Rafaela Maximiano
Em um mundo onde as exigências e pressões diárias parecem aumentar a cada dia, a ansiedade tem se tornado uma companheira constante para muitas pessoas. A mistura de insegurança, incerteza, medo e preocupação em relação ao futuro se torna desafiadora, e o simples ato de desligar esse "botão automático" parece ser uma tarefa quase impossível.
Para explorar os caminhos de uma convivência saudável com a ansiedade, conversamos com a psicóloga especialista em psicotraumatologia, Dulci Loni, que acumula mais de 20 anos de experiência ajudando homens e mulheres a lidar com essa complexa emoção. Sob o tema central "Desligue o Botão da sua Ansiedade", a Entrevista da Semana traz reflexões e estratégias para quem busca uma vida mais equilibrada e plena.
A ansiedade, conforme ressalta Dulci Loni, é uma emoção inerente à condição humana e, por isso, faz parte da vida de todos. E, o primeiro passo para uma gestão mais saudável está no desenvolvimento da autoconsciência, reconhecendo quando essa emoção se manifesta em nossas vidas e aceitando que é natural enfrentar momentos de preocupação e estresse.
Ao FocoCidade, a psicóloga também destaca a importância de estabelecer limites saudáveis, aprender a dizer "não" quando necessário e priorizar tarefas para gerenciar eficazmente o tempo. Além disso, buscar apoio profissional e formar uma rede de suporte pode ser crucial para compartilhar preocupações, obter insights externos e estratégias adicionais.
Boa Leitura!
Em seu artigo “Desligue o botão da sua ansiedade” menciona que a ansiedade é uma emoção inerente à condição humana. Como podemos diferenciar a ansiedade saudável da ansiedade que se torna prejudicial?
Em todos os momentos da nossa vida, momentos desafiadores, momentos que nós precisamos enfrentar o nosso corpo físico, uma situação diferente, um primeiro dia de aula, uma apresentação, falar em público, seja qual for o desafio, a emoção saudável, ela vai nos fazer ficar mais alerta. Então, recebemos da glândula suprarrenal, que está situada acima dos rins, uma carga de adrenalina, de cortisol, que nos deixa em estado de alerta, porém produtivos. Nós conseguimos enfrentar situações, estarmos preparados para imprevistos, essa é a ansiedade boa, que nos faz mais produtivos, que nos faz enfrentar desafios, sairmos do lugar seguro, enfrentar o medo. Porque o ser humano apresenta cinco emoções básicas, as outras são secundárias e terciárias, mas as cinco emoções básicas são a raiva, o medo, a tristeza, alegria e nojo. A ansiedade é um sentimento que vem a partir de uma dessas emoções e ela pode sim ser saudável e ela é inerente ao ser humano sim, porque nós precisamos dela, para podermos conquistar mais na vida.
A ansiedade patológica, ela pode se apresentar de duas formas, ou luta, é aquela que vai para frente, que vai em cima, que a pessoa fica violenta, que ela fica desregulada, que a descarga de adrenalina é tão grande que ela não sabe como reagir de forma assertiva, ela não sabe reagir de forma ponderada. Nós vemos isso no trânsito, situações simples se tornam grandes tragédias por conta dessa ansiedade derivada do medo que vem sobre o ser humano. Essa é a ansiedade patológica que provoca luta ou fuga, àquelas pessoas que congelam e se afastam dos desafios. São os que entram em depressão, são os que são impedidos de enfrentar grandes conquistas na vida por conta da ansiedade patológica que pode se apresentar de duas formas. Eu diria até três formas, que é luta, fuga ou congelamento. Àqueles que fogem também do enfrentamento, que tudo que provoca ansiedade faz um movimento de esquiva para que não sofra.
Essa é a ansiedade patológica que provoca perdas, provoca um medo excessivo e leva até a um pânico, desenvolvendo até um transtorno de pânico.
A senhora menciona a importância de desenvolver a autoconsciência para reconhecer quando a ansiedade está presente. Como podemos praticar a autoconsciência em situações de ansiedade?
Como a ansiedade é inerente, ela vai aparecer, é importante que a pessoa reconheça onde essa ansiedade vai falar com você. A neurociência nos diz que emoção é corpo, e sentimento é derivado da emoção. Então, quando nós sentimos ansiedade, a autoconsciência, que é tanto a autoconsciência dos pensamentos, a autoconsciência das necessidades, mas também a autoconsciência do corpo, onde é que essa emoção, derivada do medo aparece no seu corpo? Alguns ficam afônicos, por exemplo e a pessoa vai aprendendo a encontrar no seu corpo o ponto que fica ativado mediante uma ansiedade assustadora. Porque a ansiedade vem do medo. Medo do que? Do futuro, do desconhecido, do imprevisto, do imprevisível. E a ansiedade pode ser nossa amiga, porque, como ela é derivada do medo, e há cinco emoções primárias, dentre delas o medo, ele é protetivo, quando ele não está acima do nível saudável.
O medo é protetivo, porque nós temos em nós uma amígdala cerebral, que é uma pequena glândula no nosso cérebro, que a função dela é nos alertar sobre o perigo. E nós precisamos sermos alertados. Se não fosse essa glândula, a nossa amígdala cerebral, ser ativada diante do perigo, nós atravessaríamos as ruas sem olhar, entraríamos na água sem saber nadar, pularíamos de lugares altos. Então, o medo saudável, ele é protetivo. A questão é, quando nós entramos no outro sentido do medo, que é a ansiedade.
A ansiedade, a autoconsciência vai nos fazer identificar se o medo é aquele medo que nós vamos seguir em frente, que ele é normal, que ele nos protege de perigos, ou se é aquele medo ameaçador, que nos congela. Então, a diferença entre o medo, é a diferença entre se conhecer ou não, a autoconsciência. Então, a partir do momento que começamos a ter, então, a autoconsciência, aí começamos a tomar o controle desse botão que liga no momento que nós não esperamos, que nós não estamos conscientes que vai ser ligado. Então, a autoconsciência nos dá isso, esse ligar e desligar do botão da ansiedade.
Estabelecer limites saudáveis é uma das estratégias sugeridas para lidar com a ansiedade. Você pode compartilhar algumas dicas práticas sobre como definir e manter esses limites?
A dica mais prática que é possível é começar a aprender sobre egoísmo. É estranho falar sobre isso, sabe? Porque a nossa cultura nos ensina desde criança que as outras pessoas são mais importantes do que nós. Nós temos uma fala de Jesus Cristo que diz assim: “Amarás o próximo como a ti mesmo”. E quando essa fala vem, nos deixa claro que devemos amar a nós primeiro e em segundo os outros. Mas nós somos ensinados a fazer o contrário, a amar os outros primeiro. E aí está a nossa dificuldade de dizer não. Se nós amamos a nós menos do que amamos ao próximo, nós sempre vamos dizer sim ao próximo e não para nós.
Então, começar a aprender que nós somos mais importantes do que o outro e que eu preciso pensar em mim primeiro, parece muito egoísta. E um sentimento que aparece quando a pessoa começa a aprender a dizer não para o que lhe faz mal e sim para o que lhe faz bem, porque normalmente é feito ao contrário. Então, quando se aprende a dizer sim e não de forma saudável, tem uma emoção que aparece frequentemente que é a culpa. A culpa porque se sente egoísta e é nesse momento que a pessoa vai aprender a definir e manter esses limites. É muito difícil mesmo aprender isso quando nunca fez. Inclusive vai atrapalhar a vida de todo mundo se você é tão bonzinho a ponto de fazer tudo que as pessoas esperam de você. Imagina como você começa a dizer não. Você vai ser chamado de egoísta e de vários outros nomes pejorativos, não é? Às vezes não consegue colocar em prática e a terapia, a psicoterapia entra nesse lugar.
A sobrecarga de responsabilidades diárias é uma das principais causas de ansiedade. Que técnicas você sugere para gerenciar o tempo e estabelecer prioridades de forma eficaz?
Nós estamos num tempo que se tornou muito chique dizer estou ocupada, estou corrida, não tenho tempo para nada, gostaria que o meu dia tivesse 48 horas para dar conta de tudo isso. Então existe uma cobrança cultural, uma cobrança mundial que estejamos ocupados. Estarmos longe desse movimento global, parece que estamos atrasados, estamos defasados, somos preguiçosos, somos improdutivos.
Algumas técnicas podem ser usadas. Uma delas que eu sugiro aqui é a boa e velha agenda de papel, de agenda do Google, qualquer que seja. No celular, por quê? Porque você vai ver hora por hora e saber o que faz, mas sempre levando em conta que tem que ser dentro dos seus limites. E essas responsabilidades diárias, normalmente, as pessoas, por conta da ansiedade, querem ocupar todo o seu tempo, para que não tenha o tempo de olhar para si mesmo, porque a ansiedade dói. Ocupam todos os seus horários para não ter esse tempo mesmo, não se priorizar. Então a agenda, ela vai ajudar você a olhar o dia a dia, fazer um cronograma diário, o que der para fazer, que seja feito. O que não for possível, fica para amanhã, estabelecendo prioridades. Agora, é muito difícil mesmo aprender isso sem a psicoterapia.
A busca por apoio é destacada como uma estratégia valiosa para lidar com a ansiedade. Quais são os benefícios de conversar com um profissional de saúde mental em situações de ansiedade?
Uma pessoa ansiosa na vida adulta, com certeza ela foi uma criança ansiosa. Ela foi uma criança que não foi ouvida, uma criança que tem necessidades não supridas. Então é preciso visitarmos a infância, porém não permanecer lá. Fazermos um resgate dessa criança interior ferida. A neurociência e a neuropsicologia, ela nos leva nessa direção. Aprender se dar o direito de sentir a ansiedade, usar ela ao nosso favor. Porque se condena a ansiedade, nós podemos usá-la como uma ferramenta para enfrentar a vida e chegarmos a lugares novos. Lacan disse que “a angústia movimenta o homem e a ansiedade saudável também nos faz movimentarmos de forma produtiva”. Então, os benefícios de conversar com um profissional da saúde mental é aprender a respeito de si mesmo, desenvolver inteligência emocional. Porque ninguém de nós nasce com inteligência emocional. Assim como não nascemos sabendo ler, nem sabendo escrever, nós temos que aprender. É nosso relacionamento com o mundo, com a nossa família e conosco mesmos que vão nos ensinar. Mas alguém algum dia foi ensinado desde a infância a desenvolver inteligência emocional? Pois é. Então, o benefício é desenvolver inteligência emocional para lidar com a ansiedade e saber quanto ela pode ser útil. Não é qualquer ansiedade que é útil.
A ansiedade pode ser acompanhada de sintomas físicos, como taquicardia e falta de ar. Quais são algumas técnicas eficazes para aliviar esses sintomas quando eles ocorrem?
A ansiedade, ela é acompanhada de sintomas físicos sim. Lembra que eu disse das cinco emoções básicas e que emoção é corpo? Toda emoção que uma pessoa sente, ela pode procurar que ponto do seu corpo está ativado e o autoconhecimento vai proporcionar isso, entender onde é que está aparecendo no seu corpo. E o que eu sinto no coração, Dulci? Aquela emoção, aquela sensação, aquilo é sentimento derivado da emoção primária. Então, é claro que ela vai ser acompanhada, porque ela é física. E a taquicardia, a falta de ar, o que é que acontece nessa hora? A nossa amígdala cerebral fica ativada por meio do medo, do desconhecido, medo do imprevisto, medo de algo que te possa provocar perigo de vida. A adrenalina é liberada, há falta de ar e nós ficamos preparados para ou lutar, ou fugir, ou congelar. Por isso esses sintomas físicos.
Cada pessoa pode encontrar sua própria técnica para "desligar o botão da ansiedade". Você pode compartilhar um exemplo de como um paciente conseguiu encontrar sua técnica pessoal com sucesso?
Nesse caso, quando a pessoa está em terapia, nós vamos fazer uma avaliação global integral do ser para que possamos fazer um mapeamento de quais áreas da vida estão prejudicadas, já que emoção é corpo, sentimento é derivado da emoção. E ainda temos uma outra parte que a ciência já reconhece que é a espiritualidade do ser humano. Nós temos que fazer um mapeamento de quais áreas do ser humano estão dissociadas, quer dizer, a parte espiritual, da parte psicológica, da parte física. Então, tem que estar os três integrados.
O exemplo que eu posso usar: cuidar do corpo, cuidar da vida mental, da vida psicológica e cuidar da vida espiritual. Seja qual for a religião da pessoa, seja qual for o seu motivo de fé, cuidar da sua espiritualidade, cuidar da sua vida psíquica e atividade física, alimentação adequada. É todo um processo para que possamos cuidar e cada um encontrar sua técnica pessoal com sucesso.
A partir da organização dessas três áreas que nós chamamos dimensões do ser humano, a própria pessoa vai reconhecer. Eu gosto de fazer natação, me faz bem, mas eu não gosto de pilates. Quando eu tomo refrigerante, eu me sinto muito pior, mas quando eu tomo água com limão, me sinto melhor. Dulci, eu gosto de ouvir música. Dulci, quando as pessoas começam a beber do meu lado, eu fico desregulada e não gosto. Então, esse autoconhecimento vai ajudar a pessoa a encontrar sua própria técnica pessoal e, claro, sempre orientado por um profissional de saúde, por um psicólogo.
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