• Cuiabá, 07 de Julho - 00:00:00

A pandemia e a advocacia

Um vírus, invisível a olho nu, paralisou o mundo. Presenciamos nas últimas semanas uma transformação inédita em todas as áreas e segmentos de negócios. Isso significa que as coisas nunca mais serão as mesmas, ou seja, a tão desejada volta ao “normal” se tornou impossível, pelo menos no que diz respeito as relações de trabalho, a forma de comércio e as maneiras de resolver conflitos.

Esta semana, de acordo com o Instituto Dataprev, o Governo Federal registrou mais de 2,5 milhões de acordos (coletivos ou individuais) entre empresas e empregados para reduzir jornada e salário ou suspender contratos durante a crise provocada pela pandemia do novo coronavírus.

Algumas medidas foram adotadas, como o pacote de 40 bilhões de reais para financiar dois meses da folha de pagamento de empresas com faturamento entre 360 mil reais e 10 milhões de reais, com a intenção de preservar os empregos.

Os governos já estão gastando bilhões para tentar amortecer o impacto nas empresas e em seus funcionários, mas os auxílios correm sérios riscos. Não existe uma fábrica de dinheiro e a tendência é que, com o tempo e sem uma resposta urgente das autoridades para salvar a nossa economia, os recursos se esgotem.

As questões trabalhistas já são muito sensíveis e, dada a tensão entre os interesses dos empregados e empregadores, este momento desencadeou o acirramento de controvérsias, sobretudo porque inúmeros empreendimentos não conseguiram se acomodar ao novo cenário e continuar produzindo e gerando renda, o que pode ocasionar eventual falência, demandando que a empresa renegocie suas dívidas.

O Conselho Nacional de Justiça editou no dia 20 de abril de 2020 a resolução 314 prorrogando a resolução 313/2020 que estabeleceu no Poder Judiciário o regime de plantão extraordinário e modifica as regras de suspensão de prazos processuais. Assim, somente a partir do dia 4 de maio de 2020 os processos judiciais e administrativos eletrônicos terão os prazos processuais retomados, sem qualquer tipo de escalonamento. Todavia, a suspensão dos prazos dos processos físicos foi prorrogada até 15 de maio do corrente ano.

Os Tribunais brasileiros, portanto, estão fisicamente fechados e virtualmente abertos somente para assegurar a manutenção dos serviços essenciais. A boa notícia é que o diálogo, a colaboração, a busca conjunta por soluções com o uso dos métodos extrajudiciais de solução de conflitos auxiliados pela tecnologia, compõem a essência do acesso à Justiça.

O vice-presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), ministro Vieira de Mello Filho, recomendou, no final de março, a adoção de instrumentos de mediação e conciliação para a solução de conflitos individuais e coletivos.

Os métodos adequados (extrajudiciais) de solução de conflitos, também chamados de MASC´s, a saber, conciliação, mediação e arbitragem, são a maneira mais rápida, econômica e eficiente que a advocacia pode utilizar neste momento de pandemia que dispõe da mesma segurança jurídica do judiciário.

Destacando, inclusive, que os advogados podem levar para mediação ou arbitragem os conflitos que já estão judicializados, desde que possam ser negociados, bastando que seja da vontade de ambas as partes.

A lógica dos métodos extrajudiciais de resolução de conflitos é criar um grande filtro na esteira de processos, evitando que litígios que possam ser negociados sejam enviados ao judiciário. A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) estima que 40% das ações poderiam ser solucionadas sem a interferência de magistrados, o que geraria uma economia de R$ 63 bilhões por ano aos cofres públicos.

Com as plataformas virtuais existentes no mercado, a resolução de um conflito de forma online e extrajudicial chega a ser 80% mais célere que o processo tradicional, 70% mais econômico e com uma conversão de acordos 200% maior.

O advogado 4.0, ou seja, o advogado multidisciplinar, que foca nos interesses de seu cliente e atualizado com as inovações e tendências do mercado, sabe que não pode continuar exercendo a velha advocacia. É preciso ter visão de futuro e implementar em seu ofício todas as ferramentas que proporcionam executar o serviço de forma mais eficiente e em menos tempo.

Os conflitos sempre vão existir e neste momento de pandemia com certeza irão aumentar. Pessoas e empresas vão buscar renegociar seus contratos, repensando seus negócios e suas relações de trabalho, considerando a nova realidade. E é o advogado, primeira porta de acesso do cliente e responsável por lhe prestar assessoria jurídica que vai analisar a situação e indicar o melhor caminho para resolver o conflito de seu cliente, visando reduzir custos, tempo, encurtando distâncias e focado na eficiência.

O momento exige uma mudança de mentalidade, uma quebra de paradigmas, a mudança da cultura da sentença para a cultura do diálogo. A mediação e a arbitragem já estão sendo utilizadas há anos e os advogados que não enxergarem essa nova realidade ficarão obsoletos e serão substituídos, assim como a máquina de escrever foi substituída pelos computadores, posto que essa substituição não afetou “o que” se escreve, mas “a forma” como se escreve.

 

Melanie de Carvalho Tonsic é Advogada. Mestranda em Resolução de Conflitos e Mediação pela Universidade Europea del Athántico. Especialista em Negociação, pela CMI Interser, no Harvard Faculty Club, Cambridge/MA. Especialista em Mediação de Conflitos na Universidade de Salamanca – Espanha. Especialista em Mediação e Arbitragem na Universidade Portucalense – Portugal. Mediadora. Arbitralista. Fundadora e CEO da ACORDIA Câmara de Conciliação, Mediação e Arbitragem. Membro da Comissão de Mediação e Arbitragem da OAB/MT.  



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