• Cuiabá, 12 de Julho - 2025 00:00:00

Hélio Ramos: o fiasco da Reforma Eleitoral, o fundo bilionário e a OAB na pandemia


Rafaela Maximiano

O ano de 2022 será um ano eleitoral, portanto, em menos de um ano o brasileiro elegerá presidente e vice-presidente da República, 27 governadores e vice-governadores de estado e do Distrito Federal, 27 senadores e 513 deputados federais, bem como deputados estaduais e distritais. Importante momento que define não somente o futuro político do país, mais também o econômico e por consequência, a vida de cada brasileiro.

Considerando essa tônica, nesta Entrevista da Semana ao FocoCidade, o professor e advogado Hélio Ramos acentua que é preciso saber votar pois, “as escolhas políticas influenciam, pois é o Estado - através de políticas públicas de macroeconomia, que tem a função de trazer melhorias para todos, garantindo tranquilidade para investimentos que vão gerar saúde financeira das empresas e melhores condições de vida da população, tais como saúde pública”.

Assinala que “a reforma eleitoral foi um fiasco, não se mexeu em quase nada, e de estrutural, não mudou muito, e as federações são uma nova modalidade de coligação”. E, pontuou apenas dois pontos positivos: “o voto em dobro para fins de distribuição do fundo partidário, que pode propiciar uma valorização desses segmentos, e as consultas populares”.

Hélio Ramos também faz uma leitura sobre aspectos econômicos do país, do quadro político nacional e regional, Fundo Eleitoral e o passaporte da vacina, entre outros aspectos.

Ramos é advogado, professor da UNIC – Universidade de Cuiabá, nas disciplinas: Direito Eleitoral, Direito Constitucional, e Direito Penal desde 2006, professor de vários cursos de pós graduação e Cursos Preparatórios para Concurso, Especialista em Processo Civil, Direito Público, e Gestão Pública, com uma militância atuante na Advocacia Eleitoral em todo Estado de Mato Grosso. É conselheiro estadual da OAB/MT e presidente da Comissão de Estágio e Exame de Ordem da OAB-MT no período de 2019/2021.

Confira a entrevista na íntegra:  

No seu ponto de vista quais reflexos vividos atualmente na economia e no social do Brasil, são resultados das escolhas políticas das últimas eleições que tivemos?  

Primeiramente, temos que entender se estamos numa crise, e a essa questão a resposta é afirmativa, pois a queda consecutiva do PIB de um país em dois trimestres, é uma definição de crise, assim o Brasil está mesmo em crise, com previsão de mais quedas no PIB. Dessa forma os reflexos da crise econômica se fazem sentir nas respostas da população. O desemprego aparece como maior problema pelo terceiro ano consecutivo, e as medidas de recuperação de poder de compra ganham espaço entre as principais prioridades para 2022. A população quer retomar a condição de vida que tinha antes, e isso só pode ocorrer com a queda do desemprego e o crescimento sustentado da economia. O fim do bolsa família com a substituição pelo Auxílio Brasil, ainda não se mostra transparente para se afirmar que a questão da fome, nas camadas miseráveis da população possa ser minimizada, é claro que as escolhas políticas influenciam, pois é o Estado, através de políticas públicas de macroeconomia, que tem a função de trazer melhorias para todos garantindo tranquilidade para investimentos que vão gerar saúde financeira das empresas e melhores condições de vida da população, tais como saúde pública.  

Qual o quadro político que se desenha para as próximas eleições: a tendência é o país escolha um presidente de direita, esquerda ou de centro, e, porquê?  

Primeiro gostaria de falar o que significava direita e esquerda. De acordo com Eric Hobsbawm, em “A era das revoluções” diz que no dia 21 de setembro de 1792, setecentos e quarenta e nove deputados se reuniram em uma assembleia para discutir os rumos que a França tomaria após os turbulentos acontecimentos decorrentes da Revolução Francesa. Os girondinos – considerados moderados, se sentaram à direita na sala, enquanto os jacobinos – que eram os radicais, se sentaram à esquerda, e os oscilantes sentaram-se no centro.   

Acredito que em 2022, novamente teremos uma acirrada e fratricida disputa nas redes sociais, com “cancelamentos” sendo realizados de forma muito cruel, pessoas vão ser achincalhadas, se ousarem se posicionar, isso pode gerar um fenômeno de “voto silencioso”, e talvez de voto contrário àqueles que mais praticarem grosserias digitais, e nesse ponto acredito que pode haver uma reação ao atual governo, propiciando um crescimento para a chamada “esquerda”. Quanto ao centro, vão acompanhar quem tiver mais chances de ganhar, fazendo a melhor negociação, como sempre. Interessante é frisar que no Brasil, não temos comunismo, e esse “medo” chega a ser engraçado...  

Acredito que em 2022, novamente teremos uma acirrada e fratricida disputa nas redes sociais...

Quanto a reforma eleitoral: o que o brasileiro deve levar em consideração para escolher seu candidato e não acabar sendo influenciado por “vou votar em determinado candidato para não perder meu voto”?  

A reforma eleitoral foi um fiasco, não se mexeu em quase nada, e de estrutural, não mudou muito, as federações, são uma nova modalidade de coligação, talvez duas mudanças positivas, seriam o voto em dobro para fins de distribuição do fundo partidário, que pode propiciar uma valorização desses segmentos, e as consultas populares. Em contrapartida a fidelidade partidária que já era frágil, ficou mais ainda flexibilizada, com a possibilidade dos partidos anuírem na mudança dos titulares dos mandatos.   

Em relação ao não perder o voto, enquanto não entendermos que devemos nos posicionar pelo que achamos certo, não acredito que isso mude, é preciso educação e conscientização do eleitor.  

Qual a diferença de voto em branco e nulo?  

Para o sistema eleitoral, não há diferença, os dois são considerados votos não válidos, e não vão para quem perde, para quem ganha, para cima ou para baixo, só serve para especularmos o que o eleitor quis dizer quando apertou a tecla “branco”, ou digitou um número qualquer, anulando o voto. 

Na sua opinião, o que significa os altos índices de títulos de eleitor cancelados pelo TRE: é falta de compromisso do cidadão com seu país?   

Objetivamente quanto ao cancelamento de títulos, a justiça eleitoral cumpre o seu papel, o eleitor é que não se esforça para se recadastrar. O brasileiro é um eterno “deixador” para última hora. Nós temos a tradição de votar, e participar das eleições, mas essa característica vem perdendo força, diante do desalento do cidadão, face os escândalos, tratamentos privilegiados e desmandos, mas é interessante perceber que esse mesmo fator desmotivador, não será o grande mote de discussão da campanha eleitoral de 2022.   

Alguns questionam, não somente o sistema de votação, como também a obrigatoriedade do voto. Qual sua opinião sobre esses dois pontos?  

Relativamente ao sistema de votação, temos que constatar que nunca vamos agradar todos, mas uma outra constatação é que muitos não entendem a matemática da proporcionalidade, e o objetivo de se buscar a maior participação do eleitor frente ao sistema eleitoral adotado, mas o nosso sistema proporcional vem desde o Código eleitoral de 1932, portanto ele funciona.  

Quanto a obrigatoriedade, entendo que essa não existe, pois é obrigatório o comparecimento, que inclusive, nem é tão obrigatório, pois se você não comparece, basta justificar ou simplesmente emitir uma guia pela internet, e pagar a multa gigante de R$ 3,50. Isso, por si só, não obriga o eleitor, e outra, se ele comparece e vota em branco, votou em quê? Se esse voto não conta para nada.  

É possível fazer uma avaliação do cenário eleitoral de Mato Grosso para o próximo ano?  

Não podemos avaliar nosso estado, fora do contexto nacional, o ano vindouro paira entre uma economia estagnada ou recessiva, onde controlar a inflação e fazer o Brasil voltar a crescer será a grande pauta das eleições, contudo Mato Grosso, se apresenta diferenciado, o atual governo conseguiu sanear as contas estaduais, e entra em 2022 dando 7% de recomposição das perdas salariais, a todos os servidores públicos, o que já, no mínimo, diminui a ideia de movimentos paredistas, como a educação por exemplo, isso sem falar que Mato Grosso, ocupa a honrosa posição de segunda menor taxa de desemprego do país.   

É lógico que a construção das federações de partidos e a polarização da eleição nacional irão influenciar aqui, mas hoje não vejo alianças capazes de tirar a reeleição do atual governador, deixando claro que não faço torcida, e registro que enquanto professor de Direito, jurista e cidadão sou contra a reeleição.  

Qual sua opinião sobre o formato do Fundo Eleitoral aprovado pelo Congresso na ordem de R$ 4,9 bilhões?  

O financiamento público de campanha eleitoral sempre foi muito discutido e inobstante traga a ideia de se buscar a igualdade da disputa entre os candidatos. A prática brasileira, já provou que isso não ocorre, a falta de democracia interna dos órgãos partidários, e a falta de tradição do brasileiro de participar dos partidos políticos, fazem com que esse dinheiro fique centralizado nas mãos de meia dúzia de dirigentes de partidos, o que cria um ambiente favorável a proporcionar vantagens a uns em detrimento de outros, fora a possibilidade de desvio de finalidade, diante da ideia sempre crescente de se diminuir o processo de prestação de contas perante a justiça eleitoral.  

A proposta do financiamento público, na minha opinião, é interessante, o dilema se dá, quando se investe um valor tão alto, diminuindo investimentos em áreas prioritárias como saúde e educação, sou a favor da máxima de que grandes benefícios, geram responsabilidades, e nesse sentido defendo que os órgãos de controle arrochem a fiscalização desses recursos em cima dos partidos.  

Como o senhor analisa a posição de alguns advogados que tem impetrado ações na Justiça contra o passaporte da vacina? Também o presidente nacional da OAB pede que todos se vacinem… não é um contrassenso dentro da Ordem então?   

A vacinação compulsória consta da Lei federal nº 13.979, que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, no artigo 3º, inciso III, alínea "d". Contudo esse dispositivo foi questionado perante o STF, na Adin nº 6.586/DF e 6.587/DF, que julgada em 17 de dezembro deste ano, decidiu que somente poderiam ser utilizadas medidas indiretas para estímulo da vacinação quando presentes outras cinco condições que são a existência de evidências científicas e análises estratégicas pertinentes; a ampla informação sobre a eficácia, segurança e contraindicações dos imunizantes; o respeito à dignidade humana e os direitos fundamentais das pessoas; o atendimento aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade; e, a distribuição das vacinas universal e gratuitamente.   

De outra ponta o referido passaporte poderia, em tese, criar discriminação odiosa, que agride as normas positivadas na Constituição da República, podendo criar estigmas ou atacar direitos e liberdades civis das pessoas que, por vontade própria ou por qualquer motivo alheio à sua vontade, optaram por exercer o direito de não se submeter à imunização contra o SARS-CoV-2 pela via das vacinas atualmente oferecidas no território nacional.  

O direito é uma ciência social, e como tal, gera interpretações de acordo com a convicção, formação, posição ideológica e por ai vai, dessa forma claramente se compreende quando advogados e juristas não concordam unanimemente. Existem prerrogativas de liberdade civil, que conceitualmente e principiologicamente devem ser protegidas, contudo é difícil chegar a um consenso quanto a um tema tão belicoso e que tem apaixonado tantas pessoas, ademais é importante citar que a OAB tem cerca de um milhões e duzentos mil advogados inscritos em todo o Brasil, em Mato Grosso, passamos de trinta mil, compatibilizar o pensamento de todos é impossível.  

Quanto a contradição, devemos entender que a OAB é uma instituição que tem órgãos internos de deliberação, e que o Presidente nacional, quando fala, sem que a questão tenha sido devidamente debatida e deliberada nesses órgãos internos, fala por ele, é lógico que o peso de sua fala gera repercussão, mas não vi a Instituição OAB se pronunciando, contra ou a favor, o que ela sempre faz é, após as discussões, procurar sempre defender a sociedade como um todo. 




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