Fala-se muito, ultimamente, em “humanizado”. “Humanizado” acrescido aos discursos, os quais também fazem alusão à “empatia”. Este e aquela transformaram em apelos. Apelos-ordem-comportamentos. Não apenas nos discursos político-administrativos. Mas, igualmente, nas demais falas. Falas que se dão, inclusive, nos botequins, nas Igrejas e ao redor da mesa, com falta ou farta comida.
As pessoas, no entanto, estão cada vez mais distanciadas umas das outras, mesmo consanguíneos, ou irmãos pela fé. Nada tem a ver com a pandemia. Menos ainda por conta da necessidade de “ganhar o pão de cada dia”. Distanciam-se por razão menor, irrelevante. Tudo pela divisão existente no país. Torcida “A” não se mistura com a “B”, e vice-versa. Pronto! O país se transformou em uma grande arena, com lugares destinados para cada grupo em confronto. Grupos que não se bicam.
Jamais sentarão no mesmo banco da pracinha, ou lado a lado na sala de aula, muito menos na igual lateral do campo, onde seus políticos de estimação digladiam, sem qualquer técnica da esgrima, com dizeres chulos e desapreciáveis. Tem olhares enviesados. Veem-se como inimigos. Condições que os impedem de quaisquer conversas. Ainda que haja, e há mesmo necessidade de diálogo, mas este, certamente, fica em um local bastante longe do alcance de suas mãos.
Ao invés de tentarem se aproximar do local, afastam-se em demasia dele, sempre com os ataques, as agressões desmedidas. Dizem, estranhamente, valer-se da liberdade de expressão. Cantilena que virou moda. Usada a torto e a direito. Inclusive por quem ataca as instituições, ameaça agentes públicos e atinge, maldosamente, minorias por estas se localizarem na base pirâmide da sociedade, ou por terem escolhas “diferentes” das suas. O que faz do cenário vivido bastante perigoso. Tornando-o bem mais quando se tem a defesa enfática da criação do partido nazista, que longe está de ser uma ideia, mas sim de eliminação de um povo ou agrupamento.
Defesa tipificada como crime no país. País que dizem tanto amar, a ponto de se autoproclamarem patriotas, enquanto os outros, considerados seus inimigos, não os são (no entender deles). Agem-se e comportam-se sob o signo da intolerância. Intolerância que agride de morte a democracia, cujo viver não se comunga com verbos comumente usados, incitadores da violência, os quais desnudam uma forma antiga de ser, embora levada disfarçadamente, ou camuflada pelo verniz do “politicamente correto” que se mantém por aqui, ainda que questionado, ou pela clandestinidade, até pela ausência de eco.
Eco que parece agora ter vasão, e se espalha com rapidez e solidez, mesmo em gestos que venham parecer isolados, para os desavisados, quando, na verdade, cada qual faz parte da igual partitura, que entoa a canção constituída por notas musicais desconectadas da vida democrática, destoantes do correr natural das águas do rio do bem-viver, que apesar de cheio por vezes, ondulado em um dado momento e com tantas correntezas em determinadas épocas, jamais transborda, sequer ameaça sair-se fora do leito, ainda que possa ter, e tem mesmo, a depender das chuvas, rebojo traiçoeiro, também a quebra do triste remanso.
Isto é facilmente entendido, afinal, inexiste discurso único na democracia, tampouco existe uniformidade nos Estados democráticos. O que existe é mesmo a pluralidade. Pluralidade própria de qualquer sociedade. O que abre o leque dos posicionamentos diversos e variados. Todos permitidos. Sempre, claro, dentro do viver democrático, ou seja, do respeito às diferenças e aos diferentes.
Qualquer coisa fora desse “script”, ou desse roteiro, violenta-se vidas, e estupra a natureza. Por isso, muito mais que simples apelos, mesmo com as palavras “humanizado” e “empatia”, necessitarão dar visibilidade a comportamento favorável ao diálogo e a negociação, ainda que persistam as divergências de ideias, e é bom que assim seja. É isto.
Lourembergue Alves é professor universitário e analista político.
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