A dinâmica das relações afetivas mantidas pelo ser humano faz com que surjam de tempos em tempos situações inusitadas que exigem a atuação direta do interprete da norma.
Dentre elas, uma das mais recentes, é a elaboração do chamado contrato de namoro.
Apesar de não ser o mais correto, a expressão namoro pode ser tida como uma relação afetiva mantida entre duas pessoas que se unem pelo desejo de estarem juntas e partilharem novas experiências, sem que haja o intento de constituição de família.
Então, o referido contrato tem por finalidade apenas e tão somente delinear que a relação afetiva mantida entre as pessoas se constitui em um namoro e nada mais, em alguns casos com declaração expressa de que não há intenção de constituir família.
Partindo dessa premissa seria fácil concluir que, caso o servidor público inicie um namoro, esse relacionamento não se constituirá em fato ensejador da habilitação do parceiro à uma pensão no caso de seu óbito.
Mas não é tão simples assim, ainda mais quando, no âmbito dessa relação o tempo de duração já é elástico, bem como pela possibilidade de existência de aquisição patrimonial em conjunto, dentre outras situações.
Hipótese em que haverá nítida confusão social quanto à realidade conjugal daqueles parceiros e, por conseguinte, a dúvida quanto a possível direito à pensão por morte.
E para elucidá-la é preciso conjugar os requisitos para que a pessoa seja considerada como dependente para efeitos de pensão nas relações afetivas.
Nesse aspecto as leis dos regimes próprios ao incluir como dependentes dos servidores os cônjuges e companheiros, sendo que para os primeiros não há maior dificuldade à medida que a prova dessa condição é obtida com a evidenciação do casamento.
Muito menos se admite que haja confusão entre o matrimônio e o namoro, por se tratarem de conceitos bastante diversos.
Já no que tange ao companheirismo aí sim pode residir alguma controvérsia já que não se há um meio objetivo de comprovação de sua ocorrência.
Restando a diferenciação entre a união estável e o namoro evidenciada apenas e tão somente por um requisito preponderante consistente no objetivo de contrair família imposto pelo artigo 1.723 do Código Civil para o reconhecimento da existência de uma União Estável.
O qual não existe no namoro, pelo contrário, tal modalidade de relacionamento caracteriza-se justamente pela sua inexistência.
O que afasta qualquer possibilidade de concessão de pensão por morte em favor do namorado supérstite:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO. RESIDÊNCIAS EM DISTINTOS ESTADOS DA FEDERAÇÃO. UNIÃO ESTÁVEL. NÃO COMPROVAÇÃO. 1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte. 2. Comprovada a união estável, presume-se a dependência econômica (artigo 16, § 4º, da Lei 8.213/91), impondo-se à Previdência Social demonstrar que esta não existia. 3. Não é condição indispensável para a comprovação pretendida que o casal resida em um mesmo endereço. Todavia, tratando-se de situação onde as residências localizam-se não apenas em cidades distintas como em diferentes Estados da Federação, há que se exigir um conjunto probatório mais robusto, pois o que se visa demonstrar não é apenas dependência econômica, que por si só não gera direito a pensão, mas de relação com intuitu familiae, isto é, aquela que apresenta convivência duradoura, pública, contínua e reconhecida como tal pela comunidade na qual convivem os companheiros, que é muito mais que um simples namoro, ainda que este possa ser duradouro. 4. Caso em que os documentos trazidos aos autos apresentam pouca relevância probatória e, ademais, sugerem uma relação de amizade ou, quanto muito, de namoro. Nesse contexto, a prova testemunhal, in casu extremamente frágil, não pode se sobrepor a uma prova documental que vai contra as afirmações da autora, razão pela qual esta não faz jus ao benefício de pensão por morte. Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, vencido o relator, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. (AC - APELAÇÃO CIVEL 5002793-63.2010.4.04.7100, CELSO KIPPER, TRF4 - SEXTA TURMA, D.E. 08/01/2013.)
Assim, o contrato de namoro constitui-se de fato em prova do não preenchimento dos requisitos para que o pretenso dependente seja considerado como dependente e nessa condição afasta o direito à pensão por morte.
Bruno Sá Freire Martins, servidor público efetivo do Estado de Mato Grosso; advogado; consultor jurídico da ANEPREM e da APREMAT; pós-graduado em Direito Público e em Direito Previdenciário; professor da LacConcursos e de pós-graduação na Universidade Federal de Mato Grosso e no ICAP – Instituto de Capacitação e Pós-graduação (Mato Grosso); membro do Conselho Editorial da Revista de Direito Prática Previdenciária da Paixão Editores e do Conselho de Pareceristas ad hoc do Juris Plenun Ouro ISSN n.º 1983-2097 da Editora Plenum; escreve todas as terças-feiras para a Coluna Previdência do Servidor no Jornal Jurid Digital (ISSN 1980-4288) endereço www.jornaljurid.com.br/colunas/previdencia-do-servidor, e para o site fococidade.com.br, autor dos livros DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO DO SERVIDOR PÚBLICO, A PENSÃO POR MORTE e REGIME PRÓPRIO – IMPACTOS DA MP n.º 664/14 ASPECTOS TEÓRICOS E PRÁTICOS e MANUAL PRÁTICO DAS APOSENTADORIAS DO SERVIDOR PÚBLICO, todos da editora LTr e de diversos artigos nas áreas de Direito Previdenciário e Direito Administrativo.
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