• Cuiabá, 21 de Novembro - 00:00:00

Tragicômico Papel

Há muito, esta coluna tem como tema central o jogo político, discussão e o discurso político. Muita coisa já foi escrita. Outras tantas ainda não. Isto em razão do espaço. Mesmo assim, procurou-se trazer o mais variado dos assuntos e a mais abrangente das leituras. Textos escritos, sempre, com olhar crítico, sem amarração, independentemente da esfera de poder, da agremiação partidária ou do governante. Distantes, portanto, do posicionamento de torcedor, de partidário. Tanto que as linhas que compõem esta coluna sempre estiveram, estão e estarão atentas aos acertos e aos desacertos, pois não há governo que só acerta ou só erra. Jamais o de agradar um ou outro agente político, agente público. O agradar soa como bajulação. Tal atitude é repugnante, abominável, não apenas para o estudioso da política. Aliás, o próprio Maquiavel, em seu livro mais famoso, “O príncipe”, recomendou aos príncipes que tivessem cuidado e desconfiassem dos puxassacos. Recomendação, porém, ignorada. Tanto que os coronéis, chefes e os agentes políticos que exercem a chefia da administração pública no país preferem excluir quem não lhes são “camaradas”, ou se recusam a bajulá-los, ou não se deixam levar pelos encantos palacianos. Isto explica o porquê atacam a imprensa. Atacam, na verdade, a parte da imprensa que aponta seus erros, denuncia seus absurdos. Absurdos e erros repetidos, ainda que tenham feição de inéditos, a exemplo do pedido desmedido do governo Mauro Mendes pela “suspensão” da eleição suplementar para ocupar a cadeira do Senado, então ocupada pela senadora Selma Arruda.  

O governo alega “inexistência de vaga aberta”, uma vez que “o rito de cassação” não fora “finalizado” pela Câmara Alta. É verdade que o presidente do Senado, propositadamente, joga para frente à declaração de vaga da referida cadeira, vendendo à falsa ideia de que a Casa que preside tem o papel de revisora de decisão judicial. Não tem. Inexiste qualquer menção a respeito disso no artigo 52 da Constituição Federal. Em seguida, o governo mato-grossense lamenta o não cumprimento da decisão do ministro e presidente do STF, Dias Toffolli, e, deste modo, “a senadora remanesce no exercício de suas funções sem data para deixá-lo”. Acontece, (e) leitor, nem a Carta Magna, tampouco a legislação eleitoral garante a posse do 3º. colocado na disputa de 2018. Além do mais, uma lei de 2013 determina nova eleição para o preenchimento da vaga, e foi, justamente, por isto, que o TRE/MT, por seis votos a um, advogou novo pleito. Decisão confirmada pelo TSE – última instância da Justiça Eleitoral.

Não satisfeito, o governo volta com a seguinte lengalenga: “se o cargo de senador está ocupado, a finalidade da eleição já está alcançada, restando completamente descabida a realização do certame, ao menos enquanto as decisões judiciais do TSE e do STF estejam pendentes de cumprimento”. Neste trecho, o governo deixa claro sua pretensão com o seu descabido pedido de suspensão da disputa marcada para o dia 26 de abril. Governo que deixa de lado a defesa do Estado e da sociedade mato-grossense para abraçar de corpo e alma a causa de um postulante ao Senado. Atitude melancólica, trágica, agressora a vontade do eleitorado, que elegeu o governador.   

E prossegue com a sua pretensão: “o Tribunal Regional Eleitoral estima que será necessário despender mais de oito milhões de reais para fazer frente aos custos necessários para operacionalizar a eleição”. E, então, “seria mais prudente e sensato que se aproveitasse os dispêndios e mobilizações federais e estaduais já programadas para este período para que fosse realizada a eleição suplementar de senador em conjunto com as eleições ordinárias para prefeitos e vereadores”. Tem certa lógica. Mas ou a continuação da Selma Arruda ou a posse de Carlos Fávaro no Senado não é opção aceitável, pois está eivada da imoralidade e da ilegalidade.

Por fim, o governo se vale “da rápida proliferação do vírus conhecido como coronavirus-19”. Afinal, “a realização de eleição no mês de abril do corrente ano vai na contramão das orientações preventivas de proliferação do coronavirus”, pois “o certame eleitoral”envolve aglomerações de pessoas”. Tragicômica. Bastante triste o papel que o governo e o governador procuram desempenhar. É isto.

 

Lourembergue Alves é professor universitário e analista político. E-mail: Lou.alves@uol.com.br.               



0 Comentários



    Ainda não há comentários.