• Cuiabá, 13 de Maio - 00:00:00

Eleições 2020 em retrato perspicaz dos principais analistas políticos de MT


Rafaela Maximiano - Da Redação

O FocoCidade inicia neste domingo (11) uma série no espaço "Entrevista da Semana" relacionada à campanha eleitoral 2020. O objetivo é ajudar o eleitor mato-grossense a entender o processo eleitoral vivido, sanar dúvidas e conhecer os candidatos e suas propostas. Como ponto de partida conversamos com analistas políticos sobre como eles avaliam o contexto da eleição do próximo dia 15 de novembro.

As análises são pontuadas pelo jornalista mineiro Onofre Ribeiro, pelo mato-grossense professor e doutor Alfredo da Mota Menezes, pelo pedagogo João Edisom de Souza, e, pelo historiador Lourembergue Alves.

Não diferente do que esperávamos, os analistas teceram críticas aos candidatos, aos eleitores e ao processo eleitoral como um todo. Porém, foram unânimes em avaliar que a pandemia vivida atualmente pelo mundo, afetará sim o voto dos eleitores. E, para compreender  melhor o processo todos responderam à mesma pergunta, nos proporcionando pontos de vistas históricos, psicológicos e humanísticos sobre o momento vivido e as eleições municipais.

Confira a entrevista na íntegra:

A questão: As eleições municipais deste ano de 2020 tendem a ser diferentes das anteriores não apenas em função da pandemia e da mudança de calendário, mas também por conta da alteração nas regras eleitorais (como fim das coligações para eleições proporcionais, uso de recurso próprio pelos candidatos, fim das doações por pessoa física, permissão de arrecadação por vaquinha virtual e substituição da campanha de “porta e em porta” pelo impulsionamento de conteúdo nas redes sociais) ou seja também pela  descrença da população no político brasileiro e na politização da sociedade através meios digitais. Se há novas regras e um novo comportamento social como o senhor analisa que serão as eleições do próximo dia 15 de novembro?

Onofre Ribeiro – De fato você fez uma série de pontuações que mostram o tanto que essa eleição vai ser complexa. A pandemia é o ponto de partida dessas eleições. Não podemos pensar nessa eleição sem pensar em pandemia porque todo mundo foi atingido de um jeito ou de outro. O eleitor mais humilde perdeu seu emprego, ou perdeu a segurança do emprego. Passou a viver de uma ajuda do governo que ele sabia que era temporária, isso traz muita insegurança porque não dá garantias para ele lá na frente. É uma situação que o governo fez o que podia e o cidadão sabendo que isso é passageiro fica numa angústia danada. Depois a própria ajuda precisou ser ampliada por mais três meses num valor menor, metade, isso trouxe um abalo muito grande nas cabeças das pessoas. Especialmente os mais pobres. Esse confinamento de ficar em casa, ali naquele lockdown, shopping fechando, a economia parando, isso foi um terremoto nas cabeças das pessoas. E tudo isso vai desaguar na eleição, porque o eleitor entendeu que o Estado, e quando falo Estado me refiro a Federal, Estadual e Municipal, não foram capazes de dar as respostas que eles precisavam.

Com que disposição esse eleitor vai para a campanha? Vai votar para prefeito, para vereador e para um senador? Ele vai muito indignado, vai angustiado e vai buscando saber certezas para o futuro. Certezas para o futuro a gente pode traduzir em uma palavra: esperança. Esse eleitor quer esperança.  

O que a gente percebe na campanha é a repetição da burocracia eleitoral de sempre, santinho, agora só virou digital e isso não muda nada. Os santinhos e aquelas promessas de frases tiradas do marketing: mais por você, junto com você, todo mundo sabe que isso é conversa. E, você tem os candidatos a prefeito de modo geral não é em Cuiabá, em Várzea Grande, os candidatos olhando para traz lembrando do que fizeram e do que fazem e não estão dizendo para as pessoas nenhum sentimento de esperança. Ora, se o eleitor está buscando esperança, ele quer promessa de esperança. Se não tem essa promessa o que fica claro? Que quem está se candidatando está querendo se dar bem. O eleitor já se encheu disso, e, como você mesma disse na pergunta, ele não acredita mais na política e muito menos no político. Quando o eleitor vê esse santinho digital ou no papel e vê as mesmas conversas de sempre, aquelas caras com botox e photoshop, ele detesta isso.

O eleitor mais pobre que está lá no bairro, certamente vai vender seu voto por necessidade, e, também é uma forma de dar uma resposta tipo assim: devolva em sacanagem. Então, os candidatos, possivelmente vão gastar muito menos nessa eleição, com o que eles vão gastar mesmo é comprando voto. E, comprando sem ter a certeza de que vai receber, porque o eleitor não está nem aí para ele. O eleitor quer o dinheirinho dele.

Como é então que vamos enxergar essa eleição no dia 15 de novembro? Teremos pouco comparecimento às urnas, uma quantidade imensa de votos nulos e brancos e ausências, e, nós vamos ter um resultado final com menos de 30% de comparecimento às urnas e de votos válidos, talvez menos de 30%. Então é uma eleição de negação, quem for eleito não representará ninguém, malemal a si mesmo e não terá preparo - porque não estou vendo isso, para lidar com esse novo eleitor, nova economia, com o chamado novo normal. Vejo uma eleição de dinossauros, muito agressiva, discutindo ideias da pré-história para um eleitor que vive a angústia de olhar para frente.

Não é o dinheiro que irá contar, não são as coligações que vão contar, não é o tempo de TV, não é o horário eleitoral gratuito, não é a mídia digital que vai contar. O que vai contar é aquele que tiver capacidade de oferecer esperança. Mas para isso ele teria que fazer pesquisa, e em vez de fazer pesquisa para ver quantos tem a preferência, fazer pesquisa para saber que é o eleitor. Vou contextualizar: Os Estados Unidos, que tem uma eleição muito radicalizada para presidente da república, agora em novembro, entre dois candidatos fortes e extremamente polarizados, o país está no meio de uma grande crise econômica, de empregos, financeira, política; os institutos de pesquisa estão querendo saber quem é o eleitor que sai da pandemia. Estão pesquisando o perfil do eleitor, não estão pesquisando em quem ele irá votar. O próprio eleitor não sabe, como ele irá responder? Então estão querendo saber quem é o eleitor, quais as suas motivações e o que ele pensa. Estão tentando tirar uma média do novo americano, novo cidadão eleitor. Aqui não é diferente, em lugar nenhum do mundo é diferente. Então eu vejo esta uma eleição de dinossauros discutindo o futuro dos dinossauros. Vamos lembrar que os dinossauros foram extintos: num dia qualquer os dinossauros amanheceram e não adormeceram. Vejo essa uma eleição para dinossauros. Dinossauros para vereador, dinossauros para prefeito, dinossauros para senador, e, aquele que for capaz de provar que não é dinossauro, de convencer o eleitor que não é dinossauro vai se dar bem.  

João Edisom – O Brasil, ele não tem uma cultura de sequência do processo eleitoral. Nem da legislação, nem dos modos operantes. E, de uma forma quase controvérsia e antagônica, nós temos um eleitorado e candidatos extremamente conservadores. Apesar de todas as mudanças citadas e somando-se uma eleição extemporânea junto para o Senado aqui em Mato Grosso, o eleitor vai buscar mecanismos de aproximação. As campanhas começaram e conversando com pessoas que estão nos bastidores das campanhas e as pessoas querem as mesmas coisas, que eles vão nas casas deles, para conversar, contar uma história, para falar que precisa empregar alguém, ou, à procura por cabos eleitorais ainda é muito grande.

É muito difícil as legislações conseguirem ir contra as culturas. E, no Brasil é ainda mais difícil porque cada eleição tem uma legislação e comportamento diferentes.

Os candidatos devem sentir essa dificuldade e ficarão muito à beira da transgressão jurídica e sanitária. E, teremos uma dança de cadeiras muito grande porque com o fim da coligação não coloca fim da fidelidade na hora de buscar o voto. Já têm candidatos a prefeito brigando que os seus candidatos a vereador estão vendendo apoio para candidatos de outra frente. Mesmo àquele cujo partido político tem um vínculo diretamente com o candidato à prefeito. O MDB é um exemplo. A Janaína Riva vai apoiar um outro candidato que não é do MDB, mas não é só ela. Isso, entre os vereadores que estão disputando o cargo, se tornou a coisa mais comum.

Nós não temos a cultura da eleição. Nós tratamos a eleição como se fosse para escolher um chefe de quarteirão, grêmio estudantil, alguma coisa assim. A seriedade que se exige da democracia não se aplica ao eleitorado brasileiro. Nós temos o hábito de criticar os políticos, mas são os políticos que saem da sociedade para ser político. Não é a sociedade que sai dos políticos e a sociedade brasileira por não ser politizada, por não ser instruída e muita gente confunde ter acesso à informação de WhatsApp com as pessoas estarem espertas, estudado e consciente. Não há consciência nenhuma, nossa consciência continua sendo a mesma: a busca da vantagem individual, da proximidade, do aperto de mão, da garantia de emprego, de ajuda e até de um presente. E, isso não é coisa de camada baixa não. As empresas agem assim, dão dinheiro para o candidato por debaixo do pano, usam um CPF para não ser via CNPJ. O próprio candidato ía fazer doação, mas o dinheiro chegou em espécie na sua mão. A Lei diz uma coisa, alguns vão ser pegos por isso e a grande maioria vai conseguir burlar a Lei para fazer sua campanha como sempre foi feito no Brasil.

Usando a frase da música interpretada pela Elis Regina, “Ainda somos velhos como nossos pais”, quando se trata de política. Nós não avançamos.

Alfredo da Mota Menezes - Você colocou muito bem os dados novos para esta eleição. Acrescentaria ainda a pandemia e a quarentena. A média em Mato Grosso de abstenção é de 25%. Este ano aumentaria? Uma pesquisa em São Paulo mostrou que lá, um em cada cinco eleitores não votaria com receio da aglomeração. Essa estimativa se repete aqui em Mato Grosso? Ou, pelo aumento do número de candidatos (cerca de dois mil a mais que em 2016), não ocorreria aqui no Estado, porque esses candidatos iriam “buscar” o eleitor para votar?  

Todos esses, também são pontos e dados a serem observados para essa eleição. Sem falar que será uma eleição municipal com uma eleição para o Senado junta. Mas, para mim, o dado mais importante dessa eleição é a não coligação na proporcional. Por isso o aumento de candidaturas: os partidos tendo que buscarem votos sozinhos. E este fato é um treino para 2022. Nesta eleição não haverá coligação para deputado federal e o partido que não eleger número determinado de votos tende a desaparecer.

Outro dado a ser observado: o uso da mídia social e nela o perigo das fakes news que podem até influenciar em resultado eleitoral. E ainda a dificuldade em encontrar o culpado. Como vai agir e com que meios a Justiça Eleitoral punirá? Tem muita coisa diferente na eleição deste ano.

Lourembergue Alves - Não se tem dúvida quanto ser atípico o ano de 2020. O coronavírus deixou e deixa rastros imensos pelo mundo. Enfermos e mortes. Mas também mudou comportamentos. Mudança também nas andanças dos candidatos em busca de apoiadores e de votos. Levando-os a se valer muitíssimo das redes sociais. Bem mais, talvez, que nas disputas de 2018. O que dará um trabalho imenso a Justiça Eleitoral, que não conseguirá, infelizmente, deter os crimes eleitorais via internet, apesar da possibilidade de se punir tanto quem “fabrica” notícias falsas, como também ao autor intelectual delas (o candidato), que contrata os serviços daqueles. Punição que também se estenderá ao eleitor que repassar as notícias falsas.

Notícias falsas que contribuem, e muito para a desigualdade no jogo político-eleitoral. Igualdade tão necessária, porém, quase impossível de ser concretizada. O fim das doações pelas empresas foi uma grande medida, mas não suficiente, pois sempre haverá candidatos com maior poder econômico, e recebem mais doações de apoiadores e de seus partidos, e têm maiores visibilidades. A partir deste ano, não mais será possível à aliança ou coligação para proporcional, ou seja, para a disputa pelas cadeiras das Câmaras municipais (assim como será, em 2022, para as vagas das Assembleias Legislativas e para a Câmara Federal). Isso, sem dúvida, torna-se mais difícil a eleição de vereadores, que tende, mais do que nunca, ser casada à disputa da chefia do executivo local.  

Parte dessa dificuldade pode ser atribuída à descrença da população nos políticos e nos partidos políticos. Essa descrença, no entanto, não significa necessariamente maior politização, pois a tal politização, para existir de fato, carece da formação política da sociedade, e esta formação, infelizmente, não vem se dando de maneira contínua e global, no sentido de alcançar a todos os brasileiros. Há, evidentemente, uma parcela pequena de eleitores críticos, e, por serem críticos, politizados, mas essa parcela é infinitamente menor que a de torcedores. O eleitor politizado pode se dar ao luxo de ser torcedor. Claro que pode. Mas, a condição de torcedor retira-lhe a razão, a reflexão e o impede de visualizar todo o cenário, independentemente de seus atores, ao passo que o torcedor age movido pela emoção, paixão. E é exatamente isso que se veem corriqueiramente nos grupos de whatsapp, facebook, twitter. Uma pena! Até porque as redes sociais, se utilizadas bem, poderiam servir como a ágora moderna ou pós-moderna, um dos fóruns para a formação política. Isto está longe de acontecer.  

Apesar desses satélites eleitorais, e até por conta deles, as disputas deste ano não serão nada fáceis. Até mesmo pela descrença de uma parcela enorme da população. Parcela que não se viu, nem se vê representada no Congresso Nacional, assim como também nas Câmaras Municipais e nas Assembleias Legislativas. Ainda que venha a considera-las imprescindíveis em um Estado democrático. E são de fato. Igualmente os são as agremiações partidárias. Mas elas, as siglas, jamais deram a atenção devida aos anseios, necessidades e desejos da sociedade. Também não os agentes políticos. Tanto não deram que não se viu, nem se leu coisa alguma a respeito de encontros entre políticos, partidos e os segmentos da sociedade.  

Alheios, contudo, os candidatos falam do que não sabem, dão palpites e se dizem preparados para desempenhar a função de senador, prefeito e vereador. Ressuscitam discursos antigos, chavões dos anos 1950. Fazem, e farão de um tudo para atrair a atenção e conquistarem o voto do eleitorado, até se posarem de “novo”, agentes da “nova política”, ainda que não sejam, e não são mesmos. É preciso que haja um novo comportamento, e este novo comportamento só se dará com as mudanças da sociedade, que para tal carece de uma formação política.

Isso fica tão evidente ao ler os textos que eles registraram no TRE-MT, como sendo “planos de governo”. Textos ruins, nada atrativos, cheios de achismos, de falta de estudos e de pesquisas ou, na verdade, falta da leitura correta das realidades cuiabanas e de seus cenários. O eleitorado, portanto, terá uma dificuldade enorme de escolher um entre eles, pois, uma vez mais, terá que fazê-lo um entre o “menos pior” – infelizmente! Mas é preciso fazê-lo. Então eleitores, façam suas apostas!  




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