Da Redação - FocoCidade
Dando sequência à série de entrevistas do FocoCidade com os principais analistas políticos do Estado de Mato Grosso, nesta segunda-feira (31), o professor João Edisom pontua o contexto que aguarda o governador eleito Mauro Mendes (DEM) a partir de sua posse, nesta terça-feira (1º de janeiro).
O analista político considera que o Estado será entregue pelo governador Pedro Taques (PSDB) não marcado pela mácula da corrupção, como ocorreu na gestão Silval Barbosa, porém, muito mais “desorganizado”.
A missão de Mendes à frente do comando de Mato Grosso deverá contar com respostas imediatas, e nesse quesito, consta segundo João Edisom, um dos principais desafios: encontrar um ambiente de consenso com os servidores públicos, que amargam atraso no pagamento de salários, 13º e insatisfação em relação ao descumprimento do acordo sobre a RGA (Revisão Geral Anual).
Outro item de alerta se atém ao plano dos municípios, em que prefeitos também esperam resolução sobre repasses atrasados. O governador eleito Mauro Mendes acentua que precisará de um tempo mínimo para apresentar propostas à grave crise que assola os cofres públicos – mas João Edison chama a atenção para a “urgência de posição”.
Sobre perspectivas, assinala em trecho que “acredito que o Mauro Mendes era a pessoa certa para esse momento, para o formato de gestor que ele é, acho que é a pessoa correta para esse dado momento”.
Confira a entrevista na íntegra:
O governador eleito Mauro Mendes assume um Estado esfacelado. Quais as consequências políticas nesse processo de recuperação?
Eu acompanhei de perto a campanha do Mauro Mendes e ele era extremamente pessimista para as pessoas. Ele não prometeu nada, dizia da dificuldade, que iria ser um aperto, então por isso e pela forma com que o Pedro está saindo, eu acredito que por mais que seja difícil, ele terá um fôlego de uns quatro meses, seis meses, mas a paciência do povo não passa muito além disso. O Estado realmente está bem desorganizado e diria que o Mauro Mendes está pegando o Estado bem pior do que o Pedro pegou anteriormente, vindo lá do Silval, que tinha as roubalheiras mas tinha uma organização. Dessa vez não se trata de corrupção, se trata de desorganização do Estado, pelo menos até onde a gente sabe. Tem que atualizar muita coisa, a questão financeira muito séria, essa questão do funcionalismo tem que ser revisto e não sei como fazer isso porque a Constituição não permite retroagir em valores salariais. Tem a questão do Estado hoje gastando quase todo o dinheiro com atividade meio, então não é fácil, vai ser um semestre bem pesado. As conseqüências vai ser um desgaste. Primeiro acho que ele (Mauro Mendes) vai ter um grande desgaste com o funcionalismo público, sindicatos, é diferente da prefeitura (Cuiabá) porque é mais distante, ele vai ter uma oposição bem mais forte, mais acirrada, então acho que o primeiro desgaste vai ser com os parceiros, os colaboradores deles. Isso pode refletir nas relações com a Assembleia. Um outro grupo que está muito ansioso, que foi muito prejudicado nos últimos anos é o dos prefeitos. E os prefeitos estão esperando uma resposta rápida, porque daqui dois anos ou vão à reeleição, ou querem fazer o sucessor. Então os prefeitos não têm muito tempo para esperar o governo Mauro Mendes, sendo daqui a um ano e seis meses eles vão estar disputando a eleição ou defendendo alguém, e isso vai ter um peso grande. Acho que as duas frentes que ele terá maior dificuldade é com as prefeituras, prefeitos e com o funcionalismo público.
O Estado realmente está bem desorganizado e diria que o Mauro Mendes está pegando o Estado bem pior do que o Pedro pegou anteriormente, vindo lá do Silval, que tinha as roubalheiras mas tinha uma organização.
Mendes acerta com a escolha de sua equipe anunciada até aqui de preferência pelo perfil técnico ou deveria pesar mais a articulação política, considerando o campo na Assembleia Legislativa?
Veja bem, o Estado é bem diferente da prefeitura, são 141 municípios, o contingente de partidos políticos a participação no Estado é maior. Parte da equipe foi bem escolhida, é gente que ele conhece da relação de confiança, mas para quem tem uma Assembleia no formato que está, parte da equipe teria que ter conversado mais com os partidos políticos, e isso vai refletir na relação com a Assembleia. Esse desgaste com o MDB, por exemplo, não é legal, me parece que o PSD não está sendo atendido dentro daquilo que ele via, o próprio DEM a gente vê uma carinha feia aqui, outra ali. Eu acho que existem secretarias que são estratégicas, que ele fez escolhas muito pessoais e não era importante fazer uma escolha pessoal. Algumas assim, acho que é importante segurar a Fazenda, segurar a Educação, a Saúde colocou pessoa de confiança, mas ele poderia ter trabalhado melhor outras secretarias. Não adianta você colocar um bom técnico sem nenhuma expressão, cujo resultado tem que ser político. O técnico vai bem onde o resultado tem que ser técnico. Onde o resultado tem que ser político, tem que ser um político com capacidade técnica. E aí assim, só um técnico é sinal de desgaste, ter que trocar secretário ainda no primeiro ano. Acredito que há secretarias que ainda no primeiro ano vai ser necessário trocar de secretário.
A proposta de taxação do agronegócio deve ser refletida ou soa mais como abacaxi, já que as vozes contrárias também possuem forte peso político?
Olha, é uma coisa muito complexa. Tem que ser feito alguma coisa, isso é fato. No formato que está não dá para ficar. Nós sabemos que os grandes proprietários de terra, aliás grupos, estão comprando dos outros, daqui uns dias vamos ter uma quantidade mínima de proprietários e sobre a questão do incentivo, sobre todas essas condições, tem uma discussão que parte dela é nacional que é a questão da Lei Kandir – O Estado pode dar uma força com seus 11 federais, os 3 senadores e os 8 deputados federais, mas passa pelo Brasil todo, passa pelo presidente da República. A outra questão é os Fethabs da vida e um possível terceiro, já que tem o Fethab 1, o Fethab 2 que foi cortado mas pode voltar, tem o Fethab 3 ou alguma coisa parecida em relação a isso. É verdade quando o pessoal do agronegócio diz que paga impostos, eles pagam em questões como insumos, óleo diesel, o maquinário, e mesmo quem vende internamente paga, só que sabemos que o conjunto de incentivos que o agronegócio recebe também é muito grande. Ainda é menor que a contrapartida, então não dá para matar a galinha dos ovos de ouro, tem que tratar bem. O agronegócio é responsável pelo boom do Estado, só que não podemos ser um país que uns ficam ricos extraordinariamente enquanto a maior parte da população está com dificuldades. Hoje nós temos aí 20 ou 25 municípios mais ou menos equilibrados e quase 120 municípios numa pindaíba terrível. Não dá para ficar olhando para Primavera do Leste e Poxoréu porque lá as pessoas estão indo embora. Só porque uma tem expansão do agronegócio é grande e a outra não? A função do Estado é estabelecer o equilíbrio, e passa por mais recursos, e mais recursos passam pelo agronegócio. Agora, como o governador Mauro Mendes vai mexer nisso, aí é um problema sério porque envolve a Assembleia Legislativa, as associações, produtores, pecuaristas, envolve várias entidades do Estado. E veja bem, quem está ganhando não está muito afim não, sempre vai apresentar resultados dizendo ‘olha, está no osso, está difícil, não vamos conseguir produzir’, e a gente não pode correr o risco de essas pessoas deixarem de produzir. Então é muito delicado. Acho que ele vai contar com a parceria da Assembleia para esse debate e as pessoas estão ficando sensíveis para isso, mas acredito que o agronegócio vai endurecer bastante.
Hoje nós temos aí 20 ou 25 municípios mais ou menos equilibrados e quase 120 municípios numa pindaíba terrível.
O dilema dos salários atrasados soa, na sua opinião, como crise à vista?
A questão do salário atrasado, essa é a questão mais difícil que tem que ser feita. Não vamos discutir valor, se é muito, se é pouco o que cada um recebe. Mas a coisa mais digna é você receber no dia que está marcado para você receber, porque vivemos num mundo onde as pessoas têm compromisso. Quando você não paga o funcionário público, você cria um efeito cascata que vai desde a mercearia, o barzinho a grandes negócios, como o financiamento de carro, de casa, viagem que se estava pagando em prestação, estudo. Os bancos por sua vez, cartão de crédito, cobra multa e juros sobre isso, então gera uma crise imediata. É uma questão muito séria. O governador Mauro Mendes tem que assumir, e dar um jeito nessa questão porque ele corre o risco de ter greve no primeiro mês de Governo. O funcionalismo não vai agüentar, você imagina fevereiro professores devem estar voltando de férias, alguém acredita que professor vai voltar de férias sem receber salário ou atrasado, sem uma proposta de escalonamento? Acredito que essa é a primeira ação, tem que agir muito rápido sobre isso, porque já vai ter um desgaste sobre a questão de aumento, sobre a RGA (Revisão Geral Anual). Se ele acumular os dois, fica muito difícil de gerir, acredito que esse é o grande problema momentâneo, e não um problema dos 100 dias. É um problema para o primeiro dia de Governo.
O governador Mauro Mendes tem que assumir, e dar um jeito nessa questão porque ele corre o risco de ter greve no primeiro mês de Governo.
Perspectiva sobre o Governo Mauro Mendes.
Acredito que o Mauro Mendes era a pessoa certa para esse momento, para o formato de gestor que ele é, acho que é a pessoa correta para esse dado momento. Só que volto a dizer, o Estado é diferente da prefeitura, não tem a mesma característica, os problemas vem de longe, e provavelmente chegam para ontem e isso é muito sério. Ao mesmo tempo eu tenho esperanças que o Governo Mauro Mendes seja o Governo austero, equilibre o Estado, uma série de coisas, mas eu acredito que muita gente termina fantasiando demais. O eleitor fantasia demais e isso vai acontecer com o nacional com relação ao Bolsonaro, aliás já está acontecendo, e vai acontecer aqui em Mato Grosso. Imagina assim, sair de um Governo entrando no outro e num passe de mágica as coisas vão se resolver. Sabemos que quatro anos é muito pouco para recolocar o Estado nos trilhos. E ele está carregando um punhado de bombinhas para serem desarmadas, a história do VLT, a história do RGA que atinge o Estado inteiro, a questão do repasse aos Poderes Constituídos. É um conjunto de coisas muitos graves para você dizer assim: ‘vai ser um Governo muito legal’. Acho que não vai ser isso, não vejo essa perspectiva. Acho que vai ser um Governo que vai enfrentar muitas batalhas, muitos conflitos, mas volto a dizer, acho que dos que se colocaram como candidatos, ele é o que tem o melhor perfil, as melhores condições de fazer esse enfrentamento. Pra isso, possivelmente, acho que no final do ano ele faz um ajuste inclusive no seu secretariado. Ele precisa de mais força política, na minha avaliação ele ficou com poucas forças políticas no secretariado para implementar aquilo que precisa e vai ter que agir rápido, porque depois de um ano e meio de Governo quando começar a campanha dos prefeitos para eleição, ninguém coloca mais nada nos trilhos, é nesse período que ele vai ter que mexer e acredito que fará isso sim.
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