• Cuiabá, 23 de Novembro - 00:00:00

Ludicidade perniciosa

A malevolência lúdica do brasileiro cobra um preço alto no dia a dia do cidadão, uma vez que tem inibido o crescimento econômico, travado o desenvolvimento social e impedido que muitos possam sonhar com um futuro melhor. Na base do tudo é piada ou vira comédia, estamos sepultando o nosso futuro.

O quadro do programa Fantástico, da Rede Globo de televisão, “Isso a Globo não mostra”, tem como alvo preferido é o presidente da República, seu declarado desafeto. Só para lembrar que isso não é exclusivo deste presidente, a ex-presidente Dilma Rousseff talvez tenha sido a maior vítima deste comportamento dentre todos os presidentes do país, era motivo de constantes chacotas.

Rir indiscriminadamente e debochadamente o tempo todo e de todos (poderosos, ricos, pobres, velhos, crianças, mulheres, negros, asiáticos, homossexuais, loiras, índios ou das pessoas em geral). Por isso já votamos em: macaco, jumento, bode, palhaços e achamos normal.

Este comportamento de brincar com pessoas e coisas sérias remonta nossas raízes colonialistas, carregadas de preconceitos e deboche por tudo aquilo que não me custa e que não me agrada, desprezo a coisa pública. Transformar tudo indiscriminadamente em comédia passou a ser uma forma de “sobreviver” as ausências de opções e bom senso. É o império da cultura do desrespeito permanente, engraçado! Mas desrespeitoso.

Isto está tão evidente que dos 513 deputados federais eleitos em 2018, mais de 10% são classificados de folclóricos ou exóticos. Se levarmos ao contexto dos demais órgãos do Legislativo (Senado, Assembleias Legislativas e Câmara de Vereadores) chegaremos a um número significativo e estarrecedor de pessoas eleitas por puro deboche. Escolhemos nossos representantes por brincadeira, mas ficamos revoltados quando eles brincam de legislar.

Por isso não assusta que uma simples frase como “caneta azul, azul caneta, tá marcada com a minha letra” é cantarolada por “todos” como um “sucesso” de momento, uma vez que dentro dela contém todos os elementos desta malevolência lúdica, do cinismo tupiniquim. É um constante desejo de comungar com o ridículo, para obter o riso cínico.

Este comportamento maléfico que sai das casas, vai para as ruas, adentra as urnas e são explicitados na arte e nos noticiários é o retrato dos resultados que vivenciamos no nosso cotidiano. Daí para o reflexo no comportamento do agente público (eleito ou não) parece ser normal. Por isso passamos a ser o “país da piada pronta” e ainda enfeitamos com frase do tipo “o Brasil não é para os fracos”.

O conteúdo escolar é excessivamente lúdico e ineficiente, por isso que o trabalho parece castigo e a benevolência parece arte. Há uma ausência de respeito e de responsabilidade enorme sobre as pessoas e as causas essenciais. Friedrich Nietzsche já afirmou que “a maturidade do homem consiste em haver reencontrado a seriedade que tinha no jogo quando era criança”. O Brasil parece se negar a crescer!

Parte das lágrimas das nossas frustrações são consequências da malevolência lúdica, sínica e compulsiva. Rir de tudo, de todos. Rir e agir irresponsavelmente até matar o futuro, o nosso próprio futuro.

 

João Edisom de Souza é Articulista, Professor de Ciências Política, Consultor Político, Gestor de Comunicação, Imagem e Crise, Comentarista político da rádio Jovem Pan, jornal da manhã. 



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