Sonia Fiori - Da Editoria
Um movimento político crescente no país, e com destaque em Mato Grosso, ergueu a bandeira da unificação das eleições, e se validada a proposta no Congresso até outubro deste ano, atuais prefeitos e vereadores devem assegurar a prorrogação dos mandatos.
Se a leitura na defesa desse texto – conforme a Proposta de Emenda Constitucional 56/2019, propondo a unificação das eleições gerais e municipais, assinala ganhos como redução de custos, por outro, a interpretação jurídica afasta elementos positivos.
Nesta Entrevista da Semana ao FocoCidade, o advogado especialista em Direito Eleitoral, José Antônio Rosa, assevera aspectos contrários: “na verdade, eles querem é facilitar, tornar muito mais fácil a eleição deles para que eles possam perpetuar no poder.”
A tentativa, que já naufragou no passado, também esbarra no campo da inconstitucionalidade. “A Constituição Federal, ela não deixa dúvida nenhuma de que o mandato eletivo só pode ser, só pode existir, por sufrágio universal, ou seja, por voto. Então o que eles estão querendo no caso é mudar a regra do jogo constitucionalmente durante o jogo em andamento”.
Ressalta que “essa situação não é nova e é tentar de novo trilhar um caminho que já deu errado”.
José Rosa pontua outros tópicos de destaque, como o contexto dos mecanismos de fiscalização no combate à corrupção cada vez mais eficazes. “Cada vez mais o Ministério Público, parlamentares que têm uma vocação de fiscalização, que tem realmente observado com bastante ênfase a questão do dinheiro público, está fechando o cerco nos governantes corruptos e que usam desse expediente para governar”.
Em tempo, nesta semana presidentes de entidades municipalistas pressionam a CCJ da Câmara Federal com meta de acelerar a votação da PEC 56/2019, incluindo organização para ato em defesa da aprovação da matéria.
Confira a entrevista na íntegra:
Qual é sua impressão jurídica sobre as atuais articulações visando mudar as regras de mandatos eletivos?
Essa questão que eles estão articulando, coincidência das eleições, com tantas outras que já tentaram fazer no passado, alterações na Lei Eleitoral, as regras eleitorais, o sistema eleitoral, todas elas para mim tem só um sentido que é um dos próprios deputados federais e senadores tentar fazer com que facilite a sua reeleição. Não estão preocupados com a população, não estão preocupados com a legislação, não estão preocupados com nada daquilo que possa atrapalhá-los. Na verdade, eles querem é facilitar, tornar muito mais fácil a eleição deles para que eles possam perpetuar no poder. Essa é a impressão que eu tenho sobre esse assunto, e aí lembrando outros assuntos, por exemplo, de 2017 em que aprovaram o Fundo de Financiamento de Campanha, aumentaram o Fundo Partidário, tudo isso para facilitar a vida dos senhores parlamentares e mantê-los no poder.
Se você tivesse andando num carro e resolvesse trocar o pneu com ele andando. É o que está acontecendo aí nesse caso.
A prorrogação de mandatos já foi uma realidade não muito distante, na década de 70, quando os mandatos de prefeitos e vereadores foram prorrogados por dois anos e no mandato seguinte da última grande eleição em 1982 quando governadores, senadores, deputados federais e estaduais foram eleitos para quatro e oito anos e os prefeitos e vereadores eleitos por seis anos. Devemos tentar novamente ou vamos incorrer nos erros do passado, já que o senhor também foi legislador na Capital?
Essa situação de prorrogação de mandatos, nós vamos por parte aqui. A proposta de unificação de mandato ela vem com duas prorrogações: a primeira delas é a prorrogação de prefeitos e vereadores, agora já para o ano que vem, tendo prorrogada, a próxima eleição seria só em 2022 para coincidir com os mandatos dos governadores, deputados federais, estaduais, senador da República e presidente da República. Então teria aí uma prorrogação de dois anos de mandato. É bom lembrar que essa prorrogação anterior que você cita, ela foi feita antes da égide da Constituição Federal. A Constituição Federal, ela não deixa dúvida nenhuma de que o mandato eletivo só pode ser, só pode existir, por sufrágio universal, ou seja, por voto. Então o que eles estão querendo no caso é mudar a regra do jogo constitucionalmente durante o jogo em andamento. Se você tivesse andando num carro e resolvesse trocar o pneu com ele andando. É o que está acontecendo aí nesse caso. Além do fato que já é grave de prefeitos e vereadores, a prorrogação de mandato, tenham ainda a prorrogação de um ano de mandato dos senadores, porque dois terços dos senadores foram eleitos agora em 2018, então são 54 senadores eleitos em 2018, e esses senadores têm um mandato de oito anos. Com a prorrogação de mandatos de prefeitos e a unificação de mandato em 2022, os mandatos de senador passarão a ter 10 anos, e esses mandatos desses 54 senadores têm apenas oito anos. Portanto, ele cumpre quatro anos agora em 2022 e em 2026 cumpre os outros quatro anos. De 2026 a 2027 que é quando terá regra nova que estão propondo nas novas eleições, ele vai ficar um ano sem mandato, ou então será prorrogado o mandato de 54 senhores senadores, ou seja, dois terços do Congresso será prorrogado por um ano até que tenha novas eleições. Então essas prorrogações, elas são todas inconstitucionais, não tem previsão legal, não há previsão de que seja eleito senador biônico ou coisa que o valha, só na regra anterior antes da Constituição de 88. Nós tivemos alguns casos de nomeação de senadores biônicos mas é uma regra totalmente inconstitucional. Essa questão do aumento de mandato de quatro para cinco anos já foi tentado no Brasil. Já foi aplicado no Brasil. A unificação também foi aplicada no Brasil e não deu certo, não durou nem dois mandatos. Então essa situação não é nova e é tentar de novo trilhar um caminho que já deu errado. Além disso nós teremos uma dificuldade extra. A população quando acontece as eleições gerais, que são as eleições que aconteceram em 2018, nós vamos eleger nesse caso, cinco cargos: presidente da República, senadores, duas vagas de senadores no caso, governador do Estado, deputado federal e deputado estadual. A população mediana ela já tem uma dificuldade muito grande em absorver isso, de tentar fazer essa votação. Tanto é assim, que do maior para o menor nos cargos, aumenta muito o índice de abstenção ou de erro, ou de voto nulo ou voto branco, porque a população não consegue votar, começa a ficar nervosa, demorar muito tempo na urna e aí acaba anulando o voto. Então ele varia em torno de25% para presidente da República a 40% a deputado estadual. Colocando aí mais prefeito e vereador, nós passaríamos de uma eleição, em dois terços do senado, passaríamos para oito cargos que seriam feito eleição. Eu acho que não terá tempo hábil para votação na urna eletrônica de todo mundo que está inscrito na urna, porque demandaria tempo muito maior para essa eleição. Segundo, que a população vai ter um prejuízo enorme com a discussão política. Prefeitos e vereadores, governadores, vão passar totalmente despercebidos das eleições, deputados federais, estaduais, porque a grande disputa ficará a cargo da presidência da República e talvez dos governadores, dependendo da polarização, mas é muito difícil para a população e eles não estão pensando, vou repetir aqui, em resolver o problema da população, e sim resolver o problema ‘deles’.
E essa regra é importante que se mude para realmente ter mais agilidade e possa processar os governantes ainda no exercício do mandato e possa tirá-lo do cargo caso ele esteja dilapidando o patrimônio público.
O Brasil vive momentos de plena democracia com a eleição dos atuais governantes. Mas este não é um processo novo. Num passado recente, após a chamada redemocratização o país já viveu a chegada de um presidente maciçamente votado e posteriormente deposto. Como evitar que isto aconteça novamente?
Eu concordo que o Brasil vive uma plena democracia com a eleição dos atuais governantes, mas essa regra de deposição de prefeitos, ela está na Constituição Federal, prefeitos, governadores e presidente da República e ela vai ser seguida sempre. Depende da articulação de cada um que está no poder, depende de como ele vai se articular com os mandatários do Congresso Nacional, depende de como vai se articular com os deputados estaduais no caso os governadores, porque a regra para se manter no cargo, ela têm muitos entraves, têm muitos percalços que deve ser olhado pelos governantes, porque há muitas possibilidades da cassação do mandato, há muitas possibilidades de abertura de um processo de investigação, há muitas possibilidades que o Congresso pode se utilizar dele. Perdeu a força no Congresso, não tem a força popular, corre-se o risco de ser cassado, além disso no Brasil também há uma regra nova, um fato novo que vem acontecendo, que as eleições durante o período eleitoral, tem acontecido fatos que levam também à cassação do mandato, mesmo depois de tomado posse no cargo. É o caso de abuso de poder econômico, abuso de poder político, compra de voto, tudo isso pode levar à cassação e nós temos visto aí Brasil afora a cassação de governadores, prefeitos, com esse tipo de comportamento. Então é uma regra democrática normal que vai continuar sendo.
O senhor como operador do Direito e ex-parlamentar e ex-secretário de Estado viveu as duas faces da moeda do Poder. O Brasil mais recente, teve dois presidentes que sofreram impeachment e teoricamente isto em nada melhorou o país, como apontam especialistas. O caminho será este, a política não resolve então judicializa?
Olha são coisas distintas essa questão. Realmente eu vivi os dois lados, tanto como parlamentar quando dirigente de Estado, e esse fato ele é um fato que vai passar a ser corriqueiro na vida republicana. Primeiro porque hoje em dia a fiscalização e a descoberta de questões ligadas ao Governo, dos maus feitos ligados aos governos, ela é muito rápida. Tanto o Ministério Público quanto os parlamentares, e aí eu volto naquela frase que eu disse há pouco, que depende da articulação do governante com as casas legislativas. É importante que ele tenha uma boa relação, é importante que ele faça um bom trabalho e é importante que ele fiscalize. E quando for pego de surpresa em um tipo de comportamento e ou algum comportamento da sua jurisdição que ele tome as providências que tenha que tomar, que não espere, não passe a mão na cabeça para esperar tomar providência quando tiver achado, porque ele passa a ser cúmplice. Então essa situação de governante, é uma situação muito delicada. E não melhora a cassação do mandato desse governante para a entrada de outro governante, não significa a melhora de qualidade em hipótese nenhuma, porque a população ela acaba escolhendo não o melhor candidato, mas aquele candidato que melhor se expressou e que melhor se comunicou durante a campanha. Esse acaba sendo escolhido, independente da qualidade que ele tenha ou não para gerir ou não a coisa pública. Um exemplo disso estamos vendo aí agora o presidente da República, eleito praticamente sem fazer campanha mas se comunicou muito bem pelas mídias sociais e se elegeu. E estamos assistindo aí uma série de problemas que ele mesmo cria, que a família dele cria, que os aliados criam, desnecessários mas que criam. Então pode também não acabar bem a situação do presidente atual. Mas é um futuro que nós vamos ter que ver como isso vai ser resolvido.
Qual a mensagem que o senhor deixaria para a classe política diante de tantos ex-governantes presos?
Olha, o dinheiro público ele está cada vez mais fiscalizado. Cada vez mais o Ministério Público, parlamentares que têm uma vocação de fiscalização, que tem realmente observado com bastante ênfase a questão do dinheiro público, está fechando o cerco nos governantes corruptos e que usam desse expediente para governar. Então aquele que se dispõe a ser governante, prefeito, governador, presidente da República, pense muito bem antes de entrar nesse ramo, nessa área, e depois quando estiver lá trabalhe e fiscalizar o dinheiro como se o dinheiro fosse próprio seu, porque se assim não o fizer, ele vai ter problemas com a sua gestão e problema com a Justiça terminado o governo ou hoje até antes de terminado o governo, porque está mudando a regra do Judiciário. E essa regra é importante que se mude para realmente ter mais agilidade e possa processar os governantes ainda no exercício do mandato e possa tirá-lo do cargo caso ele esteja dilapidando o patrimônio público.
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