A complexidade da alma humana prega peça nos ingênuos. Da vida, se vê estruturas de poder e status formatados e erigidos entre paredes inconfessáveis de mentira e dissimulação.
Em primorosa inspiração, a sacada de Shakespeare: ‘Há de o tempo desvendar o que hoje esconde a discreta hipocrisia’ (O Rei Lear, Ato I).
Há uma cortina de formalidades em boa parte das instituições, sedimentada conscientemente para enganar e engendrar mesquinharias. Não há altivez, honestidade, ainda que os arroubos tendem a anuviar ainda mais o que de verdade está a acontecer.
As hienas ladram a convicção quando o arroto fétido da covardia se fazem presentes. Ninguém se atreve a contestar a força que a tirania exerce sobre as consciências capitaneadas pela paz da distância e da indiferença. Um dia também serão tragadas, pouco a pouco, uma a uma. Quem cala ‘se’ consente.
A democracia do tempo, muito bem lembrada pelo pensamento do gênio inglês já citado, fez renascer a cátedra de Heráclito: ‘tudo se move, exceto o próprio movimento’. Portanto, tudo flui, muda com o tempo, obrigatoriamente. E somos os responsáveis pelo que vier, de bem ou de mal.
As gerações futuras precisam ouvir a voz que desta ainda aprisionam. Libertem-se, sejam os senhores da história, como é e não como querem que seja. Coragem para isso. Tal não se aprende em manuais, códigos, mas pelo sentimento de dever e honra.
Há pessoas atrevidas e sugam a energia dos bons. A língua lhes foi dada como chibata a fazer cada vez mais sangria. Fingem ser o que nem de longe o são. Não são probos. Criam panaceias fictícias para amealhar consciências, pegar carona na confiança que a forma os revestem.
Precisa, os que assim procedem, ser desconstruídos como figuras do bem, apanhados em seus discursos ‘éticos’, contraditórios quando confrontados com os fatos e a verdade que deles subjazem.
‘A esperança quando outros nela creem faz ganhar muito tempo’ (Ovídio, A arte de amar). Portanto, não a reconheçamos nas palavras doces e afáveis de certas promessas.
A intenção do mal é engabelar para não se encerrar na própria maldade. Precisa de tempo, como do tempo são as apostas na escuridão da alma.
Nas palavras do magistrado António Arruda, ‘Enquanto os cobras do Direito estudam o problema, resolvi consultar um vizinho meu, ledor da Bíblia e muito crente’ (Um olhar distante – crônicas), que sussurrou: tudo é porre, porre lá da boemia...
Gonçalo Antunes de Barros Neto é Juiz de Direito, formado em Filosofia UFMT). (antunesdebarros@hotmail.com).
Ainda não há comentários.