• Cuiabá, 23 de Novembro - 00:00:00

Dia de mudar o grito

Feriado de 7 de Setembro. E as lembranças pipocam fortemente. A agitação começava logo após férias escolares de julho. Ensaio da fanfarra, instrumentos muito disputados pelos alunos: tambores, bumbos, os pratos, triângulos (também chamados de ferrinhos). Algumas escolhas tinham até citaras. Pareciam arpas e, quando dedilhavam suas cordas, nossa, o som dançava em nossos pensamentos.

Sopro, percussão, cordas, o barulho dos calçados batendo firme no asfalto, as estudantes mais altas carregando as bandeiras do município, do Estado e do Brasil eram uma espécie de comissão de frente, abrindo o desfile de suas escolas. Os que sabiam balé, apresentavam suas coreografias entre a marcha dos alunos e a fanfarra do colégio.

A festa sempre era numa grande avenida da cidade, preparada com arquibancadas de madeira, alto-falantes pendurados nos postes de iluminação e ambulantes vendendo algodão doce, pipoca, bandeirinhas papel etc. As famílias, usando a roupa de missa (na estica), saiam cedinho de casa para ir aplaudir e se emocionar.

Os desfiles, em comemoração à Independência do Brasil, eram o grande acontecimento cívico do ano. Mesmo nos tempos mais sombrios, mais radicais, de pensamentos, tendências e doutrinas políticas divergentes, o Dia da Independência era a grande festa cívica em todo o País, aguardada com muita ansiedade e expectativa em cada cidade. Algumas delas até faziam concurso para eleger a melhor a escola do desfile, a melhor fanfarra, a melhor coreografia e assim por diante.

Os tempos mudaram, a empolgação e a emoção de outrora perderam força. Nem todas as cidades fazem mais seus desfiles, nem todas as escolas participam, e o público que lotava as arquibancadas agora aproveita o feriado para ir com a família para o Litoral ou Interior.

E sobre este 7 de setembro de 2022, quando comemoramos 200 anos da Independência do Brasil, o noticiário nos assusta, revelando que o País já está coberto por uma nuvem de medo e apreensão. O prédio do STF (Supremo Tribunal Federal), seus ministros e a Esplanada estão com segurança reforçada. Grandes capitais reforçando o policiamento. E que grupos adversários se preparam para o enfrentamento nas ruas.

Me recurso a acreditar que o bicentenário de nossa independência como Nação seja marcado pela mistura explosiva de desfile cívico, comícios, protestos, ameaças e brigas. Gente, é para ser uma grande festa nacional, comemorada por todos os brasileiros. É o bicentenário. Até o coração de dom Pedro I está aqui.

Sim, o país atravessa uma instabilidade que causa enjoo até no mais forte dos estômagos. Mas nada se resolve com punhos e pontapés, xingamentos, ameaças e outros tipos de afronta. Vivemos numa democracia, com civilidade, não é? Ou ainda estamos no tempo dos bárbaros e da selvageria?

Então, vamos agir com calma, gente! Se é para sair às ruas para protestar, que o grito de dom Pedro I às margens do Ipiranga seja substituído, 200 anos depois, pelo grito do povo brasileiro por um Brasil do jeito que todos queremos. Sem corrupção, sem privilégios para autoridades, com Educação que forme cidadãos preparados para a vida em sociedade, com mulheres sem risco de serem assassinadas por serem mulheres, com Saúde pública sem filas e com remuneração justa e digna para todos os trabalhadores. Se for para lutar por um Brasil assim, eu também vou gritar neste 7 de Setembro.

 

Renata Abreu é deputada federal por São Paulo e presidente nacional do Podemos.



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