Julho, alguns dias de férias com a família e amigos em uma praia tranquila + nenhuma urgência no trabalho (ainda...).
Primeiro dia, alívio e descanso. Demais dias, curtição e descanso, mas com a mente inquieta. Pensamentos intercalados sobre diversos assuntos: família (mais ampla) e suas questões, escritório, mercado jurídico e seus crescentes desafios, estado das coisas (em todos os sentidos). Por que não consigo desligar completamente e apenas aproveitar?
Tendo passado pela mesma situação diversas outras vezes ao longo dos anos, decido, dessa vez, não duelar com a inquietude. Que corram livres, então, os pensamentos e reflexões, e que convivam com as crianças, com mergulhos no mar, caminhadas, conversas com minha mulher e meus amigos.
Questiono-me se o dito “ócio” realmente nos permite um estado mental de novos caminhos e possibilidades, de mais criatividade e desenvolvimento pessoal. Pesquiso o tema na Internet. Descubro que o ócio tem sido objeto de estudos há mais de 2500 anos. Nomes como Aristóteles, Cícero, Sêneca, Santo Agostinho, Montaigne, Bertrand Russell, Josef Pieper, Giorgio Agamben, Byung-Chul Han e Domenico De Masi escreveram obras específicas sobre o tema (este último, há 25 anos, publicava no Brasil o famoso “O Ócio Criativo”).
Busco pesquisas empíricas. São muitos estudos que afirmam que o ócio é uma condição fundamental para o funcionamento psíquico e intelectual saudável, a satisfação com a vida, a autoestima, a estabilidade emocional e mesmo a eficiência produtiva.
E qual a relação entre ócio e redes sociais? Há estudos sobre o tema, e alguns afirmam que as redes são “liquid leisure”, que permeiam o tempo livre, de trabalho e de estudo, com efeitos limitados em termos de criatividade profunda. Já o “deep leisure”, como viagens, artes, leitura leve, hobbies etc., são ligados ao efetivo cultivo do ócio dito criativo.
Ainda em período de descanso, saio para mais uma caminhada seguida de uma tarde na praia. Entre um mergulho e outro, me questiono se o ócio gera em mim um estado mental propício à criatividade. No caminho entre o mar e a cadeira de praia, olho ao redor, e contemplo diferentes pessoas vivendo seus ócios de diferentes formas, tempo e intensidade – e, certamente, com diferentes impactos sobre suas vidas.
Chego, finalmente, a uma conclusão bastante pessoal, baseada na minha própria experiência de vida: o meu ócio criativo decorre menos do que faço nos momentos de deep leisure, e mais do afastamento que é decorrência dele.
Vivemos mergulhados em rotinas exigentes, decisões que não param, informações que não cessam. A ideia de parar – ou pelo menos de desacelerar – parece fora de lugar. Mas é justamente nesse espaço, fora do fluxo, que muita coisa se organiza.
Não é apenas sobre descanso. É sobre percepção. Sobre permitir que o pensamento decante. Que as conversas internas e externas amadureçam. Que o tempo não seja só métrica, mas também qualidade. Talvez o grande poder do ócio esteja aí: pausar para seguir com mais presença. Em valorizar os espaços que não aparecem na agenda, mas que sustentam tudo o que importa.
Leonardo de Campos Melo é advogado especialista em contencioso judicial e administrativo estratégico e em arbitragem, e Sócio-fundador do escritório LDCM Advogados - leonardo@ldcm.com.br
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