• Cuiabá, 10 de Julho - 2025 00:00:00

Não esqueçam que TEA não é doença, alerta especialista


Rafaela Maximiano

No mês de conscientização da sociedade sobre o autismo, o FocoCidade traz uma entrevista especial sobre o tema, falando sobre sinais, diagnóstico, e os tratamentos que existem no Sistema Único de Saúde.  

A conversa foi com a psicóloga Criziene Melo Vinhal, que atualmente integra a equipe adulto e pediatra do Centro de Reabilitação Dom Aquino Corrêa, o CRIDAC-CERIII, em Cuiabá. 

Segundo a profissional, o autismo não é uma doença, é um funcionamento cerebral diferente, uma condição, um espectro, o chamado TEA: Transtorno do Espectro do Autismo. E há diferentes níveis de autismo: leve, moderado e severo. 

“Não esqueçam que TEA não é doença!”, alerta a psicóloga Criziene e complementa: “as pessoas com TEA precisam de inclusão social, aceitação social, fortalecimento da rede de atenção psicossocial e de atenção à saúde, ou seja, o autista precisa ser pensado desde criança, adolescente, adulto, e também sua família”. 

A entrevista também pontua a necessidade de políticas públicas para a implantação de mais centros de convivência para adolescentes com deficiência, centros de habilitação profissional, além de capacitação continuada dos profissionais envolvidos na assistência desse público, seja da saúde, educação ou conselhos tutelares. 

“A sociedade precisa compreender esse sujeito em seu jeito de ser, portanto a partir de seu existir. Cada um é único”, acentua. 

Criziene Melo Vinhal possui especialização em Cognitivo-Comportamental, Neuropsicólogia, Psicologia Jurídica, Avaliação Psicológica e mestrado em Saúde Coletiva. Também é neuropsicóloga do Espaço Adapta TO e professora universitária.  

Boa Leitura!  

A senhora poderia caracterizar o que se entende por autismo?  

De acordo com o Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, o DSM-5, o autismo é um transtorno do neurodesenvolvimento caracterizado por dificuldades de interação social, comunicação e comportamentos repetitivos e restritos.  

Existem diferentes graus ou classificação de autismo?  

Sim. Os profissionais da área de saúde ou educação utilizam como diretriz diagnóstica o manual diagnóstico de transtorno mentais, o DSM V, e a classificação internacional de doenças, o CID 11, para comunicarem entre si e direcionar as práticas de intervenções e cuidados necessários.  

A atual Cid 11 fornece instruções detalhadas e códigos distintos para diferenciação entre autismo com e sem deficiência intelectual e comprometimento de linguagem funcional, além da gravidade que cada um possa apresentar. Ambas referências reúnem todos os transtornos que estavam dentro do espectro do autismo num só diagnóstico: Transtorno do Espectro do Autismo ou TEA.  

Como é o diagnóstico, ou seja, como os pais podem saber se o bebê ou a criança é autista?  

O diagnóstico do autismo é clínico, através da observação direta do paciente, coleta de informações com pais ou responsáveis e a aplicação de escalas, questionários e protocolos padronizados de observação do comportamento. 

Os profissionais de referência para o diagnóstico e encaminhamentos terapêuticos são neurologistas e psiquiatras. Outros profissionais ajudam no diagnóstico através de relatórios ou pareceres específicos ao seu conhecimento.  

O que desencadeia o transtorno? Fatores hereditários, metabólicos ou o problema ocorre ao acaso?  

Atualmente considera-se que as causas do autismo estão relacionadas na maior parte das vezes o autismo decorre da carga genética de seus pais (83%) e de ambientes, através de uma mutação genética ocorrida na própria criança.  

Um dos fatores que comprovadamente, aumenta a probabilidade de filhos com autismo seria a idade dos pais.  

O distúrbio é mais frequente em meninos ou meninas? Por quê?  

Mais frequentes em meninos, visto que as meninas possuem uma capacidade de suportar maiores variantes sem que o autismo se manifeste.  

Não dá para imaginar como uma pessoa é capaz de decorar o mapa cartográfico de uma cidade ou até mesmo uma lista telefônica inteira e não é capaz de interpretar conhecimentos mínimos como seu nome e o número de pessoas que moram em sua casa. Como a ciência explica uma patologia com classificação de espectro tão amplo, que abrange pessoas com incapacidade total de comunicação e outras com sinais de genialidade?  

É importante sabermos que nunca pode generalizar o espectro autista, há um leque em vários sentidos, desde altas habilidades até uma deficiência mental. Dentro do transtorno pode estar incluído a Síndrome de Savant, é uma condição rara, caracterizada por talento notável em um ou mais domínios, como memória, música, arte, matemática.  

Portanto, pode ser que suas habilidades se desenvolvam por comportamento repetitivo, simplesmente por meio de muitas horas de prática prolongada. Não há consenso sobre exatamente como as habilidades sábias são usadas em pacientes TEA.  

Muitas vezes apresentam uma disfunção significativa como nas habilidades lógicas ou simbólicas, além de ter dificuldades de linguagem e fala. 

Existe tratamento? Como funciona?  

Sim, os tratamentos são diversos e deve ser individualizados.  O direcionamento do cuidado deve ser construído e ofertado a partir da identificação das necessidades dos sujeitos e de suas famílias. Mas geralmente compõe de uma equipe multidisciplinar, pode ser formado por Psicólogo, Fonoaudiólogo, Terapeuta Ocupacional, Psicopedagogo, Musicoterapeuta, Arte-terapeuta, Equoterapeuta, Nutricionista, Neurologista, Psiquiatras, entre outros.  

Na minha prática a família também deve ser cuidada. Várias situações em que indiquei terapia individual, de casal e de família. O tratamento adequado melhora a qualidade de vida e desenvolve habilidades essenciais no indivíduo diagnosticado com TEA.  

Quais os serviços oferecidos atualmente pelo Sistema Único de Saúde?  

São vários os serviços a nível estadual que podemos contar desde a emissão da Carteira de Identificação do Autista destinadas para pessoas diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Em Mato Grosso, o documento começou a ser emitido no mês de dezembro de 2020 pela Secretaria de Estado de Assistência Social e Cidadania (Setasc) de forma gratuita. 

Também é oferecido atendimento através do CAPSi Curumim - atende casos de transtorno mental grave e severo de 0 a 17 anos e 11 meses, funciona como porta aberta onde os pacientes são acolhidos, avaliados e os casos em desestabilização e intenso sofrimento psíquico permanecem em atendimento e estando melhor entrelaçai ao quadro inicial apresentado. 

Encaminha-se para a rede Casos que não são para CAPSi, após avaliação, é feito o encaminhamento implicado para a rede. Lembrando que a clientela é: TEA, Psicoses, Neuroses Graves, Depressão, ideação e tentativa de suicídio.  

Os atendimentos existentes atualmente são: atendimento familiar; atendimento individual; grupo familiar; grupo de crianças ou adolescentes. Realizam também visita domiciliar e escolar; atendimento domiciliar; matriciamento; articulação com a rede, desde conselhos, Creas, Cras, NASF, Ministério Público, policlínicas, Upas, unidades de saúde. Também são realizados passeios externos, inclusão social, oficinas externas e capacitação para o acompanhante terapêutico. No caso de adolescentes são auxiliados a conseguir emprego, a ser independente. 

Outra instituição que também realiza atendimento para esse público é o CRIDAC de Cuiabá, considerado desde 2013, como Referência Estadual para Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência. Ele está habilitado como Centro Especializado em Reabilitação (CER), nível III, ou seja, está habilitado a atender pessoas com deficiência física, auditiva e intelectual, que tiver encaminhamento, segundo a política de regionalização de saúde; bem como para concessão de tecnologias assistivas, além de Coordenar a Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência e implementar a Política Estadual de Reabilitação no Estado de Mato Grosso.  

O usuário ou o responsável pelo paciente são acolhidos, por um profissional do SUS, com uma escuta qualificada e humanizada para verificar as necessidades de saúde, e para agendar as avaliações necessárias com os profissionais especializados ou equipe multiprofissional, de acordo com a disponibilidade de vaga.  

O CRIDAC oferta o serviço de reabilitação para crianças com deficiência intelectual e Transtorno do Espectro Autista (TEA) com idade entre 0 a 14 anos e 11 meses, a partir da avaliação especializada. O tratamento visa o desenvolvimento de habilidades para a independência funcional, autonomia, o bem-estar, a saúde e a inclusão da criança, a partir da elaboração do projeto terapêutico singular de cada usuário.  

A equipe de reabilitação do CRIDAC é composta por médicos nas diferentes especialidades de reabilitação como neuropediatra, ortopedista e otorrinolaringologista, fisioterapeutas, psicólogos, enfermeiros, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, psicólogas, nutricionistas, assistentes sociais e arte terapeutas. 

Sabemos que a demanda tem aumentado e que mesmo que tenhamos interesse em atender todos não é o suficiente. É preciso de mais profissionais e que também sejam capacitados. Isso não isenta que a sociedade civil constituída, a exemplo de clubes de serviços, entidades, se responsabilizem também em criação de condições e vagas para assistência ao autista. 

O que a sociedade deve saber e aprender com os autistas e suas considerações finais...  

De acordo com meu ponto de vista é importante que a sociedade tenha um novo olhar, em buscar compreender esse sujeito em seu jeito de ser, portanto a partir de seu existir. Cada um é único. 

Hoje grande parte da população possui acesso as diversas informações, principalmente pela internet. E quando o assunto é diagnóstico, correm o risco por informações incorretas, assim como os tratamentos não serem o mais indicado. Os tratamentos sempre devem ser individualizados. 

Não esqueçam que TEA não é doença! As pessoas com TEA precisam de inclusão social, aceitação social, fortalecimento da rede de atenção psicossocial, da rede de atenção à saúde, criar a linha de cuidados para o TEA, ou seja, pensando na criança, no adolescente, no adulto, e em sua família, criar políticas públicas, implantar centros de convivências para adolescentes com deficiência e implantar centros de habilitação profissional. Além de capacitação continuada de todos profissionais envolvidos na assistência seja da saúde, educação e conselhos tutelares.  




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