• Cuiabá, 12 de Julho - 2025 00:00:00

A nação brasileira precisa de uma reconciliação, assevera Dom Mário, arcebispo de Cuiabá 


Rafaela Maximiano

Passada as eleições presidenciais “a nação brasileira precisa de uma reconciliação”, asseverou Dom Mário Antônio da Silva, novo arcebispo de Cuiabá.  

Segundo ele “não se trata de uma uniformidade de pensamento, mas de uma unidade de ação, de um consenso para um bem maior de brasileiros”. Sobre as manifestações contra o resultado das eleições pontuou: “não adianta ficar numa disputa de terceiro turno, ninguém vai sair vencedor, todos vão sair perdendo. É preciso um amor maior pela nação e pela vida das pessoas”.  

As opiniões foram emitidas pela autoridade eclesiástica da Igreja Católica em Mato Grosso, em entrevista ao FocoCidade.   

Dom Mário também fez uma avaliação dos oito meses que está à frente da Arquidiocese de Cuiabá; falou dos desafios que espera enfrentar em 2023; da realização do Vinde e Vede em 2023; sobre pandemia, guerra, política e religião; explicou o significado do Natal e deixou uma mensagem para o ano de 2023.    

Sobre política pontuou: “o momento político vivido no país é tremendamente desafiante... É muito triste que no Brasil, neste ano de 2022, não só pela campanha eleitoral, mas por outros elementos da política, da economia e da religião, foram geradores de polêmicas, de polarização, de discussões, de tantas ofensas, ameaças, violências físicas e às vezes até mortes. Então isso nos entristece muito pois demonstra a incapacidade do ser humano de conviver com o diferente”.  

Sobre a economia foi enfático: “é preciso uma economia a serviço da vida. A pandemia nos ensinou isso”.  

Dom Mário Antônio da Silva é o segundo vice-presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e membro da Diretoria da Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM- Brasil).  

Boa leitura!  

Qual avaliação o senhor faz deste ano de 2022 frente à Arquidiocese de Cuiabá e quais desafios que o senhor acredita que enfrentará em 2023?  

Como foi um ano de chegada, nesses oito meses, eu reconheço que vivenciei muitas novidades e muitas alegrias. Novidade por ainda não conhecer o estado de Maro Grosso, por não conhecer a igreja da Arquidiocese de Cuiabá, então muitas coisas me têm feito crescer e também desfrutar da alegria e da história dessa igreja. Sobretudo no contato com as pessoas e com as nossas comunidades. Não só as da Capital, mas também das demais cidades da nossa Arquidiocese. Evidentemente que essas alegrias não estão desacompanhadas de desafios e as vezes até algumas tristezas pelos limites do ser humano. Mas eu registro aqui dando esta entrevista que me chama atenção a garra e a força das pessoas, a boa vontade em colaborar os desafios e limites que existem na nossa organização e na nossa dinâmica para com a pastoral como igreja católica.  

Das alegrias cito as igrejas cheias nas celebrações, rezando conosco, eu particularmente fazendo as celebrações com muitos jovens e adultos sendo crismados. Mas também percebendo uma maior necessidade de organização pastoral e econômica em nossas paróquias para que o trabalho pastoral seja mais cultuoso e gestão seja também um pouco mais digna e respeitosa com a participação e corresponsabilidade das pessoas.  

Em 2023 teremos a retomada do “Vinde e Vede” presencial, tendo em vista que é o maior evento católico da região Centro-Oeste, ocorre no período de carnaval, e, nos últimos anos ocorreu apenas on-line devido à pandemia?  

Pelo que escutei do Vinde e Vede é um grande momento da Arquidiocese de Cuiabá, de celebração, mas também de proposta de evangelização e de proposta vocacional, que se realiza na ocasião do Carnaval. Tendo em vista os últimos dois anos a impossibilidade de realizá-lo de maneira grandiosa e ampla devido à pandemia, nós também este ano de 2022 optamos por realiza-lo de maneira mais limitada em fevereiro de 2023. Ele vai acontecer numa edição limitada pela presença tendo em vista que não superamos ainda plenamente a pandemia. A nossa intenção é que possa se realizar com atividades arquidiocesanas e atividades nas paróquias, ou as vezes algumas delas na modalidade híbrida – presencial e também com transmissão pelas redes sociais.  

Então o Vinde e Vede vai acontecer, logo estaremos divulgando uma temática que tudo indica que será “A luz do ano vocacional” que estamos vivenciando no Brasil desde novembro até o próximo novembro de 2023. E vai ser muito bom para que a gente possa no ano vindouro estar analisando uma formatação mais amplas para as edições posteriores.  

Porque além da política ao bem comum, tem também a politicagem.

Que leitura o senhor faz do momento vivido pelo país onde temos pandemia, guerra no cenário externo e posicionamentos políticos ideológicos fortes que acabam até mesmo dividindo famílias?  

O momento atual do Brasil, uma grande Nação, inegável a alegria do brasileiro, inegável o espírito acolhedor do brasileiro e de solidariedade, mas isso não pode nos fazer ignorar os grandes problemas que vivemos em nossa Nação. Problemas sociais, problemas políticos e até mesmo religiosos e econômicos.   

A pandemia foi um período de muita provação pela doença, mas também foi um período de muita solidariedade no Brasil e no mundo e o Brasil se destacou pela solidariedade aos mais necessitados, o altruísmo. Ao lado disso lamentamos a morte de centenas e centenas de pessoas que poderiam ser evitadas, tanto no Brasil quanto em outras localidades no mundo. Claro que a pandemia nos traz muitas interpelações: e agora, como construir novos tempos? Porque não basta voltar à normalidade de antes, ela não existe mais. É preciso uma melhora nessa normalidade e isso não ocorrerá sem a boa vontade de todos. Sabemos da importância do Sistema Único de Saúde no país, o SUS, mas sabemos que ao lado disso é preciso boa vontade de gestores e também de nós homens e mulheres da religião.   

É preciso uma economia a serviço da vida. A pandemia nos ensinou isso. Não basta ter riqueza é preciso que a economia esteja à serviço da vida para não se concentrar nas mãos de alguns e não favorecer pequenos grupos, mas favoreça a quem mais necessita.   

É preciso entrar num consenso digno, respeitoso, sem anular o direito de manifestações, considerando um direito dentro da Constituição e as Justiça, mas é preciso um amor maior pela nação e pela vida das pessoas.  

A pandemia também interpela a cada um de nós a olhar para frente, como pessoas de esperança, íntegros e melhores. Creio que mais do que nunca, se não saímos diferente desse período, a gente conseguiu aprender algo que além da contrariedade das mortes e das doenças que somos solidários com famílias em luto, é um momento de aprendizado para toda a humanidade. 

Com relação às guerras é muito triste viver em um mundo com guerras. Quando duas nações estão em guerra, nenhuma vence. Quando duas nações estão em guerra a humanidade toda perde. A verdade é essa, representa um fracasso da humanidade em gerar paz, em administrar as coisas com justiça e equidade. Para mim a guerra é um tremendo fracasso da humanidade e que todos nós também temos coparticipação por aquilo que fazemos, às vezes até aquilo que pensamos. Por isso devemos promover a paz: que não é uma vida sossegada, mas uma vida com a presença de Deus e com a presença da boa vontade em cada gesto, em cada atitude. A paz que desejamos não é o sossego, poia a guerra diz: “o meu sossego é o outro no cemitério”, isso não é paz. A guerra também traz uma falsa conotação de paz. A verdadeira paz é aquela que quer o bem de todos, Deus por exemplo quando fala de paz, ele quer que todos os seres humanos sejam promovidos a uma vida digna, a uma vida em abundância, essa é a paz de Deus e deve ser a dos cristãos.  

O momento político vivido é tremendamente desafiante. Eu creio que todos os anos, todos os dias para nós tem aquela fatia da política, porém em anos eleitorais é muito mais intenso. Porque além da política ao bem comum, tem também a politicagem. É isso que estraga a verdadeira interpretação e atuação dos cidadãos e também dos eleitos como homens e mulheres políticos. Nós não devemos ser apolíticos, devemos desenvolver a política como exercício de um governo para o bem comum, com a arte de governar para o bem comum.   

É muito triste que no Brasil neste ano de 2022, não só pela campanha eleitoral, mas por outros elementos da política, da economia e da religião, foram geradores de polêmicas, de polarização, de discussões, de tantas ofensas, ameaças, violências físicas e às vezes até mortes. Então isso nos entristece muito pois demonstra a incapacidade do ser humano de conviver com o diferente. As diferenças não nos fazem maiores ou menores, elas nos distinguem e isso deve ser para nós uma riqueza dentro do âmbito da acolhida do diferente, do altruísmo e de saber conviver com as pessoas.

Tudo isso vem descaracterizar a verdadeira política tão necessária nos dias de hoje, e isso afetou a sociedade, as famílias, grupos de amigos, grupos de trabalho e de convivência. Agora tendo passado o período eleitoral, creio que a nação brasileira precisa de uma reconciliação. Eu preciso, você precisa, todos nós brasileiros precisamos de uma reconciliação. Não se trata de uma uniformidade de pensamento, mas se trata de uma unidade de ação, de um consenso para um bem maior de brasileiros e também imigrante se refugiados que vem buscar abrigo em nossa nação. Não adianta ficar numa disputa de terceiro turno, ninguém vai sair vencedor, todos vão sair perdendo. É preciso entrar num consenso digno, respeitoso, sem anular o direito de manifestações, considerando um direito dentro da Constituição e as Justiça, mas é preciso um amor maior pela nação e pela vida das pessoas.  

Precisamos de um governo para os nossos dias, nem para o passado e nem para o futuro, somente para nossos dias, atento às necessidades da nossa população. Aí a religião pode ajudar no aspecto de semear a esperança, a paz, a presença de Deus; desde que não seja uma religião alienante aos problemas sociais. Cabe à política construir uma sociedade justa, mas cabe a nós mulheres e homens da religião lutar pela justiça que é o grande projeto de Deus para a humanidade. A grande vontade de Deus para homens de mulheres de todos os tempos, uma justiça que não é igualdade, mas que é equidade. Que é respeito à dignidade e à necessidade do ser humano.  

Qual é o significado do Natal? 

O Natal é a festa do nascimento de Jesus. E, o nascimento de Jesus não foi apenas um fato esperançoso, mas foi um fato concreto da salvação de Deus para toda a humanidade. Aquele que encarnou o coração do Espírito Santo no seio de Maria veio para libertar a humanidade de todos os tempos do pecado, da escravidão e da morte eterna. Natal é esperança, é vida nova, é festa, é libertação. E, para nós hoje, deve ser mensagem de que Jesus continua morando entre nós, o Emanuel é Deus conosco, por isso Natal não é magia de Papai Noel, Natal é presença de Deus em nossos corações.  

Uma mensagem à sociedade mato-grossense para o ano 2023…  

Está chegando 2023, claro que no novo ano, temos aí para a humanidade toda e sobretudo o brasileiro, de olhar com muita esperança, fazer novos projetos, novos planos, para pequenas e grandes dimensões da nossa vida. E é isso mesmo! É um momento de fazer um balanço da vida, do ano que se encerra, e, um planejamento concreto para o ano que vem. E, que isso seja revestido da oração, da palavra de Deus, da amizade, da união familiar, da harmonia social, para que realmente possamos vivenciar um 2023 que vai muito além de um calendário de ano novo, mas que seja de concretude nas nossas realizações, nas nossas relações.

Que seja de realizações nos ideais de cada um. Que aquilo que sonhamos se concretize para que o ano de 2023 gere frutos de justiça, de bondade, de felicidade, de saúde, de plena realização profissional e vocacional, de todas as pessoas. Eu creio que cada um pode colaborar e convido a todos a colaborar um pouco mais no ano de 2023 para que seja um período abençoado para todos. 




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