Sonia Fiori - Da Editoria
A soltura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva gera eventuais mudanças no jogo político, e também a incerteza sobre o projeto do PT. Esse cenário é observado pelos principais analistas políticos do Estado, João Edisom, Alfredo da Mota Menezes, Onofre Ribeiro e Lourembergue Alves considerando variantes e destacando elementos que devem pesar na nova formação das articulações e planos com vistas às eleições 2020 e 2022.
Nesta Entrevista da Semana Especial ao FocoCidade, entre pontos assinalados, Lourembergue Alves acentua que "portanto, pouca coisa mudará no contexto político com a soltura do senhor Lula da Silva, embora se saiba da importância dele para o PT. Ele é maior que a sua sigla. Sempre foi. E isto tem sido ruim para a sigla petista, pois a impede de se renovar, reoxigenar-se e construir novas lideranças dentro do partido".
Menezes ressalta que “está uma incógnita, está não muito claro melhor dizendo a política brasileira nesse momento”.
Onofre Ribeiro aponta que “o Bolsonaro forma o seu grupo político e o Lula reorganiza o seu espaço político que se perdeu muito com a permanência dele na prisão. Essencialmente nós temos dois grandes grupos que se formam: um grupo liderado pelo Bolsonaro, um grupo liderado pelo Lula, ponto”.
João Edisom chama a atenção para outra seara: “então esse tipo de fala, esse tipo de comportamento com ele solto, tem a tendência a favorecer muito mais a reação, a reatividade, o antilulopetismo, favorece muito mais ao governo Bolsonaro, o grupo que é contra o PT, do que propriamente o PT. Acho que com ele solto o PT tem um grande problema na mão”.
A soltura do ex-presidente Lula ocorreu após 580 dias de cárcere - condenado na esteira do caso do triplex - seguindo decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre prisão em segunda instância.
Confira as análises na íntegra:
Alfredo da Mota Menezes
Essa questão soltura do Lula, não a soltura em si, sair da cadeia, mas na questão política tem que aguardar um pouco. Ele vai tentar recompor o PT? Vai. Tem condições nessa altura do campeonato até as eleições do ano que vem recompor o PT depois de tudo o que aconteceu com o partido e tudo aquilo que nem precisamos falar, acusação disso e daquilo, passou para parte da sociedade, será que o PT vai conseguir recompor até a eleição do ano que vem ou a eleição de 2022? O Lula viajando, como ele disse que vai viajar seria a mesma coisa que a caravana do Lula anteriormente? Ele vai ser recebido em alguns locais com vaia ou não, como é que vai ser tudo isso? Ainda está uma incógnita.
Eu não acredito que o Lula consiga e que ninguém consiga, nada contra, recompor o PT como o PT era até a eleição para as prefeituras do ano que vem. O Lula vai conseguir juntar a esquerda, também tem que olhar e esperar. Por quê? Ciro Gomes que está também dentro desse lado da esquerda, está batendo no Lula, está batendo no PT e duro, aquele tipo de batida não é para contemporizar e ter composição lá na frente. É mostrando que não quer de jeito nenhum uma composição. Com quais partidos o PT vai compor? PCdoB e qual outro? O PROS também quer lançar candidatura. Mais um detalhe, o ano que vem a eleição não tem coligação na proporcional, então muitos partidos vão querer lançar candidaturas a prefeito, aquela história de sempre para tentar puxar vereadores, para que esses vereadores possam ajudar na eleição de deputado federal em 2022, senão esses partidos acabam.
Então ninguém vai sair correndo atrás do PT, como é que vai ser tudo isso? Outra coisa, o Lula vai radicalizar com o Bolsonaro, isso pega bem? O Bolsonaro do outro lado vai radicalizar? Com isso surgiria um partido ou um grupo de centro para contemporizar os dois lados de extrema esquerda ou de extrema direita? Você viu que eu estou com um monte de indagação e de perguntas porque não está claro pra mim, e tenho lido o máximo que posso e não vejo ninguém com uma clareza suficiente de dizer: ‘olha, o Lula solto vai acontecer isso ou aquilo, aquele outro na política brasileira. É preciso esperar um pouco Sonia, não está claro ainda como que vai ser este novo momento com o Lula de um lado, Bolsonaro do outro, Bolsonaro criando partido, com o centro querendo também se movimentar. Está uma incógnita, está não muito claro melhor dizendo a política brasileira nesse momento. Eu vejo assim.
Onofre Ribeiro
Bom, o que acontece com a saída do Lula, a saída da prisão que eu digo. O Bolsonaro passa a ter uma oposição clara para ele combater. O tipo de gente como o Bolsonaro que trabalha e que é reativo, ele gosta de bater, ele precisa de ter alguém para bater, agora tem o Lula, por sua vez o Lula só funciona se tiver alguém para ele contestar, para bater. Então se tem dois teimosos, e os dois agora vão bater um no outro. E com isso ao redor deles crescem pessoas, mas o Lula e o Bolsonaro são como árvore muito frondosa, debaixo não cresce nada. Eles vão usar meio mundo em benefício deles próprios só.
Uma outra coisa é que o PT volta a ter um espaço, que estava perdendo rapidamente, o Bolsonaro ganha um espaço que estava perdendo. Agora, vai ter reagrupamentos políticos. O Bolsonaro forma o seu grupo político e o Lula reorganiza o seu espaço político que se perdeu muito com a permanência dele na prisão. Essencialmente nós temos dois grandes grupos que se formam, um grupo liderado pelo Bolsonaro, um grupo liderado pelo Lula, ponto. Aonde isso vai dar? Nós estamos falando da eleição de 2022, nós vamos de novo polarizar o país. Em 2014 a eleição da Dilma era polarizado o PT e o PSDB – vermelho de um lado, azul de outro. A gente teve, e isso não tem mais. Passa a ser com o Bolsonaro e o PT, mas não mais a Dilma, mas o Lula. Então é um período diferente na história. A gente não sabe onde vai dar isso mas em 2022 vai ser uma eleição muito polarizada, está ficando claro isso. Para o país não é bom, porque toda vez que polariza, é muito ruim porque a impressão que tem é que não vão nascer novos líderes, e ficamos presos em duas figuras, e será que elas representam todos nós?
João Edison
Eu tenho pensado muito sobre essa questão desse momento vivido no PT. Primeiro pelo seguinte: o PT é o maior partido político brasileiro na concepção de partido, e enquanto corrente também, até porque eu considero o PCdoB, o PSOL e até parte da Rede como puxadinho do PT, são apenas siglas que os comandantes não conseguiram conviver e criaram outra sigla, mas tem a mesma direção. Os partidos de esquerda no mundo todo com essa corrente mais de centro esquerda eles vivem muito mais do nome dos heróis do que propriamente de programas políticos, que eles são bastante fracassados no mundo todo.
Teoricamente são bons planos mas na prática não funcionam, então eles vivem muito do nome, lá na Rússia Lenin, em Cuba, Fidel Castro, na Venezuela era Hugo Chávez e por aí afora. Eles sempre têm um nome muito forte e carrega isso. O nome que carrega esse conjunto de siglas no país chama-se Lula. Para o heroísmo é mais importante esse herói calado do que herói solto, livre e falando. Então eu vejo a soltura do Lula, durante esse período que ele ficou preso, não se construiu nenhuma agenda pró-ativa, uma agenda política, não construiu nenhum programa, nada, e vendo os discursos do Lula ao sair do presídio, já são duas falas dele, e ele está falando as mesmas coisas que se falaria em 2002, 2003 e 2004. E o mundo mudou, as coisas mudaram, prova disso é que perderam a eleição para um governo tirado da cartola.
Então esse tipo de fala, esse tipo de comportamento com ele solto, tem a tendência a favorecer muito mais a reação, a reatividade, o antilulopetismo, favorece muito mais ao governo Bolsonaro, o grupo que é contra o PT, do que propriamente o PT. Acho que com ele solto o PT tem um grande problema na mão. Não tem um discurso novo, o discurso que fez ele ser presidente acabou, não tem uma agenda, não tem uma proposta política. E ele está solto. A bandeira do Lula livre acabou, morreu na hora que ele está solto. Eu vejo que ele era mais interessante preso para esse grupo, do que propriamente solto no formato que ele está hoje. É um complicador muito grande e não sei como eles vão resolver isso no futuro, como vai ser a sequência. Acho que vai ter até dissidência em relação a isso, não vejo ele como um cara aglutinador agora, vejo muito a questão da fala, principalmente o Ciro Gomes com uma fala muito forte, então acho que todos esses processos vão se transformar num grande problema ao invés de ser uma grande solução.
Lourembergue Alves
De início, é preciso dizer, que o senhor Luiz Inácio Lula da Silva fora beneficiado com a decisão já esperada do Supremo Tribunal Federal, cujo placar ficou em 5 votos pela manutenção da prisão em segunda instância, com 6 votos em desfavor da mesma prisão. A Corte maior do país entendeu desse modo, que o artigo 283 do Código de Processo Penal é constitucional, o qual diz claramente que a prisão só depois do trânsito e julgado. Decisão que deve ser respeitada, porém isto não impede que se discorde dela, até porque o artigo 5º., inciso 57, fala em culpabilidade, e não em prisão, ainda que o ministro Celso de Melo, em seu voto, considere culpabilidade sinônimo de prisão.
Com todas as vênias, trata-se de uma interpretação equivocada do texto constitucional. Mas, infelizmente, o plenário entendeu de outra maneira. O que reforça a situação de impunidade no país, mesmo que o presidente e ministro José Antonio Dias Toffoli considere que a diminuição da impunidade não dependa da prisão em Segunda Instância. Mas, enfim, agora, só depende do Congresso Nacional, que pode mexer no artigo 283 do CPP. Talvez seja impossível mudar o artigo 5º., inciso 57, pois este pode ser uma cláusula pétrea. Tenho dúvidas quanto a isto, embora o artigo 60, parágrafo 4º., da Constituição realça também a questão dos direitos individuais, o que a relaciona como cláusula pétrea.
Independentemente disso, muitos parlamentares já se levantaram a favor da prisão a partir da segunda Instância. O estranho é que entre eles tem advogados, cuja entidade onde estão filiados foi autora de uma das ações de inconstitucionalidade da dita prisão. A estranheza não para por aí, mas se amplia muito mais, pois, desde 2009, a tal discussão tem obrigados a reflexão, idas e vindas, os integrantes do STF. Discussão que foi levada ao plenário em 2016 e, agora, em 2019. Há muito, portanto, advogados tem se valido de tal ferramenta para evitar que seus clientes, a peso de ouro, sejam presos apenas depois do trânsito e julgado.
Em momento algum se viu uma manifestação dos atuais parlamentares, nem mesmo dos novatos, os quais tomaram posse no início deste ano. Inexistem quaisquer manifestações públicas de nenhum deles. Isto é revelador. Revela que se manifestaram só a partir da última decisão do STF numa tentativa de ludibriarem a população, engabelarem os eleitores, e, então, conquistarem dividendos eleitorais preciosos.
Por falar em eleição, disputa eleitoral. É preciso retornar verdadeiramente as questões propriamente ditas. O que muda no contexto político após a soltura de Lula? E o que significa para o PT mais especificamente. O senhor Lula da Silva, por ter cumprido um sexto de sua pena, já deveria estar em prisão domiciliar. Aliás, o próprio MPF já se manifestara a respeito, a favor de sua prisão domiciliar, até por conta do bombardeio e das consequências das publicações do Intercept-Brasil, com conversas imorais havidas entre um juiz e integrantes do MPF, à disposição da Lava-Jato. Portanto, mais cedo ou mais tarde, o petista já ficaria livre da sala-prisão no prédio da Polícia Federal em Curitiba, com direito a se movimentar pelas ruas e praças durante o dia, liberdade vigiada, limitada. A decisão do STF, a respeito da não prisão em Segunda Instância, não lhe mudou totalmente a situação, embora tenha direito por uma liberdade maior, e movimentará tranquilamente pelo país, sem precisar da autorização da Justiça. Com isto, o presidente de honra do PT poderá reunir-se com os mais variados políticos brasileiros, tentar uma aproximação com as chamadas forças de esquerda com vistas não apenas as eleições de 2020, mas também as de 2022. Seu papel continua decisivo dentro de sua sigla partidária, e sua influência ainda é grande dentro de alguns dos setores dos partidos de esquerda, e isto pode arregimentar, criar e fortalecer uma oposição ao presidente e ao governo Jair Bolsonaro que, até agora, não enfrentou, de fato, uma oposição dentro do Congresso Nacional, nem no seio da sociedade.
O presidente Jair Bolsonaro tem sido, durante todo este ano, o adversário de si mesmo, ajudado pelas manifestações desequilibradas de seus próprios filhos e pelas crises internas do PSL, oriundas da briga pelo controle da agremiação em razão da milionária quantia que virá do Fundo Partidário e do Fundo Eleitoral, da publicação das denúncias de candidaturas laranjas na sigla, e das denúncias de desvios de dinheiro do Fundo Eleitoral, até como caixa 2 de campanha de alguns nomes do partido.
A decisão do presidente do STF que beneficiou o senador Flávio Bolsonaro, e paralisou uma investigação tocada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro desgastou o governo, mas não o bastante, até porque nenhuma ala de oposição se manifestou no Congresso Nacional, nenhuma passeata pelas ruas e praças brasileiras foi registrada. Faltaram lideranças com capacidade e habilidade para fazer isto. Talvez, os petistas acreditam que o senhor Lula da Silva possa mexer e empolgar parcelas da população. Pode até ser que eles pensem assim, e a sua liderança maior procure fazer isto, mas o ex-presidente já não é mais o mesmo dos anos 90. Não é, sequer, a sombra daquele que conseguiu seduzir, atrair populares em cada uma das regiões do país, na maioria dos 5.570 municípios brasileiros. Seu discurso está chamuscado, e ele próprio se sente fragilizado em razão de todas as denúncias que lhe caem sobre suas costas. São sete processos. Talvez, oito. A imensa maioria deles ainda não tem o seu desfecho final. Mas o desgaste político, ao contrário do desgaste oriundo de uma decisão judicial, é mais rápido, forte, violento e duradouro.
É esta a situação que se encontra o ex-presidente Lula da Silva, soma-se a isto o enfraquecimento de seu partido. A tarefa de soerguimento não é tão fácil. A despeito disso, o senhor Lula pode ainda se movimentar pelo país, reunir com pessoas, e capitanear uma costura em torno de nomes para as disputas às chefias do Executivo. Poderá, inclusive, pedir votos, mas não poderá fazê-lo para si mesmo, e isto é um complicador. Pois, embora a decisão do STF tenha lhe beneficiado, ele continua como ficha suja. Isto porque a legislação é bastante clara nesta direção, julgamento e condenação por um colegiado. A decisão do STF não lhe tirou a condição de ficha suja. Por isto, (e) leitor, cabe uma pequena reflexão a respeito de uma situação hipotética: politicamente, seria muito melhor para ele, Lula da Silva, se a Segunda Turma já tivesse decidido, e decidido favoravelmente para ele (claro) sobre a ação a respeito da suspeição de Sérgio Moro. Uma decisão favorável neste quesito, não se tem dúvida, poderia levar a anulação da condenação, e, então, por tabela, o retiraria da lista dos fichas sujas. E isto, sim, lhe seria um grande negócio.
Mas, sempre se tem um ‘mas’ no meio do caminho, independentemente deste resultado, já se tem o desgaste político, e este, cabe repetir, é, infinitamente, avassalador. Portanto, pouca coisa mudará no contexto político com a soltura do senhor Lula da Silva, embora se saiba da importância dele para o PT. Ele é maior que a sua sigla. Sempre foi. E isto tem sido ruim para a sigla petista, pois a impede de se renovar, reoxigenar-se e construir novas lideranças dentro do partido. É isto.
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