Soraya Medeiros
Desde que o mundo é mundo, nós, humanos, viramos a alma do avesso na tentativa eterna de compreender o amor — esse mistério que move poemas, canções, nossos maiores atos de coragem e também nossas mais secretas fragilidades.
O amor é a bússola invisível que orienta o coração, ainda que às vezes perdida, enferrujada ou desimantada. Na arte de amar, somos todos navegadores antigos, tateando as estrelas com as mãos trêmulas — tentando decifrar um mapa que muda a cada olhar.
E nessa travessia, cada um finca sua tenda em um terreno distinto. Há os que amam com a força de um incêndio — querem extrair de um único instante o sumo de uma eternidade. Para esses, o amor é cometa: breve, incandescente, inesquecível.
Na outra margem, estão os que amam com a paciência das marés. Sabem que o amor não é um raio, mas a chuva mansa que escava a pedra, alimenta a raiz e faz o tempo florescer. Mas, em qualquer forma de amar — fogo ou maré — há um instante em que tudo se resume a um gesto simples e universal: o olhar.
O amor, afinal, só existe de verdade quando se revela no olhar. Não é uma ideia nem um ideal — é um instante de revelação. É quando você se vê refletido nos olhos de quem ama e, de repente, reconhece a melhor versão de si. Naquele espelho, as imperfeições viram singularidades; as fraquezas, a humanidade. É o lugar onde se é compreendido sem precisar explicar e aceito sem precisar pedir.
Dizem que o amor é loucura — e talvez seja, por um instante. Mas sua essência não está no delírio: está na plenitude que repousa na alma. É a ebulição mansa dos gestos: o copo d'água deixado ao lado da cama, o abraço silencioso, a palavra que sustenta.
O amor verdadeiro não é espetáculo — é cuidado. É presença que não pesa, é silêncio que acolhe. E esse amor não se veste apenas de romance. Ele é múltiplo, vasto, onipresente. Há o amor de mãe, que é instinto e refúgio; o de pai, firme e contido; o de filho, que nasce da dependência e amadurece em gratidão; o de amigos, porto seguro escolhido a dedo.
Há o amor que despede e o amor que reencontra, o amor que fere e o amor que cura. Há amor no pão repartido, no ombro oferecido, no sorriso de um estranho que ilumina o dia. E há, por fim, o Amor maior — com A maiúsculo — o que nos olha através da criação. Ele está no brilho do sol, na vastidão do mar, no silêncio da noite. O amor de Deus — e o amor em nome Dele — nos convida a amar o próximo como a nós mesmos.
Como disse Rainer Maria Rilke, "Amar é uma tarefa para a qual toda a nossa vida ainda é demasiado breve". E talvez por isso, como escreveu Clarice Lispector, "O amor é quando a gente mora um no outro". E ainda, nas palavras de Vinicius de Moraes: "Que não seja imortal, posto que é chama, mas que seja infinito enquanto dure".
Porque o amor é tudo isso — tarefa e morada, chama e eternidade. É matéria divina, mas também gesto humano. E, no fim, a receita parece simples, embora nunca seja fácil: é preciso parar. Silenciar o ruído do mundo. Buscar o amor no olhar.
Porque a mais profunda forma de amor não é a que exige, grita ou posa — é a que, quieta, te contempla. É o olhar que, ao pousar sobre a sua vida, a ilumina, a valida e sussurra, sem uma única palavra: "Eu te vejo. E é bom que você exista". É, afinal, quando o Amor te olha, que você se sente, enfim, em casa.
*Soraya Medeiros é jornalista.

							
						
                                        
                                            
                                            
                                            
                                            
                                            
                                            
                                            
                                            
                                            
                                            
                                            
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