impacto efetivo, por não envolverem essas populações e tê-los como protagonistas.
Nesse sentido, a escuta territorial e a participação social em uma governança com justiça social para tomada de decisão, se mostra como caminho essencial para a sustentabilidade das ações e projetos investidos nas mais diversas regiões brasileiras, especialmente na Amazônia. Sendo um reforço das vozes amazônidas, como Joanna Martins - CEO da Manioca, bem apontou em artigo recente: é preciso que investidores aprendam a ouvir e construir modelos de negócio que pactuem com a cultura local, do contrário, será um investimento jogado fora.
Para isso, a redução de riscos para os investimentos na América Latina precisa caminhar. Governos alinhados à socioeconomia tenderão a receber mais investimentos. Recursos como o Tropical Forests Forever Fund (TFFF) preveem um volume de 125 bilhões de dólares para investimento em preservação florestal ao redor do mundo. Iniciativas como o Programa Eco-Invest Brasil, do Governo Federal, tem um potencial de captação de 20 bilhões de dólares em blended finance. É nesse sentido que o Brasil tem potencial de dobrar o crescimento do PIB até 2025, se não perder tempo com a polarização política doméstica e deixar passar a oportunidade de agir de forma enfática no combate aos seus pontos sensíveis.
É preciso compreender que mesmo a política externa reforçando a pauta ambiental, como na liderança do país do G20 e futuramente no Brics Plus, internamente o Brasil ainda acena para setores que não são aliados à pauta ambiental.
O desenvolvimento econômico com Soluções Baseadas na Natureza (SBN), por exemplo, enfatizadas durante a Semana do Clima, são alternativas possíveis nesse cenário. Através da criatividade, inovação, enfrentamento ao desmatamento e os crimes ambientais é que o Brasil terá alguma chance de captar um percentual maior de investimentos. No uso de soluções inovadoras em monitoramento do desmatamento, por exemplo, ainda estamos atrasados no jogo, especialmente na ciência e tecnologia - em que o país ainda é considerado um investimento de risco em IA (Inteligência Artificial), devido às dificuldades de regulamentação.
Com a COP 30 chegando em Belém em 2025, precisamos pensar na importância de investimentos estratégicos sobre as mudanças climáticas. O mundo já sofrerá a perda de pelo menos cinco biomas com o acréscimo de 1,5ºC, de acordo com os cientistas. Mesmo com as perdas, a Amazônia pode permanecer, ainda que com altíssimos impactos à sociobiodiversidade. Entretanto, seremos nós e principalmente as populações mais vulneráveis que sofrerão as consequências da crise climática batendo à porta, se continuarmos perdendo tempo.
Luciana Sonck é CEO e sócia-fundadora da Tewá 225, uma consultoria de impacto social positivo que traz soluções para os desafios socioambientais das empresas, organizações e governos.
É responsável por construir estudos e diagnósticos com parceiros como UNOPS, ONU Mulheres, UNESCO, IUCN e outros, para elaborar soluções com viés de gênero, raça, etnia, território e gestão do conhecimento. Formada em sociologia pela PUC-SP, é mestra em planejamento territorial e governança pela UFABC, além de publicar artigos acadêmicos.
Com quase 15 anos de experiência em negócios de impacto social, Sonck teve passagem pelo Instituto Votorantim e UNESCO.
É também fundadora da Butique Sustentável, iniciativa de reeducação do consumo da moda.
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