Rafaela Maximiano
Em uma sociedade cada vez mais consciente dos desafios ambientais que enfrentamos, um tópico de extrema relevância surge como um alerta preocupante: a estreita conexão entre o meio ambiente e nossa saúde respiratória.
Ao FocoCidade, o pneumologista Clóvis Botelho revela que a negligência em relação ao meio ambiente pode ter consequências devastadoras para a saúde das pessoas e, em última instância, para a própria habitabilidade do planeta. Ele destaca que a exposição contínua a agentes poluentes e queimadas aumentam significativamente não só o risco de doenças respiratórias e cardiopatas, mas também o desenvolvimento de cânceres.
O alerta do especialista não se limita apenas aos aspectos de saúde individual, mas se estende para uma perspectiva global. Ele adverte na Entrevista da Semana que a degradação contínua do meio ambiente e a crescente poluição atmosférica estão colocando em risco a própria habitabilidade do planeta. E, deixa claro, que a relação entre meio ambiente e saúde respiratória é intrínseca e preocupante.
Clóvis Botelho possui graduação em Medicina pela Universidade Federal de Juiz de Fora (1979) e doutorado em Medicina (Pneumologia) pela Universidade Federal de São Paulo (1991). Ex-professor Titular da Faculdade de Ciências Médicas e do Curso de Mestrado em Saúde Coletiva e do Curso de Doutorado em Ciências da saúde da Universidade Federal de Mato Grosso. Tem experiência na área de Medicina, com ênfase em Pneumologia e Saúde Pública, atuando principalmente nos seguintes temas: tabagismo, asma, fatores ambientais, sazonalidade climática e tuberculose. Atualmente é professor do Curso de Medicina da UNIVAG/MT e integra a equipe da Clínica Vida Diagnóstico e Saúde.
Confira a entrevista na íntegra:
Estamos no mês do Meio Ambiente, gostaria que o senhor falasse sobre qual a relação entre meio ambiente e a saúde respiratória das pessoas?
O meio ambiente e a saúde respiratória têm uma relação muito íntima. O aparelho respiratório tem cerca de 100 m² de superfície alveolar, então todo o nosso consumo de oxigênio passa por essa inter-relação entre meio ambiente e o nosso aparelho respiratório. O oxigênio é fundamental para a vida. A reação que dá o significado à vida é o oxigênio entrando pelos pulmões, agregando uma molécula de hemoglobina e indo para os tecidos para serem metabolizados. Aí vem a nossa energia de subsistência para as nossas células e para todo o nosso organismo. Então, é muito grande essa inter-relação entre meio ambiente e a nossa saúde respiratória.
No caso das queimadas em Mato Grosso, acredito que seja a principal causa de doenças respiratórias... mas temos outras?
Quando se interfere ou altera a qualidade do ar ambiente que nós respiramos, seja por queimadas ou por qualquer outra fonte de poluição a exemplo de industrias, escapamento de carros, a grande quantidade de carros circulando e eliminando gás carbônico, eliminando substâncias tóxicas no ambiente, nós podemos estar atrapalhando essa função nobre que é do pulmão. O pulmão via ter que trabalhar muito mais para poder fazer essa limpeza do ar e o nosso aparelho respiratório tem um certo limite de capacidade de limpeza do ar. Quando essa capacidade excede, aí começa a dar as lesões pulmonares, as lesões nas vias aéreas que levam às vias condutoras, os brônquios, os bronquíolos, que vão fazer essa limpeza nesse ar para ele chegar até nos alvéolos em condições de ser incorporado ao nosso organismo. Então quando você excede a capacidade de trabalho do aparelho respiratório, começa a dar lesões pulmonares.
Quais são as principais doenças respiratórias? Principalmente as que ocorrem aqui em Mato Grosso...
Essas lesões pulmonares que ocorrem pela poluição são reações do tipo inflamatórias, irritativas. Então, a pessoa excedeu a capacidade de limpeza, excedeu a capacidade de umidificação desse ar e acaba agredindo essa mucosa respiratória. E ela ficando lesada, inflamada, ela tem menos condições de se defender de outros organismos como de um vírus, bactérias e até de fungos também. Quer dizer, a pessoa torna um ambiente propício para as infecções respiratórias. A própria irritação da poluição já causa uma inflamação e, uma inflamação é um problema sério tanto para o pulmão como para o nosso organismo como um todo porque as moléculas inflamatórias, elas também circulam para outros órgãos e o que é mais atacado fora o pulmão é o aparelho cardiovascular porque acaba lesando o endotélio vascular, e isso quer dizer que onde tivermos circulação em todo o organismo pode dar alterações e essas inflamações podem causar problemas no aparelho cardiovascular.
Aí temos o aumento das doenças respiratórias como bronquites, laringites, traqueítes e até pneumonias, mesmo que tenha como favorecimento essa inflamação nas vias aéreas e também as doenças no aparelho cardiovascular a exemplo das arritmias, infarto, doenças cerebrovasculares como os derrames, que aumentam quando temos um aumento do nível da poluição ambiental, é uma relação direta: o aumento da poluição ambiental com essas doenças.
É verdade que a poluição do ar contribui não só para o aparecimento de doenças respiratórias, cardiopatias, mas também aumentam as chances de desenvolvimento de câncer?
Já existem alguns estudos mostrando a relação a poluição com o câncer, tanto o câncer de pulmão como de outros locais. O câncer da via aérea já está bem estudado. Porque ocorre isso, no material particular, que a gente inala, enquanto existe um ambiente poluído, existe também estudos cancerígenas, irritativas, inflamatórias e também cancerígenas. E, tem todo tipo de material particulado dentro de uma fonte poluidora como de combustão, de automóveis, de indústrias, ou mesmo nas queimadas. Então nós respirando material particulado, substâncias agressivas podemos ter maior facilidade de ter tanto doenças inflamatórias quanto também os cânceres. Então tudo é decorrente do aumento da poluição do ar respirado.
A Covid deixou sequelas respiratórias nas pessoas? Já temos casos comprovados?
O problema da covid que felizmente já foi bem amenizado pelo poder público, pela campanha de vacinação e conscientização da população como um grande risco, felizmente já tivemos um arrefecimento, mas ainda continua o problema e as pessoas precisam ser vacinadas para poder ter o controle dela. A covid, além das lesões pulmonares causa grandes problemas em outros órgãos também. Agora, com relação às sequelas pulmonares da covid depende muito do grau dessa sequela. Geralmente causa fibrose pulmonar e a fibrose é como se fosse um endurecimento do pulmão. Naquela área fibrosada não tem mais função do aparelho respiratório, quer dizer que não tem oxigenação. Então, dependente da quantidade da lesão que teve o pulmão, o paciente vai sofrer mais ou menos.
Naturalmente o tratamento é muito longo, é muito difícil de ser feito quando a gravidade é maior, mas existe tratamento fitoterápico, existe tratamento para desinflamar as áreas que ainda estão inflamadas no pulmão. Aí tem que ser avaliado caso a caso, quanto de sequela teve esse paciente e que tipo de sequelas ele teve.
Vivemos recentemente uma pandemia mundial, que mostrou a importância do uso de máscaras faciais para impedir a propagação de doenças pelo ar. Inclusive, muitas populações assim como os brasileiros, perderam o preconceito de usá-las e muitos estão utilizando quando estão gripados, por exemplo. O senhor recomenda o uso de máscaras em casos de pessoas resfriadas ou com outras doenças respiratórias?
Sim. Toda vez que a pessoa esteja com sintomas gripais, independentemente do tipo de gripe ou resfriado, ou covid, ou qualquer doença respiratória aguda, a pessoa deve ficar mais isolada possível, dentro de casa, não ir à escola, não ir ao trabalho, mas se a pessoa não tiver condições de fazer esse tipo de procedimento ela tem que usar a máscara. É o mínimo que a pessoa faz para não deixar contaminar outras pessoas porque as partículas virais se transmitem de pessoa para pessoa e através da respiração, da tosse, e, através dos espirros.
A pessoa usando máscara diminui sensivelmente essa transmissão aérea que é a porta de entrada das viroses respiratórias como um todo. Independente do tipo de vírus. Então, é muito salutar e é muito correto a pessoa que faz isso. Se não pode ficar isolado em casa para contaminar outras pessoas, que pelo menos use mascaras e lave as mãos frequentemente, independente do tipo de vírus que ela possa estar sendo portadora. Ela pode passar isso para outras pessoas, que acredito que a pessoa tenha que ter essa consciência e é o mínimo que se espera de um cidadão que exerça todas as suas prerrogativas e deveres como cidadão.
Quais suas considerações finais sobre o tema...
Eu acho que nós temos que ter a consciência de que o mundo está caminhando para mudanças climáticas muito radicais. Então essa consciência tem que passar por cada cidadão e naturalmente pelas autoridades públicas que vão decidir os rumos e parece que é um caminho que não vai ter fim. Mas eu sou bastante otimista e acho que as autoridades públicas e governamentais do mundo inteiro, e o poder econômico também junto, vão conseguir controlar a grande produção de poluição que existe no mundo. E, além desse controle da emissão de gases poluentes em todos os sentidos, nós temos que também preservar ou aumentar a área com árvores, de despoluição dos rios, despoluição dos oceanos, para poder ter o aproveitamento principalmente do gás carbônico que é produzido pela poluição.
Que esses mananciais de água ou oceanos e as plantas, aproveitam o CO2 produzido pela natureza e por nós como benefício próprio. Nós usamos o oxigênio e as plantas e os plânctos dos oceanos utilizam o gás carbônico para a sua sobrevivência. Então, nós temos sumidouros dos gás carbônico, o principal gás que faz o efeito estufa e está fazendo essas grandes mudanças climáticas que o mundo está experimentando no momento e que a tendência é aumentar cada vez mais se não tomarmos as devidas providências.
Então nós temos que ter um equilíbrio entre a produção de gás carbônico que nós produzimos para tentar amenizar essa situação com a preservação de florestas, o aumento de áreas de florestas, não só a preservação do que já existe, temos que aumentar as áreas de florestas do mundo inteiro e fazer a proteção dos nossos oceanos. Se não fizermos isso até o final desse século, possivelmente muitos lugares da terra e a grande maioria da terra, vai ficar inabitável pela grande mudança climática que vai ocorrer. As autoridades já estão fazendo esse alerta no mundo inteiro e nós brasileiros temos que ter essa consciência.
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