Rafaela Maximiano - Da Redação
“Hoje o momento é de completa incerteza quanto à legislação eleitoral” - avalia o professor de Direito Eleitoral e advogado militante na área eleitoral, Hélio Ramos, tendo em vista a Reforma Eleitoral que tramita no Senado Federal - PEC 125/11, PL n 1951/2021, e o Projeto de Lei Complementar 112/21, que precisam ser analisados até o início de outubro deste ano, ou seja, pouco menos de 30 dias para que as regras eleitorais tenham efeito em nas eleições de 2022.
“Com seus 896 artigos e quase 400 páginas, faz uma reformulação ampla em toda a legislação partidária e eleitoral, unificando-a em um único texto... Dessa forma, no atual cenário é impossível prever que mudanças e consequências advirão dessas alterações”, pontua o especialista apontando certezas de alterações na divisão das chamadas "sobras eleitorais", na propaganda partidária no rádio e na TV e no percentual mínimo de cadeiras para vereadoras e deputadas.
Considerando a tônica da Reforma Eleitoral na Entrevista da Semana ao FocoCidade, o advogado aborda a volta das coligações partidárias, o sistema proporcional e o voto distrital, o dobro dos votos a serem dados a candidatas mulheres e negros, Fundo Eleitoral e Fundo Partidário e janela partidária.
O especialista ainda avalia se a atual reforma eleitoral é um avanço ou um retrocesso e o que o cidadão deve observar quando for eleger seus novos representantes políticos.
O advogado Hélio Ramos é professor da Universidade de Cuiabá - nas disciplinas: Direito Eleitoral, Direito Constitucional e Direito Penal desde 2006, professor de vários cursos de pós-graduação e Cursos Preparatórios para Concurso, Especialista em Processo Civil, Direito Público, e Gestão Pública, com uma militância atuante na Advocacia Eleitoral em todo Estado.
Confira a entrevista na íntegra e boa leitura!
A PEC 125/11 prevê como ponto principal a volta das coligações partidárias, tendo em vista que elas já foram proibidas e agora querem trazê-las de volta, isso é bom ou ruim para o processo eleitoral democrático?
As coligações já se mostraram perniciosas ao processo democrático, sendo, em muitos momentos, utilizadas como moedas de troca e negociatas de bastidores que envolviam o tempo de rádio e TV, vejo como um retrocesso, pois aumenta o fisiologismo e uma prática pouco republicana na sua constituição. A coligação proporcional, passa a ser um boicote à existência dos partidos, que se enfraquecem, não demonstrando seu programa, sua ideologia, e propostas de administração. A coligação vira um grande saco de partidos que pensam totalmente diferente, com programas divergentes, posições ideológicas diametralmente opostas.
Qual a diferença entre o sistema proporcional e o voto distrital que a reforma eleitoral discute?
Numa pesquisa recente, conseguiu-se verificar cerca de doze espécies de montagens de sistemas eleitorais adotados por quase duas centenas de democracias, sendo que essa dúzia, pode ser basicamente agrupada em três grandes grupos. Os de maioria simples, os proporcionais e os mistos. Dos 199 países e territórios do estudo, 91 usavam para eleições legislativas os sistemas majoritários; 72, os de representação proporcional; e 30, os mistos, existindo ainda mais seis outros tipos que não se enquadrariam nesses grupos.
No sistema proporcional, como no Brasil, optou-se pela participação através de ideias, possibilitando um modelo de a lista de candidatos aberta, onde o eleitor vota em qualquer um dos nomes do partido, e o mais votado individualmente conquista a cadeira a que o partido fizer jus. Nos modelos majoritários, adota-se um distrito (região geográfica e/ou com quantidade de eleitores) que pode ser estado ou região, dividindo o número de distritos equivalente ao total de cadeiras em disputa. Em cada distrito, ganha o candidato que obtiver o maior número de simples de votos.
No distritão, cada estado ou município seria um distrito, não haveria sua separação em distritos menores. Diferente do sistema proporcional, em que são eleitos os mais votados dentro de cada partido, no distritão, são contados os votos para os candidatos.
A coligação vira um grande saco de partidos que pensam totalmente diferente, com programas divergentes, posições ideológicas diametralmente opostas.
Existem alguns pontos novos no texto da PEC referente às mulheres e negros, que prevê a contagem em dobro dos votos dados a candidatas e a negros para fins de distribuição entre os partidos políticos e dos recursos do Fundo Partidário e do Fundo Eleitoral. Avalia como uma medida correta ou uma forma do partido conseguir recursos e votos?
Toda ação de política afirmativa tende a procurar a igualdade que não foi alcançada de forma natural, vejo isso como positivo, inclusive cito que não é só a PEC que está com essa inovação, temos um Projeto de lei do Senado (PL n 1951/2021), já aprovado e encaminhado à Câmara dos Deputados, no dia 11 de agosto, que prevê percentual de preenchimento mínimo de vagas para candidaturas de cada sexo, dando destinação proporcional aos gastos de campanha com recursos do Fundo Eleitoral às mulheres e obrigam o preenchimento mínimo de 15% das cadeiras às mulheres nas eleições proporcionais da Câmara dos Deputados, das Assembleias Legislativas, da Câmara Distrital e das Câmaras de Vereadores, ou seja, uma reserva de vagas femininas, estabelecendo uma obrigatoriedade escalonada até chegar a 30% das vagas.
Se aprovado o texto como está, outros pontos vão impactar as eleições diretamente a exemplo: Cláusula de desempenho, Fidelidade partidária, Incorporação de partidos, Regulamentos eleitorais e Iniciativa popular. Poderia nos explicar sinteticamente cada ponto desses?
A Cláusula de desempenho implica numa medida de fortalecimento dos partidos mais orgânicos, fazendo com que os “nanicos” sem ideologia se enfraqueçam, até sumir de vez;
Fidelidade partidária é cada vez que uma alteração legislativa diminui a rigidez das filiações, ela enfraquece os partidos e via de regra enfraquece a Democracia, que não conta com partidos fortes para defendê-la;
A Incorporação de partidos é medida que faz com que um partido maior englobe um partido “nanico”, criando uma nova estrutura que pode ter uma atuação política mais regular e fortalecida;
Quanto aos Regulamentos eleitorais, hoje temos o Código eleitoral (lei 4737/1965), a lei dos Partidos (lei 9.096/1995), a Lei das Eleições (lei 9.504/1997), e a Lei Complementar nº 64/1.990, chamada de Lei das inelegibilidades;
Já a Iniciativa popular, essa carece, desde a promulgação da Constituição Federal de 88, de ser melhor regulamentada, pois, na minha visão até hoje não conseguimos efetivar essa participação popular.
Fidelidade partidária é cada vez que uma alteração legislativa diminui a rigidez das filiações, ela enfraquece os partidos e via de regra enfraquece a Democracia, que não conta com partidos fortes para defendê-la.
Alguns especialistas afirmam que a reforma feita em 2017 parecia limitada, mas ao longo do tempo trazia um ganho, que era a diminuição gradativa do número de partidos. Avalia que com a atual reforma eleitoral, continuaremos a ter incentivos para que o número de partidos seja elevado, por conta de uma aliança de interesses?
Hoje o momento é de completa incerteza quanto a legislação eleitoral, pois temos a PEC 125/11, o PL n 1951/2021, e ainda Projeto de Lei Complementar 112/21, que com seus 896 artigos e quase 400 páginas, faz uma reformulação ampla em toda a legislação partidária e eleitoral, unificando-a em um único texto, pois revoga o Código eleitoral (lei 4737/1965), a lei dos Partidos (lei 9.096/1995), a Lei das Eleições (lei 9.504/1997), e a Lei Complementar nº 64/1.990, e mais outras leis menos expressivas, mas para que as mudanças possam valer para as eleições de 2022, a Câmara e o Senado precisam aprová-las até o início de outubro deste ano.
Dessa forma, no atual cenário é impossível prever que mudanças e consequências advirão dessas alterações, eis que dentre outras serão alteradas regras na divisão das chamadas "sobras eleitorais", na propaganda partidária no rádio e na TV, no percentual mínimo de cadeiras para vereadoras e deputadas, bem como numa reforma que incluirá também as ações eleitorais.
É um período em que fica explícita a pouca importância que se dá aos partidos, usados apenas como cartórios para a validação de candidaturas ou, até, para coisas menos nobres.
Diante de todos os pontos expostos, qual sua opinião: essa reforma eleitoral é um avanço ou um retrocesso? Quais as reais consequências da aprovação dessas novas legislações e o que deve observar o cidadão que quer eleger o melhor administrador para seu país, estado e município?
Acredito que toda reforma tem como foco a mudança para melhor, mas temos que ter muito cuidado para não repetirmos os erros do passado, onde prevaleciam oligarquias e grupos de interesse que só visavam o próprio umbigo, o cidadão eleitor tem que ficar atento a essas mudanças, e principalmente utilizar essa ferramenta que hoje está ao alcance da mão no seu celular: a informação sobre tudo e sobre todos. Sempre tomando cuidado de checar o conteúdo para não cair nas “Fake News”, a chamada desinformação.
A Constituição prevê o Princípio da Anualidade, pelo qual as novas regras eleitorais só terão efeito na eleição seguinte se entrarem em vigor ao menos um ano antes da eleição. Neste caso, considerando que a eleição ocorrerá em outubro de 2022, as mudanças devem ser aprovadas, no máximo, até Setembro deste ano. Acha viável sua aprovação pelo Senado ainda este mês?
O Congresso tem pressa, e está correndo para aprovar essas mudanças, a tempo, por conta dessa anualidade, mas como disse antes, não há como afirmarmos quais serão as mudanças, eis que existem nos projetos que estão tramitando, pontos muito conflitantes entre eles.
A janela partidária, que vai até 6 de abril - não pode ser interpretada como fisiologismo, considerando o formato do troca-troca de partidos?
Na chamada "janela partidária", constitui-se um período de 30 dias, onde os deputados poderão mudar de partido sem o risco de perder o mandato, já afirmei anteriormente que isso é fruto da falta de cultura partidária, o problema é que essas mudança não são encaradas pelo eleitor como falta grave, é uma liberdade, que esfacela as bancadas no Congresso Nacional e Assembleias Legislativas, enfraquecendo os Partidos, envolvendo negociações, que vão desde recursos para campanha, horário de rádio e televisão e outras vantagens àqueles que decidirem mudar de caminho.
É um período em que fica explícita a pouca importância que se dá aos partidos, usados apenas como cartórios para a validação de candidaturas ou, até, para coisas menos nobres.
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