• Cuiabá, 07 de Dezembro - 00:00:00

Retrospectiva 2024 no varejo


Jorge Gonçalves Filho

Caros leitores, um ano "fora da curva" está terminando, para alguns setores um ano mais difícil de que para outros.

Iniciamos 2024 recebendo, para aprovação, o PLP 68/2023, destinado à implantação da reforma tributária, mais diretamente do IBS e do CBS, que resultam no IVA (Imposto e Valor Agregado), que afetará a todos, indústria, comércio, serviço e consumidores; e o PLP 108/2023, que implantará o Comitê Gestor da reforma tributária, que cuidará de como será administrada e distribuída toda a receita dos impostos, as fiscalizações e outros atributos governamentais; comitê, este, com muitas polêmicas a serem tratadas.

Vamos evitar, aqui, entrar em detalhes da reforma tributária, mesmo porque, após o PLP 68/2023 ter sido trabalhado há "n" mãos na Câmara, incluindo todo o trabalho dos lobistas e grupos de interesse, em que cada um buscou defender o seu setor, nem sempre em linha com os interesses do país, o relatório foi aprovado e encaminhado ao Senado, com previsão de IVA de 26,5%, fruto de todas as modificações, reduções e excepcionalidades introduzidas no PL. Vale lembrar que quando se iniciou a reforma tributária, o IVA estimado seria em torno de 22%.

Agora, na tramitação no Senado, já se fala em IVA superior a 28%, logicamente por conta de mais exceções e ajustes sempre justificados. Teremos o maior IVA do mundo, ao que se sabe, superando o da Hungria, que é de 27%. E mais, uma leitura atenta, com mais profundidade do PL68/2023, mostra que não há limite para o IVA, podendo superar os 28%, e somente após finalizar a implantação da reforma tributária, em 2032, é que se verificará o IVA praticado e será criado um projeto de lei sugerindo retirar exceções e eliminar desiquilíbrios, buscando atingir 26,5%. Então, difícil pensar que após anos de implantação da reforma tributária e excesso de arrecadação ou, digamos, arrecadação fora do percentual planejado, haverá uma forte correção e redução. Aguardemos os impactos na economia e no varejo, principalmente.

Caminhando por 2024, encontramos uma outra batalha, exaustiva, mas não finalizada, do retorno do Imposto de Importação nas operações de vendas de pequenos valores via cross-border. Foi uma intensa luta, com dezenas de associações e institutos de varejo apresentando argumentos técnicos e sociais de eliminação de empregos no país ao Congresso e ao Executivo, além de iniciativas junto ao Judiciário, no caso, o STF (Superior Tribunal Federal), para que retornasse o imposto de 60% que foi reduzido a zero.

Um dos mais consistentes estudos encomendados pelo IDV (Instituto para Desenvolvimento do Varejo) junto ao IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário) ratificou o que todos sabiam e sabem, a carga tributária média na cadeia de fornecimento até o cliente consumidor é superior a 90%, logo, a batalha não terminou. Temos que evoluir, uma vez que o aprovado e em vigência até o momento leva a uma carga tributária de 44,6%, (composição de Imposto de Importação de 20% + 17% de ICMS modal). Fácil concluir que, apesar de alguma melhora, estamos na metade do caminho e temos que alcançar a isonomia tributária. Este assunto cross-border ainda tem outros pontos importantes, inaceitáveis, como a entrada de produtos importados sem certificações. Aquelas mesmas que são exigidas no mercado interno com pesadas penalizações quando não cumpridas.

Os dois temas abordados acima, reforma tributária e cross-border, já seriam suficientes para demonstrar como se requer muita energia para trabalhar e empreender no Brasil, porém, em seguida, eclodiu outro tema, também muito relevante para a economia, as bets.

As bets têm tirado bilhões de reais de circulação do varejo, serviços, educação e outros setores, gerando elevadas despesas para a saúde pública no tratamento do vício do jogo e prejudicado o bem-estar de milhares de famílias. Os valores apostados chegaram a cerca de R$ 90 bilhões em 2023, e a previsão é de R$ 200 bilhões em 2024. Muitas pesquisas foram feitas junto à população, e nenhuma mostrou benefícios pela existência das bets, somente malefícios, salientando que, nelas, foram incluídos os cassinos eletrônicos e os jogos do tigrinho.

Vieram as portarias do Ministério da Fazenda para a regulação das bets, brandas, de pouco impacto, levando a sociedade civil organizada a pedir a revogação da lei que institui os jogos eletrônicos no Brasil. Por exemplo, o imposto a ser pago pelas empresas de bets é de apenas 12%, uma das menores taxas já conhecidas para qualquer negócio no país, e deveria ser bem mais elevada, se comparada a produtos que geram vício, como o fumo e a bebida, que passam de 60%. Difícil entender porque tal benefício. Há tantos argumentos reais para que se revogue a lei das bets ou que, pelo menos, tenho uma regulação adequada, que tornaria por demais extenso este artigo.

Fato é que, no momento, o assunto está no STF, que já determinou algumas medidas corretivas urgentes. E, se ouvirem a população, conforme pesquisa do Datafolha publicada em 24/11/2024 no jornal Folha de S. Paulo, 65% dos brasileiros acham que as bets deveriam ser proibidas e 71% rejeitam as propagandas das bets. A mesma pesquisa levantou que a maioria das casas de aposta recorre à divulgação pelo modelo de afiliados, em que influenciadores divulgam apostas e ganham comissões com base nos valores perdidos pelos jogadores, ou seja, quanto mais o consumidor perde mais o afiliado ganha.

Ainda cabe registrar que há duas CPIs sobre as bets em curso no Congresso Nacional. Há esperança de que o assunto bet terá um final adequado ao povo brasileiro.

Vejam que apenas três assuntos mencionados acima, reforma tributária, cross-border e bets, mostra como 2024 tem sido desafiador para o varejo, que é o nosso foco aqui neste artigo. O varejista é um gladiador, sempre participando de batalhas para melhorar seu negócio, um otimista criativo, que enfrenta juros elevados e uma profusão de novas leis e portarias que surgem a todo instante e o obriga a fazer frente a despesas crescentes.

Mesmo assim, não desiste, tem um mercado e clientes a serem atendidos e busca oportunidades de criação de novos negócios, melhoria no atendimento aos consumidores e ganhos de produtividade, certamente, proporcionando progresso e o bem-estar à sociedade.

Caberia mencionar neste artigo dezenas de obrigações legais e operacionais a que o varejo e as empresas em geral são submetidos, e entre muitos pedidos que poderíamos fazer aos dirigentes do país, para o ano novo, destacaria um em especial: tornem o Brasil uma país mais simples para se empreender.

 

Jorge Gonçalves Filho é presidente do IDV - Instituto para Desenvolvimento do Varejo.




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