Nessa hora em que tanta dor e assombro se abatem sobre a humanidade, penso que é oportuno a gente propor algo na tentativa de apontar caminhos, saídas para a crise. O que desejo deixar claro aqui, logo de início, é a questão da necessidade de se fazer investimentos no Brasil e, particularmente, em Mato Grosso. Investimentos em ciência e tecnologia – e não apenas agora, por conta da questão do vírus ou de outras epidemias –, mas em tudo que esses setores do conhecimento podem contribuir para a formação do ser humano e para a sua melhor estada neste momento da vida.
Falo aqui, como é óbvio, de formação humana em todos os sentidos. Na saúde, claro, em primeiro lugar, porque é isto que estamos vivendo agora, e ninguém está preparado para uma pandemia. De outro lado, a gente percebe que a questão está muito além de questões científicas e tecnológicas de curto prazo, bem como não se trata de algo que se faz por ideologia, nem apenas por vontade. É necessário muito investimento, e investimento sólido, como se fosse, mesmo, o processo de construção de um país e de sua cidadania, de tal modo que esta formação se liga diretamente a uma firme condução e execução de propostas no âmbito científico e tecnológico.
E aí a gente percebe que a ciência e a tecnologia estão presentes nos discursos. Ou, pra ser ainda mais sucinto, no discurso. E, no entanto, bem pouco presente na prática (ou nas práticas). Para competir em escala mundial, o país precisa investir com rigor nessas áreas do conhecimento. Trata-se, afinal, do capital humano, e ótimos exemplos disso são a China e a Coreia que há 20 ou 25 anos se encontravam no mesmo patamar do Brasil e agora estão muito adiante. E por quê? Em função do investimento que esses países fizeram neste tipo de conhecimento, buscando sempre a inovação – por meio de educação, é claro.
Porque, aquilo que custa caro, no fim das contas, não é investir nesses setores; caro, sim, é fazer as reformas depois, correr atrás de reverter o prejuízo. O Brasil nunca teve um programa sistemático de criação de institutos de pesquisas de ciência, por exemplo. O Estado brasileiro nunca orientou, de maneira apropriada, a missão dessas instituições. De forma geral, todos os nossos institutos de ciências, há bastante tempo, estão em estado de sobrevivência, apenas.
Outro exemplo, este ainda mais caro e relevante para nós, é a questão do gasto (quer dizer, investimento) em busca de inovações nesse campo, o que transformou a agricultura brasileira em uma das mais competitivas e rentáveis do mundo, fazendo-a alcançar esse patamar de produção e produtividade que hoje vemos, com os seus produtos chegando, com sucesso, ao mundo todo. Por isso, é preciso recompor a força de trabalho nessas áreas, o que vai certamente contribuir com o crescimento do país. O Brasil precisa retomar o desenvolvimento econômico, e a política de ciência e tecnologia é fundamental pra isso.
Podemos dizer que esses bens intelectuais são pouco valorizados, divulgados e, principalmente, difundidos em nossa nação. Em episódios como este que estamos vivendo, da covid-19, é importante atuar de forma mais incisiva no quesito orçamento, ter condições para contratar novos pesquisadores e respaldar a questão orçamentária que, afinal, é o maior problema que a gente tem hoje. Afirmo que o problema não reside em nossos pesquisadores, nem na falta de condições humanas, pois há, sim, no setor pessoas competentes, temos uma força de trabalho muito forte, universidades, sistemas públicos que podem contribuir de forma decisiva para melhorar a condição do país.
Trazendo para mais próximo de nós, é preciso também falar daquilo que nos é mais relevante, as universidades. Temos de lembrar em primeiro lugar, nesta perspectiva, a UFMT, a Unemat, o Instituto Federal (IFMT), porque as universidades e centros de pesquisa particulares também exercem um papel importante, mas é na universidade pública que o fator desenvolvimento da pesquisa está mais concentrado.
Todas as áreas do conhecimento: educação, engenharias, ciências biológicas, humanas e sociais, tecnologia, saúde coletiva, medicina e tantas outras nas quais a universidade pública e gratuita cumpre o papel na pesquisa, especialmente. E também, nesse sentido, não posso deixar de lembrar as medidas positivas que a UFMT tem tomado neste momento: o Hospital Universitário Júlio Müller, que é referência no tratamento do coronavírus em Mato Grosso; o cuidado, sobretudo, com os estudantes de baixa renda, fazendo repasse de recursos para moradia e para a alimentação deles, já que o Restaurante Universitário está fechado. E, ainda, a decisão divulgada nesta segunda-feira 23 de março informando que o Departamento de Química da Universidade está oferecendo ajuda na garantia da qualidade do álcool 70% doado ao governo do Estado.
De olho no futuro, a UFMT tem trabalhado ainda no aperfeiçoamento das plataformas virtuais, no desenvolvimento de disciplinas de graduação e pós-graduação, na disponibilização de recursos digitais para o aperfeiçoamento da sociedade.
Há que se reconhecer, nesse sentido, o trabalho tantas vezes anônimo que é feito no silêncio dos laboratórios, fazer com que esse trabalho feito em silêncio possa reverberar e chegar ao conhecimento do grande público. E priorizar, com foco e responsabilidade, o investimento em ciência e tecnologia, para enfrentar os desafios, imensos, que o presente nos reserva e o futuro, inexoravelmente, vai nos trazer.
Fabrício Carvalho é Maestro da Orquestra Sinfônica da UFMT.
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