De acordo com a legislação vigente as despesas com remédios não podem ser abatidas do valor a ser pago do Imposto de Renda das Pessoas Físicas, em manifesta e inequívoca violação à Constituição Federal conforme verificar-se-á a seguir.
Pois bem, na sistemática de tributação da renda das pessoas físicas é adotado o sistema de dedutibilidade de certas despesas da base de cálculo do imposto.
Isso significa que o tributo não incide a renda auferida para fazer frentes a tais despesas. Esta técnica é possível porque renda e consumo se confundem. Essa assertiva decorre da constatação que a renda de alguém, em determinado período de tempo, será transformada em aumento do seu patrimônio, ou em consumo.
Nesse contexto, impedir a dedução do valor dos medicamentos em especial nessa época de pandemia revela, por si só, flagrante desrespeito da lei aos princípios constitucionais tributários, como o da isonomia, o da capacidade contributiva, o da pessoalidade e o da dignidade da pessoa humana.
Com efeito, se o contribuinte pode abater as despesas em que incorreu com médicos, dentistas e outros profissionais de saúde, sem obedecer a limite, uma vez que tais despesas se revelam involuntárias e absolutamente necessárias, não se revela lógico proibir o abatimento de gastos com medicamentos. Se assim o é, como justificar que as primeiras sejam dedutíveis e aquelas decorrentes da aquisição de medicamentos, não?
Pior ainda é aceitar a solução dada pela lei, segundo a qual se o contribuinte estiver internado em estabelecimento hospitalar e o preço dos medicamentos forem incluídos na respectiva conta, estes serão dedutíveis, isto é, a legislação obriga, ou, pelo menos, estimula, que o contribuinte/dependente se interne em hospitais para que possa deduzir o gasto com remédios.
Em outras palavras, o contribuinte internado tem um tratamento tributário mais favorecido do que o não internado, sem que se vislumbre qualquer razão lógica ou jurídica para tal discriminação.
Por outro lado, a exclusão dos gastos com medicamentos do rol das despesas dedutíveis fere, também, o princípio da isonomia, uma vez que os contribuintes que têm gastos com profissionais de saúde, tem direito ao seu abatimento, enquanto o cidadão que gasta com remédios não pode fazê-lo.
Por fim, o princípio da dignidade da pessoa humana resta desobedecido, pela situação em foco, uma vez que, ao negar ao contribuinte o direito à dedução dos gastos com remédios, gastos estes de caráter obrigatório, contribui para que não seja respeitado o chamado mínimo social, ou vital, ou existencial.
Constatado que a dedução das despesas com compra de remédios se revela direito constitucional do contribuinte, é forçoso reconhecer conforme defendido pela doutrina tributária, que este pode ser reconhecido pelo Poder Judiciário, se provocado for e, mediante a via judicial adequada, ainda que inexista previsão legal.
Isso porque é indubitável que o Judiciário não só pode, mas deve intervir, quando um direito constitucionalmente assegurado é sonegado, independentemente de haver lei reguladora.
Ao meu ver, trata-se da regra mais importante prevista na Constituição Federal, qual seja, do contribuinte poder buscar o amparo junto ao Poder Judiciário quando ocorrer lesão a seus direitos.
Victor Humberto Maizman é Advogado e Consultor Jurídico Tributário, Professor em Direito Tributário, ex-Membro do Conselho de Contribuintes do Estado de Mato Grosso e do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais da Receita Federal/CARF.
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