É recorrente a pretensão dos Estados em instituírem através de lei Fundos com o objetivo de suprir a ausência de recursos ordinariamente previstos nas leis orçamentárias, a fim de fazer frente a determinados programas sociais.
Geralmente são denominados de Fundo Social disso, Fundo Social daquilo e por aí vai.
Contudo, os recursos que compõe os aludidos Fundos decorrem, por certo, da arrecadação tributária.
Mas independente da finalidade dos recursos arrecadados para tais fundos e a importância social de suas destinações, tal forma de gestão fiscal é resultado de uma estratégia estatal no sentido de poder aplicar os aludidos recursos em determinados programas, uma vez que no tocante aos impostos, em especial o ICMS, a arrecadação é destinada para conta geral do Estado, sendo constitucionalmente vedada a possibilidade de transferir para outras contas, à exemplo dos Fundos Sociais.
A mecânica é simples, uma vez que a lei permite que o contribuinte deixe de recolher o imposto que seria destinado à conta geral orçamentária, sob a condição de recolher para o Fundo.
Porém tal sistemática encontra duas condições que na maioria das vezes não são observadas ao longo do tempo. A primeira está prevista na Lei de Responsabilidade Fiscal, uma vez que impõe que os recursos que compõe os Fundos, mesmo com alteração legislativa, não podem ser destinados para outra finalidade como outrora já ocorreu.
Portanto, se houve a instituição do Fundo para fomentar a saúde, os recursos arrecadados não podem, por exemplo, serem utilizados para efetivar o pagamento da folha de pagamento.
A segunda condição que também não é observada decorre da hipótese de renúncia de arrecadação de ICMS condicionada ao pagamento da contribuição para o Fundo, uma vez que não há a distribuição de parte da arrecadação para os Municípios, conforme disposto tanto na Constituição Federal, como também na Constituição Estadual. Ou seja, neste caso a contribuição paga para o Fundo nada mais é do que pagamento de imposto, posto que trata-se do mesmo fato gerador!
Aliás, do ponto de vista técnico, a natureza jurídica do tributo é definida pelo seu fato gerador e não pelo sua denominação. Sendo assim, é certo que se servirem água na garrafa de vinho, a sua natureza não será alterada apenas em razão de seu recipiente.
Ademais, também se torna manifestamente indevida a exigência quando se institui um adicional no valor das taxas estaduais, posto que no tocante a estas espécies tributárias, mais uma vez tanto a Constituição Federal, como a Estadual, asseguram que o produto arrecadado deva ser integralmente destinado para fazer frente às despesas inerentes ao custo estatal para fiscalizar uma atividade ou para custear um determinado serviço público que venha beneficiar apenas o contribuinte que fez tal recolhimento.
Em razão de todo exposto, o certo que quando existe algum vício na instituição ou na forma de arrecadação dos recursos que compõe determinado Fundo, caberá ao Poder Judiciário, quando provocado, analisar quanto a sua validade, uma vez que conforme mencionado, trata-se de dinheiro público, quer dizer, dinheiro do contribuinte.
Victor Humberto Maizman é Advogado e Consultor Jurídico Tributário, Professor em Direito Tributário, ex-Membro do Conselho de Contribuintes do Estado de Mato Grosso e do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais da Receita Federal/CARF.
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