Paulo Lemos
Não é a falta de conteúdo que adoece a escola. É a ausência de vínculo. É o excesso de competição, a escassez de escuta, o orgulho que impede o pedido de ajuda, a gestão que silencia, a pressa que atropela.
Educar não é apenas ensinar — é cuidar. E onde não há cuidado, adoecem alunos, professores, gestores e toda a comunidade escolar.
A base de qualquer convivência saudável começa com a humildade: reconhecer que erramos, que temos limites, que não sabemos tudo.
Quem se julga autossuficiente rompe a escuta, despreza o outro e bloqueia o diálogo. E sem diálogo, não há construção conjunta — há apenas comando, ruído e afastamento.
Pedir ajuda, por sua vez, é um ato de lucidez. Admitir vulnerabilidade é sinal de coragem, não de fraqueza.
Mas quantas vezes silenciamos por medo de julgamento? Quantas vezes fingimos força enquanto nos desfazemos por dentro?
Criar uma cultura onde seja possível pedir ajuda é mais urgente do que qualquer projeto pedagógico.
Mais do que isso: é preciso escutar sem julgar. Porque cada sujeito carrega uma história que não está escrita no boletim, na pauta ou no regimento. Escutar é amar.
E o amor, embora ausente de muitas grades curriculares, é o que sustenta qualquer relação educativa verdadeira.
Essa perspectiva encontra eco profundo na pedagogia de Paulo Freire, para quem a educação é, antes de tudo, um ato de amor, de diálogo e de humanização.
Freire nos lembra que “não há saber mais ou saber menos: há saberes diferentes” — e reconhecer isso é o início do respeito, da escuta verdadeira e da coeducação.
Para ele, ninguém educa ninguém sozinho; educamo-nos em comunhão, no encontro entre sujeitos inacabados que se afetam, que dialogam e que se transformam juntos.
Nessa mesma direção, Edgar Morin, pensador da complexidade, nos convida a repensar radicalmente a forma como educamos. Para ele, a escola não pode continuar fragmentando saberes e separando razão de emoção, conhecimento de ética, pensamento de cuidado.
Morin afirma que “educar é preparar para o inesperado, para a solidariedade, para a compreensão do outro e de si mesmo”.
Uma educação que não integra a solidariedade, a empatia, a incerteza e a responsabilidade planetária está fadada ao fracasso emocional e civilizatório. E é justamente essa visão sistêmica, humanizadora e integradora que falta em muitas escolas do nosso tempo.
Também precisamos abandonar a lógica da culpa. O foco não deve estar no erro, mas na possibilidade de reparação. Restaurar é ir além do problema — é cuidar do vínculo, não apenas aplicar sanções. A justiça restaurativa mostra que é possível responsabilizar sem excluir, reparar sem punir.
Educar também exige compromisso ético com os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da cidadania, da proporcionalidade e da razoabilidade.
Esses valores não são meras abstrações jurídicas — são fundamentos concretos de uma convivência respeitosa, de uma escola que acolhe, protege e emancipa.
Liderar, portanto, não é impor ordens, mas promover a resolução de problemas, a inclusão de todos, o avanço institucional, o desenvolvimento do espírito de comunidade e a defesa incondicional dos direitos humanos e fundamentais de todos os membros da escola.
Uma liderança assim inspira e motiva, não por medo, mas por confiança. Uma gestão que respeita as pessoas gera pertencimento, engajamento e compromisso genuíno.
Em um ambiente assim, a governança escolar se torna fonte de ânimo, motivação e esperança para todos, porque reconhece que ninguém é autossuficiente.
Todos precisamos uns dos outros. Somos humanos — e é nessa interdependência que mora a força de uma verdadeira comunidade educativa.
E aqui vem uma verdade incômoda: negar a necessidade de união, insistir em caminhar sozinho ou alimentar divisões é uma forma de insanidade institucional.
Nenhuma escola floresce fragmentada. Nenhum educador resiste isolado. Nenhum estudante aprende em um ambiente de guerra velada.
Por isso, não é exagero dizer: sem humildade, sem escuta, sem amor e sem união, a escola adoece. E com ela, adoece o futuro.
Mas ainda há tempo. Tempo de dar as mãos. Tempo de construir uma cultura de paz, diálogo, apoio mútuo e educação que emancipa, não adoece. Porque onde há amor, há cura. E onde há cura, há recomeço.
E quando damos as mãos e não soltamos, ninguém fica para trás. Ninguém é abandonado.
Paulo Lemos é advogado em Cuiabá, Mato Grosso.
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