O poder seduz, atrai e corrompe. Esta é uma frase antiga. Ainda ouvida nos dias de hoje. Ouvidas porque são ditas. Talvez bem menos que em outras épocas, sem sair de evidência. Corrompe tanto que dezenas, certamente centenas, que o têm, ainda que temporário, mudam por completo seus habituais comportamentos. Mudam-se, sem ao menos ficarem vermelhos, nem saudosos do que acabaram por abandonar, obtidos e conquistados durante certo tempo da vida. É certo também que se pode ter alguém que não tenha sido corrompido pelo poder. Claro que pode. Mas para encontra-lo, vale grifar, seria como encontrar uma agulha no palheiro. Corromper-se, aqui, conjugado em todos os tempos, em um sentido bem amplo, não apenas no sentido de desvio de dinheiro, ou de pagamento e recebimento de propina. Corrompe-se ou deixa-se corromper, também, em sentido comportamental, em negociar a consciência.
Há uma frase, atribuída ao apóstolo Paulo: “Tudo me é lícito, mas nem tudo me convém”. Esta é lapidar. Exemplifica bem o que se está a dizer aqui, pois, de nada adianta conquistar o mundo, obter prestígio ou qualquer coisa, se para isso tiver que vender a própria alma, ou desviar-se da estrada pavimentada de caráter. Pavimentada ao longo da vida. E, ao longo desta, conquistou-se poder (isso é fato), inclusive o de influenciar a outrem, não necessariamente o advindo do cargo ocupado nas esferas dos poderes constituídos. O advindo de cargos, eletivos ou não, deixa ou transforma o ocupante em alguém sedutor, sem ser o Alfie (do filme), muito menos um Dom Juan, que se tornou, desde o século XVI, um personagem arquetípico, ligado a atitudes de sedução que podem ser interpretada de diversos modos, em uma perspectiva romântica e social, marcado pela compulsão.
De todo modo, o ocupante do cargo, seja quem for, e dependendo do universo de influência do próprio posto, exerce uma força de atração, capaz de hipnotizar e envolver um montão de gente. Não é ele em si, mas o imã do poder. Este imã é tão forte que até a esposa do governante, por exemplo, passa a ter regalias mil, além de paparicada por todos, os quais a chamam “carinhosamente” de “primeira-dama”, deixando de ser apenas a esposa e a mãe dos filhos do marido-governante, e, com tal status, ficar livre da lista de investigados. E olhe caro (e) leitor (a), sem ter sido eleita a coisa alguma. Não foi ela, e sim o esposo que, parece por osmose, transfere-lhe um pouco do poder obtido nas urnas. E, assim, endeusada, aclamada, paparicada aos montões. Tanto que chega, inclusive, a palpitar publicamente na gestão, dando “pitacos” e “pitos” em auxiliares diretos e indiretos, embora nada saiba a respeito de administração pública, de políticas públicas, a não ser as benesses que do poder emanam. Tudo isso é bastante estranho! Estranho e exagerado. Bem mais quando se percebe o enorme espaço midiático que lhe é destinado. E, então, passa a ser popularizada, até mais que vários secretários e ministros.
“O poder é mesmo sedutor”, diria alguém. “Ora se é” – completaria outro. Vida que se segue, com todo o jogo de marketing. Tanto que faz a população, senão toda ela, mas uma parte dela a ficar agradecida pelas benfeitorias assistencialistas das primeiras-damas. Agradecimento também aos seus esposos. Agradecem, quando, de verdade, deveriam fiscalizar, exigir e cobrar ações, atitudes, programas e planos, dos maridos-governantes, que pudessem viabilizar e concretizar as reivindicações ou promessas de campanha. Invertem-se os valores, confundem-se os papeis. O “patrão” se torna subalterno, a espera de migalhas caídas da mesa de quem ostenta o poder. Poder que de fato atrai e seduz, ou seduz e atrai, criando confusão na cabeça de muitos, até mesmo fazendo-os dividir-se em torcidas de “A” ou de “B”, desvirtuando por completo o sentido de bem-público. É isto.
Lourembergue Alves é professor universitário e analista político.
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