Definitivamente não podemos mais deixar de considerar os efeitos da epidemia causada pelo coronavírus no crescimento na economia mundial, brasileira e de Mato Grosso.
Os fatos dos últimos dias confirmam os receios iniciais de que as autoridades chinesas não conseguiriam contornar a doença em prazo razoavelmente curto. Fevereiro está findando e os casos de contaminação aumentam em território chinês e se alastram para vários países, com maior gravidade na Itália e Japão. E, em pleno carnaval, o indesejado visitante chega ao Brasil.
Os mercados financeiros de todo o mundo iniciaram esta quarta feira,26, tremulantes e nervosos. No Brasil não foi diferente. A Bolsa B3 começou operando com queda acima de 7%. É a maior queda desde o “Joesley Day”, em 2017, quando veio a público a gravação feita pelo empresário Joesley Batista, de uma conversa comprometedora que teve com o então Presidente da República Michel Temer. O dólar fechou o dia próximo de R$ 4,50, exigindo intervenção providencial do Banco Central para evitar maior desvalorização da moeda nacional. Nenhum pânico. A volatilidade é ocasionada pelas incertezas econômicas que afetam a economia mundial em decorrência da demora das autoridades chinesas em controlar a epidemia.
Não é a primeira vez que a China apavora o mundo com a possibilidade de pandemia iniciada em seu território. Já havia acontecido com a Síndrome Respiratória Aguda Grave – SARS, em 2003.
Por ter se tornado a segunda maior economia mundial e apresentar trajetória de crescimento acelerado nas últimas décadas, a freada brusca da atividade econômica chinesa repercute em toda a economia global, afetando as cadeias de suprimentos das indústrias de todos os países. Ao mesmo tempo, a paralisia comercial daquele país reduz suas importações, afetando a atividade econômica mundial já que praticamente todos os países importam e exportam para a China. A restrição de circulação de pessoas reduz drasticamente as viagens de negócios e o turismo mundial. Grandes corporações industriais que tem suas cadeias de suprimentos baseadas na China e empresas exportadoras de commodities já anunciaram a redução de suas metas anuais de faturamento e lucros. Um dos setores mais afetados, as companhias aéreas sofrem com o cancelamento em série de vôos e já antecipam perdas expressivas em seus balanços do primeiro trimestre. Analistas, bancos e consultorias econômicas internacionais dão como certo que o primeiro trimestre está praticamente perdido e revisam suas expectativas de crescimento do PIB mundial para 2020.
Se o cenário mundial não é dos mais favoráveis, em âmbito nacional não será muito diferente. A China é o maior parceiro comercial do Brasil por ser grande compradora de nossas principais commodities: minério de ferro, petróleo cru, soja, milho e carnes suínas, bovinas e de frangos. O cordão de isolamento comercial estabelecido pelas autoridades chinesas reduzirá as nossas exportações no primeiro trimestre, gerando consequências nas expectativas de retomada do crescimento do país para este ano.
A economia de Mato Grosso sentirá, em intensidade menor que a do país, os efeitos da epidemia de saúde que transformou-se em crise econômica. A China é destino de 43% de todas as exportações de nossas principais commodities agropecuárias: soja, milho, algodão e carnes. A despeito de contratados anteriormente, as entregas ficam prejudicadas com a suspensão das movimentações de cargas. A produção mato-grossense certamente será realocada para outros mercados, mas isso não se dará imediatamente. Parte da produção terá espaço no mercado doméstico brasileiro, com o aumento de consumo de soja derivado da elevação da mistura do biodiesel (B11) no diesel e aumento do consumo de ração animal (frangos, suínos e bovinos). Esse fato fez aumentar o esmagamento de soja nos dois primeiros meses do ano, compensando a redução das exportações. O consumo interno do milho também cresceu puxado pelo aumento da sua utilização para ração bovina e pelo forte crescimento da indústria de etanol de milho com instalação de novas plantas industriais.
Como Mato Grosso iniciou o ano com expectativa alta de crescimento do seu PIB em 2020, trabalho com o cenário de que os impactos da crise terão seus efeitos mitigados pelas idiossincrasias de nossa economia. Mesmo assim, é preciso que a solução do problema não se arraste além do primeiro trimestre.
Vivaldo Lopes é economista formado pela UFMT, onde lecionou na Faculdade de Economia. É pós-graduado em MBA Gestão Financeira Empresarial-FIA/USP (vivaldo@uol.com.br)
Ainda não há comentários.