O Estado brasileiro é sustentado por três colunas: corporativismo, patrimonialismo e cartorialismo. Não de agora. Sempre o foi, desde o seu nascedouro. Tripé que o transforma em uma vaca leiteira, cujas tetas são controladas por poucos (funcionários com altos salários e os setores econômicos), criando assim uma relação promíscua entre o próprio Estado-governo e várias empresas-empresários (os pagadores de propinas). O que provoca a segregação dos espaços públicos e dificulta a diminuição da desigualdade, e, desse modo, impede o desenvolvimento do país. Não é a primeira vez que isto é dito nesta coluna. Por certo, nem será a última. Pois são muitas e variadas às ações irregulares, ilegais e imorais.
Grande parte destas ações aparece, por exemplo, nas delações premiadas de executivos da Odebrecht, dos donos da JBS e na do ex-governador mato-grossense, Silval Barbosa. Nesta última, aliás, pode-se identificar uma narrativa de desvios de dinheiro público por alguns agentes políticos e públicos, de obras públicas superfaturadas e o de favorecimento a determinados empresários e empresas, ou com a prestação de serviços e/ou concessão de incentivos fiscais. Favorecimento que tinha como contrapartida a cobrança, pagamento e recebimento de propinas. São páginas e mais páginas que se relacionam, e se conectam umas com as outras, deixando a mostra uma situação de promiscuidade, comprometendo o retrato do Estado e as suas finanças. Tem-se, portanto, um quadro altamente negativo, com os negócios públicos sendo feudalizados, destinados para beneficiarem alguns agentes do governo, deputados estaduais e federais e cinco dos sete conselheiros do Tribunal de Contas.
Somam-se a esta seleta lista, empresas, empresários e construtoras. Inclusive de renome internacional, a exemplo da Andrade Gutierrez, JBS, Mendes Júnior e Votorantim, ladeados com as de porte menor, tal como a Construtora Todeschini, Sanches Tripoloni, Trimec, Enza, Guaxe e a Encomind. Estas últimas, por outro lado, contraiam junto a quatro bancos (Bic Banco, Daycoval, BMG e Banco Rural) financiamentos, cujos pagamentos eram garantidos pelo próprio governo, que os saldava com parte da arrecadação das propinas.
Propinas que também serviam para o enriquecimento de agentes políticos e públicos, pagar apoios de parlamentares ao governo e para quitar despesas de campanhas eleitorais. Propinas que vinham da concessão de incentivos fiscais, de obras públicas e da desapropriação do Renascer e da Liberdade. A relação dos pagadores de propinas se estendia do Sindicato dos ramos de Empresas Atacadistas até o setor de Biodiesel e Sucroalcooleiro, passando por Frialto, Mafrig, Canal Livre Comércio e Serviço, Gendoc, Construtora Três Irmãos, Ensercon Engenharia, Empresa Brasileira de Construções Ltda. e Strada. Soma-se a esta enorme lista, empresários do ramo de móveis, além de operadores financeiros, tais como Valdir Piran, Marilene, Rômulo Botelho, Avilmar, Filadelfo e Jurandir da Solução Cosmética.
Percebe-se, então, (e) leitor, a complexidade do sistema de arrecadação e distribuição de propinas. Seus autores se valiam do Estado-governo como instrumento captador e gerador. Portanto, alimentador. O que gerava grandes prejuízos ao próprio Estado-governo e, bem mais, sua a população. Práticas que se estende em todo o país. Veja, por exemplo, (e) leitor, a delação da Odebrecht. E diante disso, antes que se esqueça, cabe perguntar: é ou não uma relação de promiscuidade? É isto.
Lourembergue Alves é professor e analista político. E-mail: lou.alves@uol.com.br.
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