Rafaela Maximiano - Da Redação
Membro renomado do Ministério Público Estadual (MPE) – e referência na área por atuar em diversas investigações contra a corrupção em Mato Grosso, o promotor de Justiça, Mauro Zaque, é o entrevistado desta semana do FocoCidade.
Em sequência de tópicos, Zaque analisa um dos maiores escândalos do Estado conhecido como “Grampolândia Pantaneira” – escutas ilegais (sendo autor da denúncia), além de outras ações que atingiram a gestão do ex-governador Pedro Taques, como supostas irregularidades na esteira da Caravana da Transformação.
Na entrevista, o promotor de Justiça destaca o papel da Justiça no âmbito da celeridade de decisões; a atuação do Ministério Público em relação à situação enfrentada pelo Estado e país no quadro de pandemia do coronavírus; redução de orçamento; atuação do Gaeco (Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado) e a recente polêmica de Verbas Indenizatórias a agentes públicos – em lei “barrada” pelo Supremo Tribunal Federal – que beneficia grupo de servidores do Estado e integrantes do Tribunal de Contas do Estado (TCE).
Há mais de 10 anos concentrando suas atividades em crimes de "colarinho branco", ex-secretário de Segurança Pública de Mato Grosso, Mauro Zaque – do Núcleo da Defesa do Patrimônio Público e da Probidade Administrativa, tem seu nome cotado para ocupar funções como conselheiro do TCE e vaga de desembargador do Tribunal de Justiça.
E nesse campo, Zaque não descarta a possibilidade de adentrar em nova missão, afirmando “que não se pode fechar as portas para outras possibilidades e oportunidades”.
Confira a entrevista na íntegra:
O senhor atuou com esmero em um dos maiores escândalos de Mato Grosso, o das escutas ilegais. Que leitura faz dos resultados até agora, considerando a suposta participação do ex-governador Pedro Taques?
Realmente eu acho que foi um dos casos mais graves que Mato Grosso já viu. Um atentado contra toda a sociedade de Mato Grosso, um atentado contra a democracia, contra os princípios republicanos. E, eu fiz a minha parte que foi denunciar e aguardo que a Justiça se pronuncie. Que os culpados sejam devidamente responsabilizados. Eu só acho que a sociedade de Mato Grosso merece uma satisfação e uma resposta com relação a esses eventos. E, isso tem que ser o quanto antes. Porque a medida certa no tempo errado equivale à medida errada. Então o princípio da oportunidade tem que ser dentro do tempo correto. Eu acho que está na hora da sociedade ter uma resposta com relação a esses fatos gravíssimos da qual a sociedade de Mato Grosso foi vítima.
E, isso tem que ser o quanto antes. Porque a medida certa no tempo errado equivale à medida errada.
Em outro processo também relacionado ao período de Taques – dos contratos da Caravana da Transformação, a Justiça o questionou sobre a não citação do ex-gestor de Mato Grosso. Pode comentar?
Essa situação da Caravana da Transformação nós ingressamos com duas ações e conseguimos evitar que o Estado experimentasse um prejuízo ainda maior com relação a essa iniciativa que, com relação ao meu ponto de vista e as provas dos autos indicam, foram desastrosas para Mato Grosso. O que tínhamos que fazer, nós fizemos. Não vou questionar a situação judicial, se era para incluir A, B ou C. Eu trabalho com fatos, trabalho com provas. E, acho que o que foi deduzido em juízo é o que eu tenho em elementos probatórios robustos a serem submetidos à apreciação da Justiça e obter uma condenação segura. Eu não posso incluir nomes que eu não vislumbre até esse momento que haja a participação efetiva em quaisquer eventos dessa natureza.
Eu trabalho com fatos, trabalho com provas.
No contexto da batalha contra a corrupção – que muitas vezes figuraram em gestões públicas – a Justiça tem dado respostas céleres, na sua opinião?
Essa é uma boa notícia. Às vezes as pessoas comuns não conseguem enxergar com a amplitude necessária o trabalho que a Justiça vem fazendo no combate à corrupção. Até bem pouco tempo atrás o combate à corrupção se limitava a umas poucas ações penais com resultado quase que ineficaz. Hoje não, temos uma lei de improbidade que deixa o gestor público ou o agente público impossibilitado de se candidatar, ele responde ao patrimônio. E, o Ministério Público tem conseguido grandes avanços, lógico que com o apoio do Poder Judiciário em um trabalho alinhado, sério e focado no combate à corrupção. Estamos conseguindo fazer retornar aos cofres públicos importâncias vultuosas de dinheiro, de recursos que foram desviados anteriormente. Posso dizer sem medo de errar que de dois anos para cá foram mais de R$ 500 milhões que nós já conseguimos fazer retornar aos cofres públicos de dinheiro que havia sido desviado pela corrupção. E, esse dinheiro retorna para ações efetivas como UTIs aéreas, reforma de presídios, aparelhamento da segurança pública. Há 15 dias foram mais R$ 7 milhões para o Fundo Estadual de Saúde para ajudar no combate à pandemia do coronavírus. Enfim, eu acho que esse foi o grande avanço, a grande boa notícia que poucas pessoas têm conhecimento no sentido de que o combate à corrupção vem se tornando eficaz. Tanto no sentido de punir os agentes públicos como também no viés de fazer retornar aos cofres públicos aqueles recursos que antes foram desviados. Acho que é um grande avanço e a sociedade de Mato Grosso já começa a experimentar os resultados do retorno desses recursos que foram desviados e agora são aplicados em investimentos reais para a sociedade de Mato Grosso.
O Ministério Público busca dentro do seu mister de defensor da sociedade, vem adotando medidas no âmbito dessa pandemia para proteger da melhor forma possível toda a sociedade.
De uma forma geral, na seara da pandemia do coronavírus, como avalia o desempenho do Ministério Público acerca das ações que visam balizar administrações públicas?
No tocante à pandemia o Ministério Público, não só de Mato Grosso como do Brasil, vem desenvolvendo um papel de maior grandeza no sentido de tentar esclarecer, orientar, através de notificações recomendatórias e ações propostas para garantir a boa aplicação dos recursos públicos em prol da saúde da população. Acabei de dizer que só aqui em Mato Grosso, o Ministério Público já direcionou para o Fundo Estadual de Saúde R$ 7 milhões, e acho que valores ainda maiores. O Ministério Público busca dentro do seu mister de defensor da sociedade, vem adotando medidas no âmbito dessa pandemia para proteger da melhor forma possível toda a sociedade.
Como estão os trabalhos em relação à interiorização do Gaeco. E, nesse sentido, quais as dificuldades?
Os trabalhos em relação à interiorização do Gaeco estão caminhando bem. Em menos de um ano o Ministério Público de Mato Grosso conseguiu instituir, criar e aparelhar. Ainda faltam muitos equipamentos, softwares, para que essas unidades possam bem desenvolver o seu trabalho. Mas já conseguiu colocar para funcionar, já temos ações efetivas em Sorriso, Rondonópolis, em Barra do Garças. O Gaeco atuando em conjunto com outras instituições, que é outro passo fundamental. O Gaeco nada mais é que uma força-tarefa que agrega a Polícia Militar, Polícia Civil, Ministério Público, Polícia Rodoviária Federal, que tem prestado um apoio expressivo da maior grandeza à população de Mato Grosso, apoiando o Gaeco. Enfim, acho que os trabalhos estão já apresentando resultados em menos de um ano da criação, instalação e capacitação. E seguimos, no sentido de melhor equipar, capacitar e trabalhar outras ações no combate à corrupção, no combate à criminalidade organizada para que a gente possa ter uma entrega efetiva à população. Acredito que os Gaecos do interior estão conseguindo cumprir esse papel que a população tanto espera. Mas é muito cedo ainda, faz apenas um ano, como eu disse é necessário mais equipamentos. E, uma coisa que nos conforta é o fato de saber que esse é um incentivo do nosso procurador-geral de Justiça, José Antônio Borges, que sempre teve como norte a importância do Gaeco e está fazendo com que as unidades do interior sejam uma realidade, investindo pesado nesses Gaecos para que elas possam fazer as entregas necessárias para a população de Mato Grosso.
A tônica orçamentária é uma preocupação?
Sim. Em tempos de pandemia e que a economia está caindo, em tempos de recessão, isso vai impactar o orçamento do Ministério Público e impacta em todas as ações do Ministério, seja saúde, educação, segurança pública, Gaeco e combate às organizações criminosas. Então essa questão orçamentária preocupa a todos. Mas temos que ter calma e tranquilidade nesse momento para saber organizar nosso orçamento para seguir em frente, para poder desenvolver nossos trabalhos sem interrupção e prejuízo, de forma mais enxuta, mais econômica, até que esta situação toda tenha passado.
Com relação a essas questões de Verbas Indenizatórias eu tenho para mim bem claro que o certo é valorizar o salário, o subsídio do servidor como um todo. E, que não tenham outras verbas acessórias, os chamados penduricalhos.
Como o senhor analisa questões que geralmente provocam embate de ideias, como o direito à VI – Verba Indenizatória – de servidores públicos (considerando Poderes e órgãos)?
Com relação a essas questões de Verbas Indenizatórias eu tenho para mim bem claro que o certo é valorizar o salário, o subsídio do servidor como um todo. E, que não tenham outras verbas acessórias, os chamados penduricalhos. Eu acho que o servidor público tem uma responsabilidade muito grande. Onde ele põe a assinatura dele, ele responde por essa assinatura. Seja via improbidade, criminalmente, administrativamente. Nós precisamos de competências no serviço público e não temos e nem teremos competência no serviço público se não houver uma remuneração condizente. A remuneração tem que ser diretamente equivalente à competência da pessoa que vai gerir o que é de todos nós. É importante que haja sim uma valorização do servidor público, notadamente àqueles que exercem posições estratégicas. Não podemos, por exemplo, pensar que um secretário de Estado receba R$ 18 mil a mais. É um salário bom? É um salário muito bom, mas para um secretário de Estado que tem que responder perante ao Tribunal de Contas, ao Ministério Público, Assembleia Legislativa, CGE, PGE, a responsabilidade é muito grande e às vezes esse gestor para anos da vida dele tendo que prestar informações a respeito dos atos praticados enquanto secretário. Tem que ser valorizado, nós não teremos gente de qualidade com um salário que não seja atrativo. Acho que é uma incoerência de colocar uma pessoa à frente de uma pasta que vai fazer a gestão de R$ 300 milhões, R$ 400 milhões por ano com um salário reduzido que pode submetê-lo à riscos futuros. Mas por outro lado, defendo a valorização do salário de todo e qualquer servidor público pela importância e natureza da função que desenvolve, mas defendo também que deva ter um controle efetivo da atuação desse servidor. Ele tem que corresponder, se não corresponder tem que ser punido, tem que ser afastado, trocado, enfim. Mas ele tem que ser valorizado com a remuneração razoável e que tenha correlação com a função que desempenha.
Acho que no momento de crise financeira é necessário sim fazer uma revisão das contas públicas. Cortar gordura.
Na sua concepção, e principalmente pelo momento de crise financeira, é preciso rever os gastos da máquina pública?
Sim. Acho que no momento de crise financeira é necessário sim fazer uma revisão das contas públicas. Cortar gordura. Tentar manter os serviços essenciais trabalhando com maior desenvoltura e recolher aqueles serviços que não são tão essenciais à sociedade. É necessário que em tempos de crise nós tenhamos a sabedoria, a competência para poder reavaliar os gastos públicos. O dinheiro não aceita desaforo e é necessário que haja sim ações nesse sentido. Administrar fartura é fácil, difícil é administrar a carestia e aí sim que a gente precisa do apoio de todos no sentido de que possa haver essa reorganização orçamentária de forma que possamos passar esse período de pandemia e de recessão.
O principal desafio de cada um de nós agentes públicos e cidadãos comuns é de acreditar no Brasil, acreditar na nossa gente, acreditar que nós podemos fazer do nosso país uma grande nação.
A luta contra a corrupção coloca o senhor em posição de destaque – sendo costumeiramente aventado para ocupar postos cobiçados – como uma cadeira no TCE e/ou vaga no Tribunal de Justiça. É uma possibilidade?
Com relação a essas menções ao meu nome para um espaço, uma vaga em outras instituições eu fico lisonjeado. Sinal que uma parte da sociedade vem reconhecendo o trabalho que a gente vem desenvolvendo em prol da sociedade e eu acho que a Deus pertence. Eu estou muito bem no Ministério Público, gosto do Ministério Público. O Ministério Público deu para mim tudo o que imaginava e muito mais, enfim deu um ideal pelo qual lutar. E, a gente não pode fechar as portas para outras possibilidades, oportunidades. Temos que acompanhar com o pé no chão, com humildade. E, saber que quem é um agente público e servidor público, que tem uma vida dedicada à causa pública não pode ficar escolhendo. O que for melhor para a sociedade tem que ser ponderado e a gente tem que tentar trabalhar, porque a sociedade mais do que nunca espera e precisa muito de cada um de nós.
O que considera como seu maior desafio?
O desafio de qualquer agente público é não perder o foco. É ter a sensibilidade de saber onde a sociedade mais precisa dele, e, o que a sociedade mais espera desse agente público. Nós falamos agora há pouco em termos de remuneração, mas antes de pensarmos em remuneração temos que pensar no que a entrega efetiva que cada agente público faz para a sociedade que é quem paga seu salário. O que espero é que o país consiga, as pessoas consigam evoluir culturalmente para escolher bem seus representantes, para poder melhor cobrar as ações dos agentes públicos, que também agem por delegação dessa sociedade. Enfim, é um desafio grande trabalhar em prol da sociedade. Muitas vezes fomos incompreendidos, fomos criticados porque as pessoas não conhecem cada contexto em que as decisões são tomadas. Mas isso não pode nos desaminar. O principal desafio de cada um de nós agentes públicos e cidadãos comuns é de acreditar no Brasil, acreditar na nossa gente, acreditar que nós podemos fazer do nosso país uma grande nação.
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