Rafaela Maximiano
O cenário econômico para o ano de 2022, no Brasil e em Mato Grosso, é o tema da Entrevista da Semana. O entrevistado é o economista e mestrando pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Fernando Henrique da Conceição Dias.
Para o FocoCidade, Fernando Henrique faz uma avaliação da economia neste 2021 - apontando erros e acertos dos governos Estadual e Federal; também analisa fatores externos de geopolítica que afetam a economia; aponta soluções para amenizar a recessão econômica em 2022 no país e manter funcionando as micro e pequenas empresas.
O economista pontua que por 2022 ser um ano eleitoral - o que ele denomina de “mais curto” e de “estagnação para a economia” – o país tem pela frente um cenário complicado e de recessão. Já para Mato Grosso a crise não deverá ser tão severa quanto nos demais estados da federação, avalia.
“O Estado de Mato Grosso deve crescer sim pois tomou algumas medidas de proteção e de redução de impostos, vai deixar de arrecadar, porém vai proteger também as pequenas empresas, o cidadão, o agronegócio”, assinala.
Já em relação ao Brasil afirma que "teremos um ano complicado em relação à economia. Teremos aí a nova onda da pandemia... que pode impactar diretamente a nossa economia e o mercado, a guerra comercial chinesa com a norte-americana que ainda continua, uma inflação extremamente alta, chegando a dois dígitos, a de falta de controle no aumento do preço dos alimentos, o aumento no preço dos transportes. Então temos de esperar um 2022 de estagnação e até de recessão em termos de Brasil”.
Fernando Henrique também é pós-graduado em gestão de projetos e especialista em crédito imobiliário.
Confira na íntegra a entrevista:
O ano de 2020 foi atípico e muitos apostavam em uma retomada da economia este ano. Como o senhor avalia o cenário econômico brasileiro de 2021, vivemos uma recessão?
Foi um ano de recessão sim de acordo com os indicadores. Por exemplo, tivemos uma queda no PIB, temos um índice de desemprego algo que chega aí a 14 milhões de brasileiros, temos a inflação chegando a dois dígitos, então podemos dizer que estamos no início de uma recessão.
Por que o senhor se refere como o início de uma recessão?
Porque ainda existe possibilidades de a gente ter um crescimento tímido, não no ano de 2022. O próximo ano não será um ano de aumento do PIB como as pessoas estão vendendo, até porque será um ano menor, um ano político. Um ano político não é ano de crescimento pelo contrário, é um ano de estagnação financeira que não necessariamente significa estagnação econômica. É uma no em que dificilmente há crescimento econômico principalmente em países subdesenvolvidos.
Na sua avaliação, por que não conseguimos retomar a economia neste 2021, onde estiveram os erros?
Tivemos vários fatores exógenos e endógenos. Primeiro os exógenos: tivemos o mundo voltando de uma pandemia, uma Europa muito mais organizada em relação à vacina, os Estados Unidos um país muito mais organizado com relação à vacina também. O que o Brasil errou? O Brasil vendeu uma ideia de retomada da economia e muitas pessoas falam que o que estragou foi o “fique em casa”, isso é mentira. O que estragou foi exatamente a demora na vacina. Os países que vacinaram mais rapidamente, começaram a ter um crescimento maior, porque obviamente a pessoas voltam às ruas, voltam a consumir mais e o mercado volta a olhar com menos desconfiança. E, o Brasil fez ao contrário, demorou muito a tomar essa decisão da vacina, não tinha logística para isso também, não tinha uma coordenação pelos governos Federal, Estados e Municípios. E, isso impactou diretamente na economia do país, tanto o mercadológico pois o mercado passou a olhar com desconfiança e também nas questões exportadoras.
A China por exemplo, não estava mais comprando carne do Brasil, e, isso é esperado. Os países já olham o Brasil com mais cuidado, algumas questões exógenas como estas impactaram diretamente aqui.
As questões endógenas, de economia doméstica: se demorou muito para tomar decisões na esfera da seguridade social, por exemplo, o auxílio emergencial foi pouco mais positivo, nesse ano já houve a diminuição desse auxílio – já era esperado – e, agora estamos vendo o Bolsa Família mudar para Auxilio Brasil, agora parece que o governo federal vai tentar fazer mais políticas sociais. Temos 14 milhões de pessoas desempregadas, estamos chegando a 8 milhões de pessoas desalentadas – são pessoas que nem estão buscando emprego, além de 9 milhões com subempregos – o entregador do iFood, o motorista do Uber, o vendedor de água no semáforo, todos são pessoas que estão tentando sobreviver, e, isso é muito perigoso para uma economia que já foi emergente, hoje não somos mais, somos uma economia subdesenvolvida.
Qual medida que poderia ser tomada pela equipe econômica para melhorar esse cenário, na sua opinião?
A equipe econômica já percebeu que ela terá que tomar medidas de seguridade social, e é algo que eles não vendiam, o governo foi eleito com medidas de cunho liberal. Costumo dizer que foram eleitos com medidas mercadologias – para agradar o mercado – e aí vem uma pandemia, ninguém estava esperando, um país como o nosso gigante e um governo que infelizmente não teve domínio, não tomou as medidas corretas de forma rápida, e agora numa medida eleitoral o Bolsonaro com os precatórios vai conseguir liberar R$ 60 bilhões para o Auxílio Brasil para atingir 18 milhões. Vai sair do Bolsa Família que atingia 13 milhões e vai para 18 milhões com o dobro do orçamento. Só que o dinheiro infelizmente não cai do céu, eles tiveram que fazer essa PEC dos Precatórios – que acredito vai passar – para poder aumentar esse auxílio que vai ser pago de janeiro a dezembro de 2022, ou seja tem validade para acabar, não é eterno.
Apesar de ser uma medida eleitoreira é uma medida certa porque vai injetar dinheiro na economia e nessas famílias que estão na pobreza e extrema pobreza. Avalio como uma medida a curto prazo, boa, mas que não vai arrumar a casa ou arrumar a economia doméstica.
Ninguém vive só de auxílio, não adianta você dar somente dinheiro, você tem que investir em educação, ter uma saúde pública de qualidade e isso nós não temos. Isso sem falar na economia onde estamos com uma inflação chegando a dois dígitos, perigosíssimo. Com isso o nosso dinheiro não está valendo nada, está sendo corroída, frente ao dólar por exemplo é a segunda pior moeda do mundo. A gente fala tanto de Venezuela e deveríamos cuidar da nossa moeda, da nossa economia. Eu falo o governo é incompetente, não consegue cuidar da inflação, não consegue investimentos diretos para a geração de empregos. Não tem reforma que gere emprego, fizeram uma reforma trabalhista em 2016 prometendo a geração de emprego e era mentira. O que cria empregos é o investimento direto, se não tem investimento também não tem emprego. Isso é básico e está no manual de economia. O governo está aumentando a Selic e isso não é suficiente para proteger a moeda, e, à medida que se precisa no momento são as de seguridade social.
E, a questão geopolítica externa, onde vemos agora os Estados Unidos medindo força com a Rússia. Fala-se em embargos econômicos e conflitos. De que forma tudo isso pode afetar a economia do Brasil?
Na verdade, afeta diretamente, hoje nosso principal parceiro comercial é a China. Já tem mais de duas décadas que nosso agronegócio dá benção para China. Os chineses precisam se alimentar e nós somos uma país agroexportador. A China é parceira comercial da Rússia, isso historicamente, e existe desde o governo do Trump uma guerra comercial entre os Estados Unidos e a China. O Trump era um protecionista, ele protegia a economia norte americana e lá ele fez ao contrário do Brasil ele protegeu a economia doméstica colocando por exemplo impostos em produtos importados obrigando a população a consumir o que é produzido dentro do país, ou seja, ele valorizou o produto interno e fortalecer a economia estimulando investimentos diretos e gerando empregos. Ele só errou nas questões políticas e ideológicas que o deixaram isolado. Também se posicionou contra a Rússia e a China pela guerra comercial. O Brasil sempre foi parceiro norte-americano, agora teremos que esperar as próximas eleições para ver como o presidente eleito vai se posicionar. O que já podemos esperar dessa guerra comercial é o aumento dos juros norte-americanos o que impacta toda uma logística de dolarização. Então temos que aguardar um 2022 muito mais complicado em relação à economia globalizada para todos os países, mas principalmente para os subdesenvolvidos que vão sentir muito. Teremos mais um ano atípico frente à nossa moeda que já está corroída e desvalorizada.
Vale pontuar que para quem exporta em dólar será maravilhoso, porém o pequeno produtor trabalha com o Real. Os grandes conglomerados ficarão mais riscos independente se a produção for maior ou menor. O Agro, mesmo nesse cenário, ficará forte.
Diante do quadro nacional econômico explanado para 2022, o cenário econômico para Mato Grosso será é o mesmo?
Mato Grosso vai viver um ano de 2022 bem consolidado. O Governo do Estado de Mato Grosso fez uma redução muito importante na alíquota dos combustíveis e da luz, isso vai impactar positivamente. Se comparado com outros estados da Federação, Mato Grosso historicamente sente menos as crises globais justamente porque ele é o celeiro do Brasil. Automaticamente auxilia a nossa economia e ficamos um pouco mais protegidos que outros estados.
Avalio que o ano de 2022 para Mato Grosso será um ano bom, pois o governo já tomou algumas medidas importantes de proteção a exemplo de baixar o ICMS, fortalecer novamente a questão das obras e de seguridade social. Não diria que teremos um crescimento espantoso mas vai manter a média e até ter crescimento para que em 2023 possamos colher os frutos.
O pacote de redução de impostos anunciado pelo Governo do Estado representa algum risco na receita do Estado ou é uma resposta do Governo de que além de equilíbrio financeiro e fiscal, possui folga nos cofres públicos?
O Governo está com as contas em dia, mas eu não acredito que esteja sobrando tanto dinheiro assim. É também uma medida eleitoreira, mas é muito mais uma medida para tentar avançar a economia. Não sei como estão vendendo essa informação, mas eles não diriam que têm tanto dinheiro sobrando em caixa e posso fazer isso, acredito sim que é para auxiliar no avanço da economia.
E como fica a questão das micro e pequenas empresas em 2022, elas que foram uma das mais afetadas pela pandemia?
É uma questão que precisa ser bem pontuada, pois aproximadamente 65% das empresas no Brasil são familiares e metade são microempresas ou empresas que não têm o capital tão forte. Essas empresas precisariam ter benefícios de poder pegar um financiamento mais barato, isso foi feito, mas em 2020. As dívidas com os bancos tiveram um prazo interessante na pandemia, ou seja, políticas de crédito que precisam ser mantidas tanto na esfera Estadual quanto Federal para que essas empresas não sintam muito. Queremos ver a recuperação da economia, o consumo das pessoas aumentou bastante, isso é importante, e essas medidas precisariam ser mantidas até 2023 - essas políticas de crédito para essas empresas. Defendo até uma política de perdão de dívida, ou auxiliar para que elas possam pagar no futuro, o que eu acho difícil pois os bancos já sinalizaram que não vão mais fazer isso, mas cabe aos governos sinalizarem e fomentarem.
A reforma tributária, ao longo dos anos discutida e aprovada em fatias, até hoje não cumpriu o que o povo queria que era a redução de impostos, alguns especialistas chegam a afirmar que isso nunca irá acontecer, que é uma utopia. De fato, o bojo da reforma é sempre no sentido de aumentar impostos?
É um tema muito interessante porque maior parte dessa reforma ficou para 2022, mas eu não acredito que acontecerá uma reforma tributária em um país subdesenvolvido. Esses discursos que as reformas vão melhorar alguma coisa são perigosíssimos. Aí eu volto e falo na reforma trabalhista que foi aprovada como se ela fosse gerar milhões de empregos, muitos compraram esse discurso, até a Federação da Indústria comprou essa ideia, deputados... E a reforma trabalhista, aprovada não está dando certo: a economia está voltando, e as pessoas estão se recolocando no mercado com salários menores. Não adianta você gerar empregos que não dá a possibilidade de ganho real na moeda.
A reforma tributária ainda vai ser muito discutida politicamente. Eu não acredito que ela possa fazer algum impacto. O que nós precisamos são de reformas de Estado e não reformas de Governo. Nossos políticos pecam pois não estão preparados para fazer políticas públicas de Estado, políticas públicas que não vão durar somente quatro ou oito anos. Política pública de Estado tem que ser criada, obedecida e executada e não acontece isso no Brasil.
Entra e sai governo eles mudam as políticas. Por exemplo, o Bolsonaro entrou e mudou o Bolsa Família para Auxílio Brasil, o próximo que entrar vai mudar as regras novamente e para isso precisa do Congresso, ou seja, temos muito mais decisões de cunho político de médio e curto prazo do que políticas de estado do Brasil que invista em Saúde, em Educação. A gente não tem, e é também erro nosso que elegemos nossos representantes. Então, não adianta discutir reforma tributária achando que será um milagre, pois sempre temos reformas mais políticas do que técnicas.
Quais suas considerações finais ao leitor do FocoCidade.
Primeiro quero agradecer a oportunidade e falar ao leitor do FocoCidade que 2022 para Mato Grosso será um ano de muitas oportunidades para a economia. Não estimo um crescimento alto, mas estimo que o Estado deva crescer sim pois tomou algumas medidas de proteção e de redução de impostos, vai deixar de arrecadar, porém vai proteger também as pequenas empresas, o cidadão, o agronegócio também. Vislumbro um ano de regular a bom para Mato Grosso, porém é bom frisar que temos um ano político pela frente. Todo ano político é mais curto e impacta diretamente na economia, acaba sendo um ano de estagnação ou de crescimento tímido.
Em relação ao Brasil acredito que termos um ano complicado em relação à economia. Teremos aí a nova onda da pandemia, a nova cepa ômicron que vem forte e ninguém conhece e vai impactar diretamente a nossa economia e o mercado, a guerra comercial chinesa com a norte americana que ainda continua. E, neste momento a China está deixando de crescer – 9 a 10% - como sempre crescia, por que 30% do PIB dela estava na construção civil e o setor passa por um momento extremamente delicado, e quando a China deixa de crescer ela deixa de comprar várias coisas no mundo, e o Brasil vai perder com isso.
Temos também uma inflação extremamente alta, chegando a dois dígitos, o governo precisa tomar medidas muito mais efetivas além de aumentar a taxa Selic, falta controle no aumento do preço dos alimentos, aumento no preço dos transportes, é uma cadeia. Então temos de esperar um 2022 de estagnação e até de recessão em termos de Brasil.
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