De acordo com a legislação penal em vigor, a ausência do pagamento de tributos resulta na ocorrência de crime contra a ordem tributária.
Porém, em face de graves dificuldades financeiras, os dirigentes das empresas vieram a se deparar com dilemas acerca de quais despesas e dívidas escolheriam por adimplir, considerando inclusive o risco de impossibilidade de manutenção da atividade empresarial e até mesmo de não conseguir pagar os salários dos funcionários contratados, havendo por vezes, a decisão pelo não cumprimento de algumas obrigações tributárias em razão de tais dificuldades.
Em razão deste aspecto de ordem financeira, os Tribunais vem adotando a tese defensiva de exclusão da configuração de crimes tributários nos casos de graves dificuldades financeiras da empresa, desde que reste devidamente comprovado que o não recolhimento do tributo se deu em um contexto de crise grave o suficiente para não haver outra alternativa que não implicasse na impossibilidade do pagamento de funcionários e pelo fato de que não houve fraude, mas apenas o não recolhimento dos tributos devidos.
No mesmo sentido, o Supremo Tribunal Federal decidiu que se a evasão tributária for o único meio de que dispõe o agente para pagar os salários dos empregados, entende-se que não lhe seria exigível a criminalização de outra conduta, pois esta alternativa acarretaria um resultado socialmente mais danoso.
No entanto, a discussão gira em torno da possibilidade de aplicação da referida tese nos casos em que ocorreu não apenas o mero não recolhimento do tributo devido, mas também a efetiva sonegação.
Por certo, o STF entendeu por restringir a aplicação do entendimento, considerando que, para que seja afastado o delito fiscal, haveria uma exigência de boa-fé, o que seria incompatível com a fraude.
Aliás, é notório que a legislação tributária brasileira é sabidamente complexa, fato que gera inclusive dúvidas da própria administração tributária quanto à sua interpretação.
Assim, de acordo com o entendimento jurisprudencial não se pode presumir que o contribuinte cometeu fraude fiscal, sem contudo, comprovar que houve a intenção deliberada de sonegar.
Não por isso, é princípio geral de direito que a fraude não se presume, deve ser comprovada.
Enfim, impor ao contribuinte que agiu de boa-fé os efeitos de um processo criminal resulta no inequívoco senso de injustiça, até porque o devedor terá que em algum momento adimplir a respectiva pendência fiscal com seu próprio patrimônio.
Victor Humberto Maizman é Advogado e Consultor Jurídico Tributário, Professor em Direito Tributário, ex-Membro do Conselho de Contribuintes do Estado de Mato Grosso e do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais da Receita Federal/CARF.
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