Em 1987 a banda nacional “Legião Urbana” diante de um país muito conturbado, perguntava: “que país é este?”. O álbum vendeu um milhão de cópias. E denunciava na abertura da música: “Nas favelas, no Senado. Sujeira pra todo lado. Ninguém respeita a Constituição. Mas todos acreditam no futuro da nação”.
Naquele ano não houve e nem haveria eleição presidencial no Brasil. A eleição viria em 1989 pra eleger o presidente Fernando Collor de Mello. Os anos seguintes seriam de tumulto institucional porque dois anos depois da posse Collor renunciou pra não ser impichado. O que se passa hoje nos remete à crise da renúncia do presidente Fernando Collor. A História tem disso. A cada ação correspondem reações iguais em sentido contrário por longo tempo.
Em 2022 o grito da Legião Urbana está de novo no ar: “que país é este?”. Houve uma eleição presidencial em dois turnos. Desde o início da eleição houve denúncias do presidente Jair Bolsonaro quanto à lisura do resultado das urnas. A eleição transcorreu nesse ambiente de discórdia entre três instituições: a presidência da República, o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral.
Finda a eleição no segundo turno em 30 de outubro, no dia seguinte começaram manifestações de caminhoneiros contrariados com o resultado da eleição. Nos dias seguintes veio se armando um crescente de descontentamento. Dos caminhões, evoluiu para bloqueios de rodovias, de cidades, manifestações com enormes multidões vestidas com camisetas amarelas nas principais capitais.
O tema foi tratado pelo Tribunal Superior Eleitoral como criminalizado. Polícias e ações de desbloqueio das rodovias. Discurso oficial de conspiração. Nas rodovias e nas ruas a definição de outra visão: a de irregularidades na apuração das duas eleições. Polarizou-se aqui o que já vinha polarizado desde 2018 na eleição de Jair Bolsonaro à presidência. Anteriormente foi entre Dilma Rousseff e Aecio Naves.
O que é preciso registrar nessa sequência de movimentos de protestos é que eles são maiores do que a simples criminalização ou sua desqualificação. Não vão parar tão cedo e como a cada ação corresponde uma reação. Quanto mais o TSE desqualifica e tenta criminalizar, mais o movimento encorpa e gera ambiente de confronto. Gente na rua, trata-se com diálogo.
A leitura de que se trata de um movimento casuísta em favor do presidente Bolsonaro, tachando-o simplesmente como “movimento de bolsonaristas”, vai na contramão da realidade. Pode ter sido. Não é mais. Viajei de Brasília a Cuiabá de carro no dia de Finados. Vi movimento pacífico, vi famílias e muitos jovens. Vi Goiânia paralisando o seu lado leste por multidões em protesto pacifico. Recordei as manifestações dos estudantes de São Paulo em 2013 contra 20 centavos nas passagens de ônibus. Vi as manifestações pró-impeachment da ex-presidente Dilma. E vi as manifestações do dia 7 de setembro de 2021 e de 2022.
Na verdade é um movimento que desde 2013 começou e não acabou. Quando acabar será de forma imprevisível. Não pode ser finalizado com a caneta do ministro Alexandre de Moraes e nem com o silêncio do STF. Países pulsam e vibram.
Quando saem do tom, é muito bom prestar a atenção. A História registra grandes transformações posteriores!
Onofre Ribeiro é jornalista em Mato Grosso.
Ainda não há comentários.