Rafaela Maximiano
O principal desafio do Corpo de Bombeiros Militar no enfrentamento às queimadas florestais deste ano é lidar com a ação humana irresponsável e criminosa que muitas vezes provoca ou intensifica essas ocorrências colocando em risco a vida de pessoas, animais e vastas áreas naturais.
A avaliação é do tenente-coronel BM Marco Aurélio Aires da Silva, comandante do Batalhão Especial Ambiental (BEA) do Corpo de Bombeiros Militar de Mato Grosso.
“Então a maior dificuldade ainda é a conscientização das pessoas”, afirma.
Segundo o comandante, o Estado vem investindo nas ações preventivas, só que elas surtem efeitos com gerações e a longo prazo. “O Estado precisa continuar investindo em prevenção como tem feito, mas também precisa desprender grandes recursos para as respostas que continuam sendo necessárias caso haja ocorrências de incêndio”, acrescenta.
Em entrevista ao FocoCidade o tenente-coronel do Corpo de Bombeiros que também é especialista em gestão de segurança pública e piloto da corporação fala sobre: o plano de operações para a temporada de incêndios florestais, a tecnologia adotada para o monitoramento da área de risco, período proibitivo de queimadas e punições, as medidas adotadas após o grande incêndio que a região do Pantanal sofreu no ano passado, entre outros.
Confira a entrevista na íntegra:
Quais são as principais ações adotadas pelo Corpo de Bombeiros Militar de Mato Grosso no combate a incêndios florestais?
O Corpo de Bombeiros Militar do estado de Mato Grosso realiza um plano de operações para a temporada de incêndios florestais todo ano, e, esse plano de operações estabelece os recursos que vão estar disponíveis desde efetivo, financeiro, logístico, de equipamentos, para podermos executar essas ações que são de prevenção, preparação, resposta e responsabilização durante todo o ano. Então esse planejamento é realizado no final do exercício do ano anterior até o início desse exercício, ele é apresentado dentro da instituição e o Batalhão de Emergência Ambiental faz essa assessoria à Assessoria Operacional e esta faz apresentação ao comandante, a fim de homologar o trâmite ou inserir alguns ajustes ou implementos em que o nível estratégico profissional ache pertinente.
Como a corporação está preparada para lidar com incêndios florestais, ou seja, quais são as principais estratégias e recursos utilizados?
Como o plano de ações já levanta quais são as ações que devem ser executadas em quatro fases, seja de prevenção, preparação, resposta e responsabilização, na fase de resposta especificamente, há um incremento de equipes em campo nessa resposta, isso porque os indicadores de incêndio acabam aumentando durante esse período. Então em decorrência a instituição já se prepara, dentro desse planejamento que eu mencionei tem todo esse levantamento dos equipamentos, dos recursos disponíveis bem como o efetivo que será empregado, por isso a gente aumenta nossas respostas.
Quantos instrumentos de respostas a gente aumenta: nós possuímos 25 unidades operacionais em 24 municípios. Nós aumentamos a quantidade de equipamento de resposta para 81 instrumentos de resposta no estado. Isso possibilita um aumento de capacidade do Corpo de Bombeiros a fim de dar uma resposta mais assertiva à sociedade frente aos incêndios florestais, ou seja, são 81 equipes que vão estar em campo e elas têm nomenclaturas, como as BMM, as Brigadas Municipais Mistas, compostas por Bombeiros Militares e brigadistas cedidos pelas prefeituras ou contratados pela prefeitura parceira do Governo do Estado; tem a Base Descentralizada de Bombeiros Militar composta somente por Bombeiros Militares; também a Brigada Estadual Mista composta por Bombeiros Militares e brigadistas contratados pelo Estado, inclusive dentro do plano de operações têm recursos disponibilizados pelo Governo do Estado para a contratação desses brigadistas afim de aumentar a quantidade de equipes; e, as equipes de intervenções operacionais.
Temos vários tipos de instrumentos que são colocados em campo com a finalidade de atender principalmente as regiões mais delicadas no estado baseado no monitoramento que a gente realiza nesse grande período proibitivo.
E essas equipes disponíveis são tanto para os incêndios florestais quanto para os incêndios de terrenos em áreas urbanas?
Sim. Nos municípios que já possuem unidades do Bombeiro Militar, essas mesmas unidades vão atender essas ocorrências, então os instrumentos de resposta que são circunvizinhos vão focar para atender principalmente os incêndios nas áreas rurais e urbanas. Mas nos municípios que não há unidade do Bombeiro Militar, esse instrumento de resposta, essa equipe, vai também fazer esse atendimento.
Durante o período proibitivo do uso do fogo em Mato Grosso, quais são as medidas adotadas pelo Corpo de Bombeiros para fiscalizar e prevenir queimadas e incêndios não autorizados?
Na verdade, o Estado de Mato Grosso, há dois anos, tem tido esse comportamento de declarar estado de emergência ambiental para os meses de maio a novembro, considerando a redução significativa das chuvas, bem como as condições meteorológicas que propiciam a propagação de incêndios. Nesse mesmo decreto de estado de emergência ambiental ele também estabelece que fica proibido o uso de fogo no período de 1 de julho a 31 de outubro, exatamente se baseando nas condições meteorológicas que acabam propiciando a propagação de grandes incêndios.
Além dessas equipes que estão em campo, enquanto elas não estiverem atendendo ocorrências, elas vão realizar a prevenção ativa, que é percorrer as propriedades, falar sobre a questão do não uso do fogo nesse período, realizar palestras em escolas. Eles vão percorrendo principalmente as áreas críticas e fazendo essa prevenção em conjunto com as ações de resposta. Essa equipe não fica parada esperando o seu acionamento, ela fica monitorando regiões delicadas baseado em indicadores repassados pela Sala de Situação e percorrendo e realizando prevenções ativas.
Além disso as Salas de Situação, que são sete, sendo seis regionalizadas que são subordinadas aos comandos regionais do Corpo de Bombeiros e uma Sala de Situação Central que vai funcionar integrada com o Comando Regional I de Cuiabá. Essas Salas de Situação elas possuem inovações tecnológicas que possibilitam monitorar grandes incêndios, possíveis queimadas ilegais em propriedades rurais visando o aumento da área produtiva, então diante disso, quando a gente verifica algo a gente encaminha a equipe de fiscalização, que são outras equipes além daquelas 81 que já citamos. E essa equipe de fiscalização vai verificar se ali houve o uso irregular do fogo naquela propriedade. Temos o decreto 6.514 que estabelece as multas para danos ambientais. Se tem um desmatamento de vegetação nativa associado ao uso irregular do fogo, por exemplo, aquele proprietário vai pagar em torno de R$ 7,5 mil por hectare desmatado. Além disso, nas áreas agropastoris especificamente, são R$ 1 mil por hectare e associado o uso do fogo aumenta em 50%. Fora os agravantes como descumprimento de embargos e outros. Temos equipes específicas para fiscalização e equipes específicas para ações de resposta dentro do estado.
E para as queimadas em terrenos urbanos, existe penalidades?
Sim. Mas essas penalidades de queimadas em áreas e terrenos urbanos são feitas pelas Secretarias Municipais de Meio Ambiente. Ela realiza essas ações até porque o foco nosso são nas áreas rurais que podem propagar grandes incêndios em decorrência do estado possuir três grandes biomas.
O senhor citou que é utilizada de tecnologia para o monitoramento de áreas de risco de incêndios, pode detalhar sobre e como ela auxilia nas operações?
O Estado sempre utilizou a plataforma disponibilizada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais que é o BDQueimadas que consegue levantar indicadores de focos de calor, que não são incêndios. É quando se tem um aumento expressivo de temperatura numa determinada área e ali é registrado um foco de calor. Quando se tem aglomerações de focos de calor naquela área, ela se torna uma área mais delicada, é preciso encaminhar a equipe para monitorar de perto, só que o foco de calor não significa que seja incêndio e nem mesmo uma queimada. Diante disso buscamos através do Estado fazer a aquisição de uma plataforma mais assertiva e com dados já analisados pra gente. Por exemplo, quando a gente tem uma aglomeração de focos de calor em uma determinada área e esse registro ainda continua na medida que vão passando os satélites, isso significa que ali existe um evento de fogo e esse evento de fogo tem grandes chances de ser um incêndio. E, na medida que se tem muitas quantidades de focos de calor pode demonstrar que seja uma grande frente de incêndio.
Então essa plataforma que o Estado adquiriu por meio do Corpo de Bombeiros e que vai ser utilizada pela primeira vez este ano, e que já estamos utilizando inclusive, ela já possibilita entregar esse produto analisado, ou seja, ela entrega para mim esse evento de fogo e automaticamente essa plataforma de forma remota encaminha a coordenada para a equipe mais próxima daquele incêndio e essa equipe se desloca para fazer o combate de uma forma bem mais rápida, bem mais célere.
Qual o efetivo atual do Corpo de Bombeiros Militar de Mato Grosso, levando em consideração a contratação de brigadistas?
Todo o efetivo do Corpo de Bombeiros é envolvido nessas ações, a gente tem ciclos operacionais compostos de 10 dias e essas equipes fazem revezamento de 10 em 10 dias, até porque essa atividade é muito desgastante e exige uma substituição para que a gente consiga manter a eficácia das equipes em campo. Além disso, a gente tem os brigadistas que são contratados pelo Estado e podem ser contratados até 180 brigadistas, e estes compõem essas unidades coordenadas pelo Corpo de Bombeiros. Os militares envolvidos no setor operacional são em torno de 1.200 homens envolvidos nas operações e se revezando em campo, além também dos brigadistas contratados pelas prefeituras parceiras, onde tem as BMM – numa parceria entre municípios e Governo do Estado. Inclusive o decreto 259 de 2023, que estabelece o estado de emergência ambiental, autoriza a Secretaria de Estado de Segurança Pública a adotar medidas legais para a contratação de brigadistas, é uma estratégia do Estado para ele poder se preparar para essa fase de resposta da temporada de incêndios florestais.
E, quanto ao treinamento desses brigadistas e a segurança de todo o efetivo, como é pensada?
Dentro do plano de temos as fases de prevenção e preparação, que é justamente para isso. Elaboramos campanhas midiáticas, preparações e capacitações de fevereiro a junho, exatamente atualizando os conhecimentos técnicos dos bombeiros militares e brigadistas para que eles possam estar prontos para a fase de resposta que se iniciou em 1 de julho. Isso é muito importante e nessa fase também vão acontecendo as aquisições, porque o Estado disponibiliza o recurso, nós montamos os processos licitatórios para comprar aquele equipamento necessário para que a equipe tenha segurança durante suas ações em campo.
A preparação ocorre seja com conhecimentos técnicos atualizados, bem como aquisições necessárias, ou seja, os equipamentos de proteção individuais, coletivos de combate, e, individuais de combate para que eles estejam protegidos e sejam efetivos em campo. Nessa fase também fazemos as capacitações dos brigadistas, de comunidades quilombolas, comunidades circunvizinhas a unidades de conservação estaduais, os municípios que solicitam também atendemos com essa capacitação. Também capacitamos 300 militares do Exército Brasileiro, caso haja a necessidade de um incremento maior ainda, a gente pode estar solicitando o apoio do Exército.
O desastre ambiental que ocorreu no Pantanal no ano passado pode ocorrer novamente ou até mesmo em outra área de risco no Estado? E, temos para este ano áreas já apontadas como de risco?
Antes de ocorrer o incêndio no Pantanal o Estado já estava preocupado com as ações de meio ambiente porque o CEDIF-MT ele foi criado em março de 2020, ou seja o Estado já estava se preparando, se estruturando, fortalecendo as ações de resposta, entretanto houve um acúmulo de materiais por muitos anos se depositando e acabou que teve esse grande incêndio nessa região onde as características de combate são bem diferentes do Cerrado e da Amazônia Legal, porque ali o terreno é de difícil acesso, mesmo para o deslocamento de equipes é necessário que seja feito por helicóptero, e o incêndio muitas vezes é subterrâneo e acaba sobrepondo as barreiras naturais, as estratégias de combate, é um combate bastante delicado.
Para este ano o Estado já iniciou o manejo integrado do fogo fora do período proibitivo. Ao todo foram três queimas prescritas em duas unidades de conservação estadual e uma municipal, justamente começando a consolidar esse conhecimento na prática em criar barreiras naturais e evitar que grandes incêndios adentrem nessas unidades. A tendência é aumentar esse trabalho de manejo integrado do fogo e no bioma específico que é o cerrado para evitar que pelo acúmulo de material combustível acabe devastando aquela área.
De imediato temos algumas áreas delicadas como o próprio Pantanal que tem hoje 12 equipes distribuídas, além das operacionais de Santo Antônio e Poconé. Só que não significa que ali vai ter um incêndio, também a APA de Chapada dos Guimarães.
O monitoramento também levanta quais são os municípios que possuem uma vulnerabilidade maior pelo acúmulo de focos de calor, mas a gente estrutura unidades de resposta, caso tenha alguma ocorrência principalmente com a plataforma nova, entrega um relatório com locais com temperaturas maiores que 30°C, rajadas de vento superiores a 30 km/h e temos umidade relativa menor que 30%, chamamos de 30/30/30, além do que ela vai acionar as equipes de uma forma remota, e conseguiremos dar uma resposta mais rápida, inclusive com apoio de outras equipes que não estão em áreas com ocorrência de incêndios.
Essa ação de termos queimadas vai depender muito da ação humana, mas o Estado está preparado e as equipe estão bem distribuídas em campo para dar uma resposta satisfatória à sociedade.
Para este ano de 2023, quais serão os principais desafios a serem enfrentados pelo Corpo de Bombeiros Militar de Mato Grosso no combate a incêndios, na sua opinião?
A gente não pode deixar de relatar a importância que o Governo do Estado tem dado às ações do Corpo de Bombeiros, principalmente voltadas aos incêndios florestais. Hoje no Estado temos um Comitê Estratégico para o Combate do Desmatamento Ilegal, a Exploração Ilegal e aos Incêndios Florestais – CEDIF-MT, que é presidido pelo governador Mauro Mendes.
Desde 2020 o governador disponibiliza grande parte de recursos para que a gente possa executar, comprar produtos e serviços que são fundamentais para que as equipes estejam preparadas e dar uma resposta assertiva. Então para se ter uma ideia, de 1 de janeiro a 5 de junho que foi o último relatório que nós realizamos, tivemos uma redução de 22% dos focos de calor, lembrando que focos de calor não são incêndios, mas são um indicador para mensurar a possibilidade de risco de incêndio, isso em relação ao mesmo período em 2022.
Nós também tivemos uma redução de focos de calor de 14% na Amazônia Legal, de 35% no Cerrado e de 17% no Pantanal. E, esses focos de calor, 6% são registrados em Unidades de Conservação, 16% em terras indígenas, 72% em propriedades privadas e 5% em projetos de assentamentos. Estou citando isso para poder responder a sua pergunta, pois apesar dos focos de calor não serem um incêndio, uma queimada ele é um indicador que a gente mensura realmente quais são esses locais que têm o risco de realmente ter um princípio de queimada.
E, como a gente percebe que 72% estão em propriedades privadas onde tem um fluxo maior de pessoas, então tem uma ação ligada diretamente ao homem. É claro que o Estado está preparado para dar respostas a grandes incêndios, no entanto a gente precisa continuar conscientizando as pessoas, a sociedade, para que não façam o uso irregular do fogo, porque realmente a maior quantidade de ocorrências geradas são do uso irregular do fogo por parte do cidadão.
Então a maior dificuldade ainda é a conscientização das pessoas. E, o Estado vem investindo nas ações preventivas, só que elas surtem efeitos com gerações, a longo prazo. O Estado precisa continuar investindo em prevenção como tem feito, mas também precisa desprender grandes recursos para as respostas que continuam sendo necessárias caso haja ocorrências de incêndio.
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