• Cuiabá, 13 de Maio - 00:00:00

Tempos de novos tempos

Faz algum tempo assisti a uma palestra com Dulce Magalhães, em Cuiabá. Aliás, ela faleceu recentemente e deixou uma lacuna enorme no pensamento das coisas humanas no país.  Ela fez umas analogias muito ricas e traduziu a música “Tocando em Frente”, de Almir Sater e Renato Teixeira. Aproveitei e associei no mesmo raciocínio uma antiga lição de meu pai, ainda na minha infância em Minas. Nesse ambiente de terra arrasada que estamos vivendo em nosso país e a própria ordem mundial, imaginei que um pouco de simplicidade sirva pra amansar nossas almas cansadas.

Dulce Magalhães disse que os poetas, os artistas plásticos, os escritores, os jornalistas, os compositores musicais, entre outros que lidam com a mente criativa, conseguem avançar suas percepções além dos sentidos e captam sensações que ainda estão em outra dimensão. Trazem e materializam em obras. As pessoas se surpreendem com a clareza da mensagem. A música “Tocando em Frente” é uma delas. É uma analogia à vida e sua duração. Quando diz no início: “Ando devagar porque já tive pressa. E levo esse sorriso porque já chorei demais. Hoje me sinto mais forte. Mais feliz, quem sabe. Só levo a certeza de que muito pouco sei, ou nada sei”, na verdade resume a trajetória de toda uma vida.

Mais adiante, ensina a trajetória quando diz:” Penso que cumprir a vida seja simplesmente compreender a marcha e ir tocando em frente como um velho boiadeiro levando a boiada. Eu vou tocando os dias pela longa estrada, eu vou. Estrada eu sou”. E a lição pura que mostra o começo e o fim da vida: “Todo mundo ama um dia todo mundo chora. Um dia a gente chega e no outro vai embora. Cada um de nós compõe a sua história. Cada ser em si carrega o dom de ser capaz e ser feliz”.

Esta música me toca muito por conta de uma episódio ocorrido entre meu filho Marcelo e eu. Logo depois ele partiu... ela sempre me emociona. Mas, por outro lado, nesta semana me vi descascando uma laranja e me lembrei muito de meu pai. Na minha infância ele me ensinava seguidamente a “cascar” uma laranja, o modo como dizíamos descascar. Ele ensinava exigia que o corte começasse na cabeça e seguisse ao redor da laranja fazendo uma fita bem uniforme e que jamais quebrasse. Tinha que sair inteira ao ponto de se montar uma laranja semelhante com a casca. “Quem “casca” certo uma laranja, dizia ele, “casca” qualquer abacaxi na vida”. Mal sabia que ele estava falando de perfeccionismo e de cumprir as missões com dedicação e comprometimento. Uma simples fábula que me vem à mente todas as vezes que “casco” uma laranja.

Nesse clima pesado que estamos vivendo, tem lições de simplicidade que passam além do tempo e nos levam “tocando em frente”, como o simples “cascar” de uma modesta laranja. De certo modo, estamos começando a “cascar” certo essa laranja chamada Brasil.

 

Onofre Ribeiro é jornalista em Mato Grosso

onofreribeiro@onofreribeiro.com.br    www.onofreribeiro.com.br



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