Dentro de poucos dias começa a transição de governo evidenciando que a equipe de um novo gestor modificará as políticas públicas, aí incluída a estrutura federal para a prevenção, combate e punição à corrupção. Essas alterações por certo sofrerão as inflexões da política e será influenciada por algumas informações consolidadas sobre o assunto.
Nos últimos anos a palavra “corrupção” se incorporou ao discurso de propostas políticas e manifestações eleitorais a cada dois anos, de modo que “combater a corrupção” se parece agradável aos olhos do eleitor, pode até render votos e favorecer o sucesso na eleição. E por essa razão uma alteração no sistema de prevenção e combate à corrupção pode soar mais como uma ação de marketing, sendo ineficaz para contribuir com as melhorias que a sociedade anseia.
O mundo ocidental aceita como verdadeiro e íntegro um índice de medição de corrupção chamado “percepção de corrupção”, conceito que gera um ranking criado por uma entidade denominada Transparência Internacional. Boa iniciativa, desde 1996 apresenta balanços com o ranking de países onde a percepção (e não a quantidade real) de corrupção é reconhecida e metrificada.
O problema é que as fontes da Transparência Internacional para formalizar o seu ranking não são exatamente independentes, se tratam de organismos e instituições tipicamente capitalistas que procuram fazer negócios nos países. E se deduz que naquelas nações onde esses objetivos sofram algum tipo de restrição logo haveria “perda de pontos” no ranking. A lista com o índice de percepção de corrupção de 2017, que indica uma piora no ambiente brasileiro (o Brasil seria o 96º país menos transparente), foi feito com base em fontes ainda desconhecidas. Todavia os dados que geraram o ranking do ano de 2014 elencou 12 entidades como fontes informativas, entre elas uma “Consultoria de Riscos Políticos e Econômicos Asian Intelligence 2014”, o anuário “Banco Mundial - Política Nacional e Avaliação Institucional 2013”, e a “Pesquisa de Opinião Executiva do Fórum Econômico Mundial (EOS) 2014”.
Portanto, as informações buscadas para medir a corrupção nos diversos países é baseada em dados subjetivos fornecidos por pessoas físicas e instituições que possuem nítidos interesses em negócios com as nações pesquisadas. Difícil acreditar que suas opiniões e informações sejam de tal modo isentas quando os seus interesses sejam confrontados e/ou contrariados.
Outro aspecto interessaante: no atual índice de percepção de corrupção a Suiça seria o 3º país mais transparente do mundo, e bem situado entre as 180 nações pesquisadas. Seria uma espécie de “território livre de corrupção”.
Mas não é isso o que pensa a maioria das pessoas, que vêem a Suíça como um paraíso fiscal, um país onde os endinheirados do mundo inteiro enviam seus recursos monetários, por vezes obtidos com o cometimento de crimes comuns e corrupção, e ali encontram proteção e sigilo.
Uma entidade que se intitula “Rede de Justiça Tributária” (Tax Justice Network) divulgou os resultados do que chama “Índice de Segredos Financeiros 2018”, chamando atenção para a corrupção global e os países que protegem os delitos financeiros. O índice é baseado em critérios objetivos e verificáveis, segundo os organizadores, não haveria percepções subjetivas, sem a emissão de opiniões. O índice de sigilo financeiro é um ranking politicamente neutro e auxilia a compreensão genuína do sigilo financeiro global, dos paraísos fiscais, o segredo quanto aos fluxos financeiros ilícitos ou fuga de capitais.
Por esse outro índice, o país mais corrupto do mundo seria a Suíça, seguido dos Estados Unidos, das Ilhas Cayman, Hong Kong e Cingapura, nações que protegem o sigilo fiscal e blindam o sistema financeiro contra investigações e processos. Desse modo haveria uma distância planetária entre a “sensação” ou “percepção da corrupção” e a proteção real do sigilo bancário e fiscal oferecido por alguns territórios chamados de “paraísos fiscais”. Corrupção seria ignorar o fato de que o dinheiro protegido pelos sigilos bancários poderia ser produto de crimes em outros países, o que nos permite desconfiar dos índices que medem a corrupção, que estariam equivocados.
Vilson Pedro Nery é advogado, comitê estadual do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE).
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