Rafaela Maximiano - Da Redação
O Brasil, maior exportador global de carne bovina, perdendo apenas para a exportação de soja, está faturando com a maior demanda da China, mas os consumidores brasileiros estão por tabela pagando mais pelo produto nos açougues, enquanto frigoríficos têm sido pressionados a fazer ofertas recordes por bois nas fazendas. Apesar da queda no consumo interno de carne bovina, devido aos altos preços ao consumidor final, o setor se adequou, reduzindo os abates de bovinos e o aumentando as exportações.
O cenário mundial faz com que os setores do agronegócio sejam impactados de diferentes maneiras e, o setor das carnes, por exemplo, são um dos mais impactados neste contexto, fruto da grande incidência da Covid-19 nos trabalhadores dos frigoríficos, que são obrigados a manter a proximidade no processo produtivo.
A análise é do diretor de Operações do Instituto Mato-grossense da Carne (Imac), Bruno de Jesus Andrade que na Entrevista da Semana analisa ao FocoCidade o mercado de carne levando em consideração que o ano de 2020 foi marcado pela pandemia do novo coronavírus, e agora em 2021 não é diferente.
O Ministério Público do Trabalho tem determinado a paralisação de plantas frigoríficas em diversos estados, como Mato Grosso e Rio Grande do Sul, atingindo todas as principais empresas do setor, como JBS, Marfrig, Minerva entre outros.
Além disso, o principal mercado de exportação das carnes brasileiras, a China, tem imposto bloqueio das importações de carnes dos frigoríficos que apresentaram altos índices de contaminação de seus trabalhadores. A preocupação do país asiático é que as carnes possam ter algum tipo de contaminação.
Segundo Bruno Andrade, o ano de 2020 entrará para a história como aquele em que o mercado brasileiro da carne bovina encarou uma das mais desafiadoras crises de consumo e, apesar de tudo, saiu fortalecido. “A análise vale principalmente para o estado de Mato Grosso, que se manteve como protagonista no setor, garantindo e ampliando volumes do produto dentro das exigências internacionais, sem desabastecer o mercado interno e dando novos passos no caminho da produção sustentável”.
Confira a entrevista na íntegra e boa leitura!
Com a disseminação do coronavírus em 2020, os impactos decorrentes dessa pandemia representam uma verdadeira reorganização da sanidade humana e animal, em um momento de fragilidade que se espalhou pelo mundo em uma velocidade extraordinária. Levando em consideração o consumo interno e exportações, essa doença trouxe obstáculos à agroindústria de carnes. Como foram as exportações do setor em 2020?
As exportações de carne bovina no ano passado foram excelentes. O Brasil exportou um pouco mais de 2 milhões de tonelada de carne bovina, um resultado que é 7,5% superior a 2019. O faturamento com as exportações foi de $ 8,5 bilhões de dólares em 2020, o que é um valor de 11% acima do apurado em 2019. Mato Grosso seguiu o mesmo caminho, superando as médias nacionais. O Estado exportou 408 toneladas de carne bovina em 2020, resultado 10% superior a 2019 e faturou com essas exportações $ 1.7 bilhões de dólares, valor que é 15% do apurado em 2019. Assim o Brasil os demais países para quem a gente vende carne bovina não diminuíram drasticamente o consumo de proteína animal, mas eles migraram a forma de consumo, ou seja, reduziram o food service e aumentaram o consumo nas residências, devido à pandemia.
Apesar da crise existem avanços que se destacam desse período para o setor?
O setor aprendeu muito com 2020. Foi possível fortalecer novas formas de comercialização como o delivery, em determinados momentos nós observamos uma maior sinergia entre produtores e indústrias, o que é muito bom e justificável, dado que a pandemia atingiu todo mundo. Pelo lado da produção os produtores ficaram mais atentos ao mercado e possivelmente neste 2021 eles vão ficar mais antenados. E, quanto a indústria, foi possível revisar todos os protocolos interno de segurança alimentar e isso consolidou ainda mais a qualidade da inspeção de produtos alimentares. Além disso, para ambos tanto para a indústria quanto para o produtor, o caminho para a automação e controle de processos se intensificou mais.
O aumento dos preços de insumos e redução do consumo doméstico afetou o setor? Qual estratégia adotada para o setor de carnes se manter saudável?
Em 2020 o consumo interno teve sim uma queda que foi compensada por duas coisas basicamente: a redução dos abates de bovinos e o aumento das exportações. Em 2019, por exemplo, nós exportamos 27% do total produzido de carne bovina no Brasil. E, em 2020 essa participação saltou para 32%. Se por um lado houve valorização dos insumos também houve a valorização dos preços pagos ao produtor e à indústria frigorífica. Segundo o Imea (Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária) os custos totais na pecuária de corte de ciclo completo aumentaram 3,5% em 2020 e a engorda em confinamento teve aumento de 46% no custo diário por cabeça engordada. Para as indústrias de Mato Grosso, não foi diferente. O custo com a aquisição de bois também aumentou. O preço médio do boi gordo em 2020 foi de 38% superior ao observado em 2019, mas por outro lado a carne bovina no varejo também se valorizou. O preço médio dos principais cortes ficou 28% superior em 2020 em relação a 2019 segundo dados do Imea também. Em resumo, os custos subiram para todos e o mercado foi naturalmente se adequando.
Em que pese o aumento das exigências sanitárias e ambientais, para a produção das diversas vertentes de proteína animal – a exemplo das carnes de frango, suíno, bovino e peixe; estão sendo cumpridas?
Sim, o Brasil e o Estado de Mato Grosso estão cumprindo a legislação ambiental que é vigente hoje no país. É claro que existem ainda muitas coisas que precisam ser melhoras e uma delas vai auxiliar bastante a legislação ambiental é a regularização fundiária. Ainda sim a iniciativa privada, se já produtores ou industria frigorífica, já entenderam a importância da preservação ambiental, seja considerando os aspectos de impacto na produtividade da fazenda e seja considerando as oportunidades de negócio. Ainda que em 2020 muitas notícias sobre queimadas e desmatamento tenham sido destaque na mídia nacional e internacional é importante ressaltar que o Brasil possui dois terços da sua vegetação nativa protegida e que 25% quase 26% das áreas protegidas estão dentro de propriedades rurais, ou seja, a maior fatia de preservação ambiental é realizada pelo produtor rural.
Em relação às exigências sanitárias o Brasil segue como referência. Temos um calendário de vacinação veterinário completo. Somos considerados um país de risco insignificante para a BSE – doença bovina, e, o país é reconhecido como livre de febre aftosa com vacinação exceto o estado de Santa Catarina que é livre de febre aftosa sem vacinação.
O que o Imac tem feito para a projeção do setor?
A grande meta do Imac é tornar o Estado de Mato Grosso referência de carne de qualidade e sustentável. Para isso estamos desenvolvendo três produtos principais. O primeiro é o programa de reinserção e monitoramento que tem como objetivo reintegrar ao mercado formal pecuário os produtores rurais que hoje estão impedidos de comercializar seus animais com a indústria frigorífica aqui no Estado de Mato Grosso. Esse programa promoverá a recomposição de áreas desmatadas regularmente por produtores e os colocará no caminho correto da regularização ambiental.
O segundo programa que estamos desenvolvendo é o sistema eletrônico da indústria da carne o CEIC, que tem como alvo garantir a origem dos bovinos para os frigoríficos do Estado oferecendo uma ferramenta para consulta das não conformidades socioambientais desses fornecedores. Além disso, o sistema contempla um controle de processos dentro da indústria levando aos participantes da cadeia produtiva e também aos consumidores as informações que são necessárias obre qualidade da carne bovina produzida.
E, por fim, o observatório da carne que vai ser a nossa ferramenta de comunicação com o setor, com a sociedade brasileira e com os importadores. A plataforma vai reunir informações sobre a condição da produção de carne em Mato Grosso e acompanhar nossos avanços. Além disso, além dessa ferramenta nós vamos poder gerar conteúdos para difundir e criar políticas públicas para intensificação sustentável da pecuária em Mato Grosso.
Casos de COVID-19 em trabalhadores de frigoríficos são fonte de preocupação no mundo todo. A Administração-Geral de Alfândegas da China (GACC) chegou a propor ao Brasil que adotasse interrupção voluntária de exportação em caso de ocorrência da doença em trabalhadores em frigoríficos a exemplo do que sugeriu e foi aceito em outros países. Por que o setor não adotou isso ainda?
Na verdade isso aconteceu. Algumas unidades cessaram temporariamente suas vendas à China, por conta de casos de COVID em funcionários. Os frigoríficos brasileiros, e isso é importante lembrar, e o serviço de inspeção federal são positivamente reconhecidos por mais de 150 países que hoje compram nossa carne. Essa pandemia atingiu a todos, porém as indústrias responderam rápido às solicitações dos principais importadores.
A indústria de alimentos sem carne, com carne de laboratório, a partir de plantas, substitutos de frutos do mar e proteína de insetos, etc, será o futuro dos alimentos? Isso preocupa o setor?
Esse é um tema que preocupar parte do setor, mas realmente não deveria. Com certeza o consumo desses produtos cultivados em laboratório ele pode crescer, mas não enxergamos que em longo prazo possa haver uma substituição integral por esse tipo de alimentação. A sociedade tem caminhado para um consumo mais consciente e natural de alimentos. Isso trás boa parte da população para o consumo de alimentos frescos e com boas práticas de produção. Então produtos industrializados com a alta inclusão de ingredientes para dar sabor ou estabilizar o alimento, bem como esses produtos cultivados em laboratórios, tendem a ser um nicho de mercado. O consumo de carnes e alimentos não processados faz parte da cultura humana e isso não deve mudar drasticamente.
Quais são as expectativas para o futuro?
A expectativa em longo prazo é de posicionar o Brasil como fonte segura e confiável de alimentos, em especial carne bovina e promover o Estado de Mato Grosso como uma referência de qualidade e sustentável de carne bovina. Em curto e médio prazo expandir a nossa participação no mercado mundial de forma sustentável e trazendo mais investimentos ao setor aqui no Estado.
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